Por Baptista Bastos, publicado no "Jornal de Negocios"
"A aura de simpatia que Pedro Passos Coelho conquistara, foi extorquida por ele próprio.
Em poucas semanas depredou a simpatia que rodeava o Governo. Ouve-se as pessoas, nas ruas e nos fóruns das rádios e das televisões, e as manifestações de verdete ou de repulsa ou de arrependimento (no caso de votantes) constituem ondas de contestação. Nunca, na história da nossa pequena democracia, um Executivo passou tão depressa do estado de graça ao estado de desgraça.
Passos declarou que não procedia a aumentos escandalosos. Procedeu. Que não atacava as bolsas dos mais desfavorecidos. Atacou. Vai cortar metade do subsídio de Natal a uma fatia substancial dos trabalhadores. Jurou, a pés juntos, que não aludiria às políticas do Governo do PS. Está farto de falar. Até nos "jobs" para os "boys". Aumentou de quatro o número de gestores da Caixa Geral de Depósitos, todos eles simpatizantes, militantes ou apoiantes do PSD.
As pessoas, para além de desapontadas, estão indignadas, muitas delas votantes no partido agora no poder. Alguém disse, num debate na SIC-Notícias, que a "tradição vai manter-se." A tradição consiste em despedir por ordem do cartão do partido, e não defender e preservar o mérito. Tem sido assim com todos ao partido alçapremados ao mando. Não está bem. Mas parece que ninguém protesta ou se indigna "porque é da tradição."
Espera-se, agora, a vez dos directores-gerais. Os do PS, claro, irão à vida, a fim de darem a vez aos do PSD. Evidentemente que estas movimentações partidárias custam rios de dinheiro ao País. A indiferença moral adquiria carta de alforria. Lembro uma história verdadeira ocorrida com Bertold Brecht. O grande dramaturgo, por muitos considerado "o Shakespeare do século XX", era, com a mulher, a actriz Elene Weigel, director do Berliner Ensemble. Comunista, não escondia as suas convicções, nem o seu grande carácter, acrescente-se. Havia quem confundisse essa virtude com mau feitio. Nada disso. O homem era muito senhor do seu nariz.
Um dia, recomendado por um alto dirigente do partido, apareceu, no Berliner Ensemble, um actor de segunda ordem, mas muito sobranceiro devido à carta de recomendação que levava. Brecht leu a carta, com visível desagrado. Depois, ergueu-se do cadeirão de cena, onde estava sentado, apontou a porta da rua e disse: "Mostra-me o teu talento, não me mostres o cartão do teu partido." É uma cena memorável, contada, sem omissões ou rasuras, por pessoas que a presenciaram.
Quando do consulado de António Guterres, que seduziu e enganou muito boa gente, ele tornou famosa uma frase: "No jobs for the boys." Pois não! O PS encheu de "camaradas" a Administração Pública e as empresas onde exercia influência. Não quero dizer com isto que militantes dos partidos não devam ocupar lugares e exercer funções. Porém, desde que, para isso, possuam mérito e competência.
Pedro Passos Coelho prometeu à puridade que isso não iria repetir-se. É o que está a ver-se. Pior, talvez, ainda, há a palavra que se dá e se não respeita. Vamos de mal em mal, de desprezo em desprezo, e o País caminha para aonde? O ministro Vítor Gaspar, que surgiu precedido de grande fama, parece não demonstrar coisa que o valha. Possui um humor extravagante, o que não seria mau, caso a sua eficácia fosse provada. Acrescenta aumentos a tudo o que é indispensável ao viver mais decente, já anunciou dois orçamentos rectificativos, e prometeu que as dificuldades não terminavam assim. Atingimos o grau zero da credibilidade, e ainda estamos com poucas semanas deste Governo. Vamos continuar na purga desta aflição? "Que mais nos vai acontecer?
segunda-feira, 1 de agosto de 2011
Que mais nos vai acontecer?
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