Dois artigos de opinião hoje publicados no Diário de Noticias.
De Mário Soares
Um Governo sem rei nem roque
É extraordinário
como o atual Governo se mantém - contra a vontade da esmagadora maioria
dos portugueses - com mentiras sucessivas e sem ter qualquer visão para
o futuro a não ser o respeito pela famigerada troika. Um Governo de
coligação cujos líderes se odeiam e se mantêm apenas para não perder as
respetivas posições.
É um Governo que não governa, no sentido de
não se saber para onde vai e que futuro terá. Está completamente
paralisado. Mas os próprios membros dos dois partidos sabem que, mais
dia menos dia, têm de desaparecer e sair do País, para não serem
punidos.
É certo que contam com o Presidente da República - o
grande responsável por tudo o que aconteceu em Portugal - fala o menos
possível, como é sabido, mas é o protetor fiel do Governo, que perdeu
toda a legitimidade e quer continuar a sê-lo, haja o que houver. Até que
termine o seu mandato, o que não tarda muito a acontecer. É pouco
provável que tenha a coragem de mudar de rumo. E por isso vai pagar
muito caro. O seu retrato na história será invulgarmente negativo.
Porque
a crise que Portugal vive é de natureza internacional e tudo vai mudar -
como os leitores verão - para dar um novo rumo à zona euro, sem cair
no abismo, como avisou Helmut Schmidt. O que seria o caso se os
mercados continuassem a dar ordens e a defender a direita mais absoluta.
Provavelmente haverá uma revolução.
O Governo que temos, sem nos
dar contas de nada e muito menos do dinheiro que tem e como o gasta, em
três anos destruiu o nosso País. Vendeu ao desbarato quase todo o nosso
património e ninguém sabe para onde foi esse dinheiro e como foi gasto.
Acabou com o Estado social e está a destruir aos poucos o Serviço
Nacional de Saúde. Tem vindo a dificultar, e de que maneira, a vida às
nossas universidades, obrigando as nossas melhores cabeças de cientistas
e intelectuais a emigrar.
Pela terceira vez apresentou um
Orçamento que, por ignorância total de quem o fez, voltou a ser chumbado
pelo Tribunal Constitucional.
É obra... Mas não só fez pressões
para que isso não acontecesse, o que é contra a Constituição da
República, como tem vindo a insultar o Tribunal Constitucional, o que
antes ninguém ousou fazer. O que é inaceitável e totalmente ilegal, como
disse, com toda a razão e coragem, o ilustre constitucionalista Jorge
Miranda.
É sabido que o Governo não gosta da Constituição da
República e a ministra da Justiça nem sequer teve a coragem de defender o
Tribunal e a Justiça, como era seu dever... É uma ministra
completamente inútil.
O desvario do Governo é total. Ninguém com o
mínimo de consciência o pode respeitar depois do que tem dito
contraditoriamente. Mas o pior é que não governa e os ministros, cada um
no seu canto, não se entendem entre si e não há quem os considere e
entenda.
Quase todos os dias o primeiro--ministro fala, ao
contrário do Presidente da República, que se limita a ouvir e a dizer
banalidades. No sábado passado, o primeiro-ministro preconizou uma
política social. Curioso, não é? Ele que há dois anos tem vindo a
destruir o Estado social, não ouve nem tem qualquer respeito pelos
sindicatos. E agora procura iniciar uma política social. Para quê? Só se
for para ganhar tempo...
Os médicos e os enfermeiros protestam e
estão contra o Governo que os maltrata. Porque segundo as queixas do
ministro não há dinheiro para financiar a saúde dos portugueses. Então
porque continua a ser ministro? Os professores estão na mesma. Os
militares queixam-se da falta de dinheiro e não podem ver o ministro da
Defesa. Mas a Polícia e a Guarda Nacional Republicana, que dependem do
ministro da Administração Interna, também não. É caso para perguntar:
Será que o Presidente da República, que é economista, sabe para onde vai
o dinheiro e o que se passa com as Finanças públicas? Porque não o
explica aos portugueses? Que já não acreditam em nada do que diz o
Governo, a não ser que a cada dia lhes cortam as pensões a que têm
direito ao fim de tantos anos de trabalho...
Nem o Governo que se
diz falsamente democrático e social-democrata e democrata-cristão faz
qualquer esforço para dar a conhecer aos cidadãos quase nada acerca do
dinheiro que o Estado administra nem de onde lhe vem e onde o gasta.
Os
bancos portugueses são vítimas da situação em que o Governo os colocou.
Porque, ao que se diz, os ricos põem o dinheiro no estrangeiro e os
pobres, o que resta, guardam-no nos colchões...
Tudo está péssimo
e vai piorar enquanto este Governo estiver no poder, graças ao
principal responsável e grande protetor do Governo: o Presidente da
República. E, no entanto, devia ser o primeiro a conhecer bem a
situação, como economista que é. Mas não. Os próximos meses ser-lhe-ão
extremamente difíceis, se não tiver a coragem de dar um murro na mesa e
dizer: Basta! Mas não terá coragem para isso...
De Pedro Tadeu
E vão elogiar a ministra Paula Teixeira da Cruz
Pois achavam que o Estado estava a cortar despesas para reduzir o défice estrutural, a dívida pública e todos os outros problemas que, garantem, são a causa dos males deste país? Pois parece que não é bem assim.
A senhora ministra da Justiça, tão elogiada pela troika e por Passos Coelho, dada a capacidade de implementar reformas tão boas tão boas que, a 1 de setembro, os julgamentos neste país terão de ser suspensos graças ao pandemónio aberto com a reforma do mapa judiciário, será candidata a outro lote de rasgados elogios se der seguimento a um anteprojeto de revisão do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.
Qual a razão para esses futuros encómios? É esta: uma das normas desse Código, elaborado por sumidades jurídicas convidadas a figurar numa comissão especialmente criada para o efeito, prevê dar autorização para o Estado contratar advogados em casos de pedidos de indemnizações contra o Estado.
Teremos, portanto, senhores ministros, senhores secretários de Estado, senhores chefes de gabinete, senhores diretores-gerais, senhores presidentes de câmara e outros senhores da máquina administrativa a, direta ou indiretamente, poderem ser clientes dos senhores que dão nome aos grandes e médios escritórios da advocacia, facilitadores dos grandes e médios negócios que suportam as carreiras de boa parte dos cavalheiros anteriormente referidos.
O resultado para a salubridade ética no aparelho do Estado vai ser bonito de se ver, como qualquer alminha inocente é capaz de prever.
Perguntará o leitor: mas esta medida vai resolver algum problema? O Ministério Público, que até agora tinha o monopólio deste "negócio", está a sair-se mal?
Os jornais respondem que não: há 1,5 mil milhões de euros em discussão nos tribunais deste país mas em 83% dos casos resolvidos até agora o Estado foi declarado inocente, perdendo pouco dinheiro. Nada mau.
O salário dos magistrados que tratam destes assuntos é despesa fixa mas, por razões que me ultrapassam, o Governo colocou em discussão pública a hipótese de gastar dinheiro com advogados para se defender. Afinal... somos ricos!
Maria José Morgado, a líder do DIAP Lisboa, lança mesmo a suspeita: "O Ministério Público sofrerá um declínio em nome de interesses dificilmente escrutináveis." E eu, que tantas vezes critiquei a incompetência do Ministério Público, só tenho mesmo de alertar: estão a tirar-lhe o tapete, estão a destruí-lo em vez de o melhorar.
Mas Paula Teixeira da Cruz receberá, certamente, louvores e aplausos dos habituais liquidatários do Estado, sempre prontos a agradecer reformas deste tipo. É um ideal.
terça-feira, 10 de junho de 2014
Cavaco e governo neste 10 de Junho de 2014
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Sem comentários:
Enviar um comentário