Texto de João Lemos Esteves hoje publicado na edição online do "Expresso".
O Governo Passos Coelho convenceu-se e está a tentar a convencer os
portugueses de que iniciou um novo ciclo. O novo ciclo para já tem mais
de show off e retórica do que de substância e mérito político. É
uma verdade indesmentível que Passos Coelho está um "homem novo":
trocou o ar amorfo e o tom monótono por um ar aguerrido, suficientemente
convicto e algum dinamismo. Podemos afirmar, sem exagero, que a decisão
irrevogável revogada de Paulo Portas funcionou como um suplemento
vitamínico para Passos Coelho - como Passos sabe que o Governo vive um
daqueles momentos em que não tem nada a perder, que nada poderá ser
pior, apresenta-se como alguém desprendido, com a garra típica dos
irresponsáveis ou dos que já têm a derrota assegurada, restando-lhe
apenas lutar pelo resultado menos negativo possível. Enfim, é como a
equipa de futebol que está a perder por muitos golos ao intervalo e que
na segunda parte sente-se com a liberdade para jogar sem tácticas, sem racionalidade, pois sabe que perder por um é o mesmo que perder por 5 ou 6, logo
não tem qualquer problema em arriscar numa lógica de "tudo ou
nada"...Mas dizia eu então que Passos Coelho sente-se mais livre, mais
desprendido, tentando iniciar um novo ciclo do seu Governo, convertendo o
"problema Portas" na "oportunidade Portas". A verdade é que depois do
impasse, Passos Coelho beneficiou da complacência da maioria dos
comentadores, adversários políticos, empresários, que suspiraram pelo
fim do teatro político que vivemos naquelas duas semanas de Julho.
Contudo, o aparente novo fulgor do Governo Passos Coelho foi sol de
pouca dura...
Com efeito, poucos dias depois da "boa nova" da renovada alma
governamental, eis que rebentou mais uma bomba: a nova Ministra das
Finanças, Maria Luís Albuquerque, mentiu perante os deputados na
Comissão Parlamentar que está a investigar os contratos de swap - e,
como se não chegasse, nomeou um Secretário de Estado completamente
dentro do sistema desses contratos vergonhosos e absolutamente ruinosos
para o interesse público, sendo inclusive um seu instigador (na medida
em que tentou vender ao Governo de José Sócrates estes produtos
financeiros). Bom, politicamente, este é um daqueles episódios que
matam a credibilidade de qualquer Governo - e o problema é que com
Passos Coelho estes episódios começam a ser muito regulares. Dá a
sensação de que o Governo Passos Coelho está a proteger um conjunto de
interesses ligados à alta finança e a interesses empresariais ocultos
que deu fortunas a ganhar a muitos políticos do "centrão", PS e PSD.
É que, se ponderarmos bem, este episódio dos swaps tem pormenores rocambolescos e altamente indiciários da culpabilidade dos agentes políticos envolvidos. Senão, vejamos:
Maria Luís Albuquerque foi administradora da REFER, empresa que celebrou os tais contratos swap;
Maria Luís Albuquerque é escolhida para Secretária de Estado do Tesouro,
por ser muito amiga de Passos Coelho, para além de alguns méritos que
possa ter (os quais, avanço desde já, nunca seriam suficientes para
chegar a Ministra das Finanças da República Portuguesa);
Vítor Gaspar demite-se, com estrondo, do Governo, em grande parte com
medo das consequências que poderia sofrer com o rebentar da bomba dos
swaps;
Maria Luís Albuquerque, já associada ao escândalo das swaps, é escolhida
para Ministra, designando um Secretário de Estado que porventura lhe
terá proposto o contrato de swap quando era gestora pública;
Entretanto, a Ministra das Finanças teve de desvirtuar e de ocultar factos sobre o processo dos swaps no Parlamento.
Como pode constatar, este é um exemplo evidente da promiscuidade entre a
política e os negócios - ou melhor, um exemplo do domínio que os
negócios pouco claros, que nada acrescentam à riqueza de Portugal, mas
servem apenas para aumentar os dígitos das contas bancárias de
alguns, exercem sobre os decisores políticos. Como é que se pode
afirmar, como faz Passos Coelho, que Portugal viveu num regabofe devido à
rigidez do Código do Trabalho, ao peso excessivo da Administração
Pública na economia, às despesas pública na saúde e na educação - quando
os impostos dos portugueses trabalhadores e honestos serviram (e
servem!) para pagar duas brincadeiras trágicas da nossa classe política:
o BPN e agora os swaps. Quer dizer: nós, portugueses, temos de aceitar
que cortem os nossos direitos, que todos os meses sejamos "assaltados
legalmente" pelo Fisco - para pagar os desvarios de Maria Luís
Albuquerque e companhia!
Para mim, por muitas explicações que tenham, há um facto que a Ministra
das Finanças nunca conseguirá ocultar ou desvirtuar: a senhora Doutora
Maria Luís de Albuquerque, numa demonstração de descaramento
pornográfico, escolheu para Secretário de Estado alguém que promoveu
junto das entidades públicas a celebração dos contratos swaps. Logo,
incapaz de averiguar o que quer que seja e muito menos de resolver este
problema para as nossas finanças públicas. Esta nomeação surgiu numa
altura em que Maria Luís de Albuquerque já tinha prestado declarações
no Parlamento e tentava afastar qualquer responsabilidade nesta
matéria. Afinal, por muito que Passos Coelho critique José Sócrates, são
farinha do mesmo saco: Maria Luís Albuquerque, essa com esta atitude,
mostrou que é uma "José Sócrates" de saia.
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