DERRUBAR O GOVERNO É OBRIGAÇÃO PATRIÓTICA

O inutil Cavaco Silva deu carta branca ao atrasado mental Passos Coelho para continuar a destruir Portugal e reduzir os portugueses a escravos da ganância dos donos do dinheiro.
Um governo cuja missão é roubar recursos e dinheiro às pessoas, às empresas, ao país em geral, para os entregar de mão beijada aos bancos e aos especuladores é um governo que não defende o interesse nacional e, por isso, tem de ser corrido o mais depressa possivel.
Se de Cavaco nada podemos esperar, resta a luta directa para o conseguirmos.
Na rua, nas empresas, nas redes sociais, há que fomentar a revolta, a rebelião, a desobediência, mostrar bem que o povo está contra Passos Coelho, Portas e os outros imbecis que o acompanham e tudo fazer para ajudar à sua queda.
REVOLTEM-SE!

segunda-feira, 23 de setembro de 2013

O colossal embuste

Texto de Tomás Vasques hoje publicado no jornal I-online.

Nada disto envergonha, minimamente, quem nos governa. Continuam, como se nada se passasse, a prostituir as palavras e as promessas 

Dizia, categórico, como sempre, Pedro Passos Coelho, o nosso inverosímil primeiro-ministro, a 8 de Março do ano passado, a um jornalista sueco: "Já dissemos que vamos voltar aos mercados de dívida em Setembro de 2013 e é o que vai acontecer." Três dias depois, em Washington, o então "homem do leme", Vítor Gaspar, precisava esse "regresso aos mercados" com maior rigor, escolhendo o equinócio de Outono para concretizar tão almejado objectivo: 23 de Setembro. Hoje, exactamente esse tal 23 de Setembro, todos sabem que o "é o que vai acontecer" não aconteceu, nem tão cedo acontecerá.

O "memorando de ajustamento", e as suas várias revisões, assumido como o programa do principal partido do governo (que por ironia das teias que Abril teceu se chama "social-democrata") e, sobretudo, a sua desastrosa execução, neste dois anos e meio, foi um fracasso de proporções assustadoras, cujas consequências a maioria dos portugueses irá pagar durante muitas décadas. Lembremo-nos da garantia dada por este governo de que os sacrifícios, o empobrecimento e a miséria em que a maioria dos portugueses ia cair permitiriam, no próximo ano, um défice orçamental de 2,3% e um desemprego de 12,5%. Hoje, todos sabem que, face ao fiasco que se estende aos olhos de todos, o vice-primeiro-ministro pretende, nas "negociações" com a troika, atingir em 2014 o dobro do défice que nos prometeram, enquanto o desemprego disparou para números dramáticos e a dívida continua a crescer.

Mas, nada disto envergonha, minimamente, quem nos governa. Continuam, como se nada se passasse, a prostituir as palavras e as promessas. Paulo Portas garante-nos, por estes dias, que já "batemos no fundo", e a partir daqui "vamos subir a escada". Por sua vez, o ministro da Propaganda, Poiares Maduro afiança-nos que "o governo tudo tem feito para que o país possa concluir com sucesso o programa de ajustamento". Não têm emenda, nem assomo de frontalidade. A desfaçatez, a leviandade, a irresponsabilidade e a incompetência é a mesma com que Passos Coelho, em Abril de há dois anos, declarou, com ar solene: " todos aqueles que produziram os seus descontos e que têm hoje direito às suas reformas e às suas pensões as deverão manter no futuro, sob pena de o Estado se apropriar daquilo que não é seu". Este governo não acerta uma: faz o que jurou nunca fazer e não faz o que se compromete a fazer.

Este colossal embuste político em que vivemos, no qual o "memorando de ajustamento" com a troika serviu de pretexto para que um grupo de neoliberais estruturalmente analfabetos, sobretudo por razões ideológicas, se atirasse à tarefa de enfraquecer os mais fracos e fortalecer os mais fortes, vai acabar muito mal. Depois de dia 29, passadas as eleições autárquicas, e se os resultados eleitorais para os partidos da coligação no governo não forem suficientemente penalizadores, chegarão as dolorosas "facturas" no orçamento de Estado do próximo ano, no prosseguimento desta política intencional de empobrecer, empobrecer cada vez mais.

O caminho por onde este governo leva o país é mais o de um segundo resgate, com todas as consequência que daí resultam, sobretudo para milhares de portugueses que nunca mais terão oportunidade de voltar a ter um emprego e uma vida minimamente decente, do que o do "regresso aos mercados". Como escreveu Albert Camus, cujo centenário de nascimento se comemora este ano: "Um décimo da humanidade terá direito à personalidade e exercerá a autoridade ilimitada sobre os outros nove décimos. Estes perderão a sua personalidade, tornando-se uma espécie de rebanho, restritos à obediência passiva, sendo reconduzidos à inocência primeira, por assim dizer, ao paraíso primitivo, onde, de resto, deverão trabalhar."

sábado, 21 de setembro de 2013

Portas e escadas

Texto de Joana Amaral Dias hoje publicado no "Correio da Manhã".

 Muito satisfeito consigo mesmo, Portas alardeia que existem indicadores positivos na economia, que "já saímos do fundo e estamos a começar a subir a escada".

Propaganda eleitoral tem limites. Diz que estamos a subir a escada enquanto rouba as pensões e os cortes vão incidir nos mais pobres? Subir a escada? Só se for a escada da morte da pedreira de Mauthausen. Os prisioneiros trepavam 186 degraus carregando blocos de 50 kg. Uns morriam de exaustão e caíam. Outros, por efeito dominó, eram derrubados e também encontravam a morte. 

Lembram-se das palavras de Portas sobre a TSU dos pensionistas ? "Cisma grisalho" e "a linha vermelha que não posso deixar passar"? Quatro meses volvidos, um cargo de vice-PM no bolso, uma compulsão em acelerar quando o semáforo está ao rubro, e zás: 346 mil pensionistas a tombar. Pois, trata-se de alguém que fez a sua carreira política com base nessa habilidade de trocar de pele como quem troca de casaca. Mas este será um daqueles casos em que a vantagem vira veneno, o que é possível – e muito desejável – que conste no seu epitáfio político.

quarta-feira, 18 de setembro de 2013

A baderna

Texto de Baptista Bastos hoje publicado no "Diário de Notícias"

Irado, inesperadamente fora do sorriso habitual, o Marcelo exclamou: "Façam desaparecer Maduro e Rosalino, que não se perde nada!" Pelos vistos, o Marcelo quer mandar eliminar pessoas, cuja competência põe em causa, e não encontra punição mais exemplar que não seja o "desaparecimento." 

" Entende-se o desespero cáustico do professor. Ele vê, nas proposições do primeiro e nas precipitações tagarelas do segundo o mesmo espinoteante tolejo. Adicionando a esta confusão de cabecinhas doidas, a disparidade dos discursos produzidos por Passos, que diz uma coisa; de Portas, que diz outra; e de Maria Luís, que balbucia uma terceira, nada mais resta ao Marcelo do que invectivar quem assim pensa, comunica e age.

Mais ainda: acusa de soberba para com os portugueses, este Executivo fanado e estático, gastador e de comportamento caótico e casual. Só o primeiro-ministro (digo eu, agora) dispõe de um arsenal de gente, que surpreende não apenas pelo número como pela obscura natureza das ocupações. Vejamos: um chefe de gabinete, dez assessores, sete adjuntos, quatro técnicos especialistas, dez secretárias pessoais, uma coordenadora, treze técnicos administrativos, nove elementos para apoio auxiliar, doze motoristas. Não entra, neste ameno grupo, o avultado grupo de "gorilas" que o protege de eventuais percalços. Este pessoal custa, por mês, ao Estado, 149 486 76 euros.

É este senhorito que se prepara para aumentar ainda mais os impostos, cortar outra vez nas reformas e nas pensões, aumentar o número de desempregados, dilatar o nosso infortúnio, desprezar o futuro dos mais novos e ignorar o desespero sem saída dos mais velhos. É ele.

A baderna prossegue. O dr. Cavaco, dito Presidente da República, mas não se dá por isso, pediu à troika, numa patética declaração, sensatez nas decisões. Os funcionários para aqui mandados são fiscais de contas, sem poder decisório porque esse pertence ao FMI, ao Banco Central Europeu e à Comissão Europeia. O dr. Cavaco parece ignorar que os burocratas que nos visitam, a fim de verificar se obedecemos às regras impostas, são paus-mandados, e eles próprios atendem ao que lhes impõem os directores daquelas três instituições, as quais são coordenadas friamente pela Alemanha.

Ignoram a História, a cultura, as características, as idiossincrasias dos povos por onde passam, em curto ou ampliado tempo. Pouco se importam se humilham ou desdenham das nações em que foram encarregados de proceder aos seus varejos. Os vexames a que têm sujeitado o povo grego são das situações mais ignóbeis verificadas no nosso tempo, e possuem as distintivas particulares de um sórdido ajuste de contas. O que a Alemanha não conseguiu, com duas guerras mundiais, está a obtê-lo agora, com a mediocridade ultrajante, a cumplicidade servil e a sevandijice nojenta dos dirigentes políticos europeus.

terça-feira, 17 de setembro de 2013

Servos da dívida

Texto de Paulo Morais, Professor Universitário, hoje publicado no "Correio da Manhã"

 O desígnio maior das políticas do governo é o pagamento de juros. Os governantes reduzem assim cidadãos e empresas à condição de escravos ao serviço de agiotas.

A intervenção externa, a que estamos condenados desde 2011, já teve por primeiro objetivo garantir que o estado português disporia de recursos para pagar os juros usurários a que se tinha comprometido ao longo dos anos, em particular nos últimos meses da era Sócrates. Os sucessivos empréstimos da troika não vieram resgatar o estado português, mas sim os bancos a quem este devia dinheiro.

O resgate da banca veio o sequestro do estado português. A maior das despesas públicas é agora o pagamento de serviço da dívida, que orça em cerca de oito mil milhões de euros anuais. Mais do que à educação, à saúde ou à segurança social, os impostos dos portugueses destinam-se ao pagamento de dívidas mal contratualizadas ao longo dos anos. Gastar mais em juros do que em qualquer área social é irracional. Seria o equivalente, em termos de economia doméstica, a uma família despender mais
em perfumes do que em alimentação.

Para sustentar um orçamento monstruoso e enviesado, o governo endurece a carga fiscal, agrava o IVA na restauração, aumenta o IRS a quem ganha mil euros, baixa as pensões e as reformas. A quebra do poder de compra reflete-se na diminuição do consumo e consequente redução da riqueza do país. Fecham empresas, aumenta o desemprego. O modelo de gestão das finanças públicas destrói a economia.

Cidadãos e empresas ficam assim sujeitos ao empobrecimento e reduzidos à condição de servidores do orçamento de estado. Até as verbas da segurança social são, de forma perversa, desviadas para títulos de dívida pública. Ao obrigar os pensionistas à condição de credores do estado, o governo inviabiliza qualquer renegociação de dívida. Pois doravante a redução de juros ou o alargamento da maturidade dos empréstimos virá prejudicar fortemente as reformas e pensões.

Voltamos ao sistema feudal. Assim como na Idade Média rural os portugueses eram servos da gleba, hoje, em época de predomínio financeiro, estamos condenados à condição de meros servos da dívida.

segunda-feira, 16 de setembro de 2013

Os pobres que paguem a crise

Texto de Tomás Vasques hoje publicado no jornal I-online

Apareceram os slogans que sustentaram esta revolução invertida - a expropriação dos pobres para dar aos ricos: "Viveram acima das suas possibilidades, agora têm de pagar"
A falência do banco de investimento Lehman Brothers, há cinco anos, a 15 de Setembro de 2008, é o símbolo que melhor ilustra o desvario, a extrema ganância e a impunidade que, durante décadas, caracterizaram o sistema financeiro e bancário, só possível com a conivência e a cumplicidade de governantes de muitos países e instituições públicas encarregues da regulamentação e fiscalização de tais desmandos. Mais: é o símbolo da decadência em que o sistema da "livre concorrência" se afundou; ou melhor, nos afundou. Foi o tempo em que as vigarices e os crimes financeiros mais torpes conferiram estatuto de "génios da engenharia financeira" a gente inqualificável, como foi o caso de um sujeito de nome Bernard Madoff, um corrector, antigo presidente da bolsa de valores tecnológicos de Nova Iorque, autor de uma fraude superior a 50 mil milhões de euros. Depois, atrás da crise nos "mercados do crédito hipotecário de alto risco", eufemismo usado para disfarçar actividades bancárias criminosas, que faziam da "nossa" Dona Branca uma senhora respeitável, apesar de esta ter sido condenada, no tribunal da Boa-Hora, a muitos anos de prisão por burla agravada, chegou à Europa uma outra crise - a das "dívidas soberanas".

Esta "nova crise", decorrente da anterior, teve início no princípio de 2010, depois dos socialistas gregos, recém-eleitos, terem denunciado falcatruas nas contas públicas, perpetradas pelos seus antecessores, que colocavam em causa a capacidade de pagamento das dívidas contraídas pelo Estado grego. Daí para cá, sob o comando dos conservadores alemães, chefiados pela senhora Merkel, começou um doloroso processo de desconstrução europeia - desconstrução civilizacional, democrática e económica. A "economia de casino" que até aqui nos conduziu, os desmandos e os crimes financeiros de banqueiros e correctores, dos Madoff e companhia, e à nossa escala, dos Oliveira e Costa e Rendeiro, tinham que ser pagos, até ao último tostão, com língua de palmo, e com juros avultados, por quem anda por cá mais a vegetar do que a viver. Mais: pagar as dívidas do Estado e recapitalizar os bancos, autores de todas estas "proezas". Apareceram, então, para sustentar o engodo, os slogans que sustentaram esta revolução invertida - a expropriação dos pobres para dar aos ricos: "viveram acima das suas possibilidades, agora têm de pagar", "não há dinheiro, qual das três palavras não perceberam", "é preciso baixar os salários ainda mais" e muitos outros do mesmo género. Não é por acaso que os principais defensores destas "ideias" do governo são banqueiros, como Fernando Ülrich ou o falecido António Borges.

Esta lógica imoral e infernal, segunda a qual os que menos têm, devem suportar os luxos dos que mais têm - numa estratégia premeditada, que Dante desconhecia quando escreveu "O Inferno" - tem levado a esta permanente expropriação de quem mais precisa: subsídios de natal e férias, salários, indemnizações por despedimento, reformas e pensões de sobrevivência, impostos e tudo o mais, deixando incólume as PPP, os contratos swap, as rendas à EDP e tudo o que esteja relacionado com os autores do grande crime: os bancos e o sistema financeiro. É este o governo que temos e não há no horizonte a menor brisa de mudança.

PS - Dizem que, depois da falência do Lehman Brothers, o mundo mudou, mas é mentira. Nada mudou a não ser a pobreza em que muitos milhões de cidadãos caíram. Um exemplo: realizou-se há dias uma feira de automóveis, na Alemanha. Entrevistado o vendedor de um automóvel em exposição, cujo preço ultrapassa largamente os salários de centenas de pessoas durante toda a vida, o vendedor declarou: "Claro que se vende. O cliente Bugatti tem em regra 32 carros na garagem."

sábado, 14 de setembro de 2013

As linhas do dr. Portas

Texto de Nuno Saraiva hoje publicado no "Diário de Noticias"

Que a palavra do dr. Portas é meramente casuística e instrumental, já todos sabemos. Pelo menos desde que em meados do verão, após a diatribe da sua demissão "irrevogável", se viu promovido a vice-primeiro-ministro, dando todo um novo sentido e significado ao conceito de irredutibilidade.

Ao aprovar esta semana, em nome da convergência de sistemas, o corte de 10% nas pensões da Caixa Geral de Aposentações, o Conselho de Ministros encarregou-se de nos mostrar, mais uma vez, a volatilidade dos compromissos e das fronteiras inultrapassáveis do líder do CDS.

Foi em maio, a propósito da chamada "TSU dos pensionistas", que o dr. Portas, qual Quixote dos reformados, se empertigou para, solenemente, declarar que não aceitava que os mais velhos e desprotegidos, "aqueles que não têm voz", fossem, de novo, fustigados pela austeridade virtuosa que os moinhos de vento, encarnados pelo primeiro-ministro, queriam impor.

Afirmava então o irrevogável dr. Portas: "Num país em que parte da pobreza está nos mais velhos, numa sociedade em que inúmeros avós têm de ajudar os filhos que estão no desemprego e cuidar dos netos, num sistema social que tem de respeitar regras de confiança, o primeiro-ministro sabe, e creio ter compreendido, que esta é a fronteira que não posso deixar passar. Porque não quero que em Portugal se verifique uma espécie de cisma grisalho que afetaria mais de três milhões de pensionistas, uns da Segurança Social outros da CGA. Quero, queremos todos no Governo, uma sociedade que não descarte os mais velhos. Quero, queremos todos no Governo, um ajustamento que não prejudique, sobretudo, os que não têm voz."

Passados quatro meses, verificamos que afinal existem pelo menos 346 mil pensionistas - o total de reformas atingidas por mais este golpe - que são "descartáveis". É certo que há uma diferença quantitativa substancial - definitivamente, 346 mil não são três milhões -, o que até pode servir ao vice-primeiro-ministro para o habitual discurso de autoelogio de que o pacote até "podia ter sido mais sombrio" não fosse a intervenção do CDS. Mas o que resulta claro das medidas aprovadas - veremos o que diz o Tribunal Constitucional - é que, para o Governo em geral e para o dr. Portas em particular, há pensionistas de primeira e de segunda. E que os princípios de confiança que devem regular o sistema são tão descartáveis quanto estes pensionistas ou as palavras do líder CDS.

Do que estamos a tratar não é de gente privilegiada, com pensões bastardas ou abusivas porque não descontou para elas. Do que estamos a falar é de pessoas que trabalharam a vida inteira, descontando aquilo que o Estado lhes exigiu, na expectativa mais do que legítima de, chegada a idade da reforma, auferir a remuneração que lhes é devida.

E é também uma questão moral. Invocar, como tantas vezes se faz, a solidariedade entre gerações para justificar o "assalto" às reformas de quem ganha acima dessa fortuna que são 600 euros mensais é, como já aqui escrevi, criminoso. Como dizia, em maio, o dr. Portas, por ventura "num ato de dissimulação", são aos milhares os avós que ajudam os filhos desempregados a cuidar dos netos. E isto também é solidariedade entre gerações. É, aliás, normal que os mais novos e ativos sejam chamados a contribuir para o financiamento do sistema de segurança social que paga as pensões daqueles que entretanto se reformaram, após cumprirem a sua carreira contributiva, mesmo sabendo que, é mais que certo, não terão acesso ao mesmo nível de pensões daqueles que hoje as recebem.
Dito isto, é absolutamente claro que para o dr. Portas não existem linhas inultrapassáveis nem compromissos irrevogáveis. De agora em diante, o CDS, que reclamava, e bem, os louros de ter contribuído para o descongelamento das pensões mínimas, sociais e rurais, será reconhecido por ter sido cúmplice da inadmissível rutura total do contrato social até agora existente.

De há dois anos e uns trocos a esta parte, somos confrontados com o discurso da inevitabilidade e com a punição por termos vivido acima das nossas possibilidades. Sabemos, por mais que agora se tente negar, que o objetivo sempre foi o empobrecimento de trabalhadores e reformados. E desconfiamos que, desde logo por falta de equidade, este será mais um diploma a esbarrar no Tribunal Constitucional. Afinal, o pretexto para mais uma vez agradar à troika e alargar o corte a todos os pensionistas, como exigido desde o início pelo FMI, pelo BCE e pela Comissão Europeia.

Uma imoralidade, enfim, ou o "cisma grisalho" que, com lágrimas de crocodilo, se fingiu querer travar.

quarta-feira, 11 de setembro de 2013

O mentiroso

Texto de Baptista Bastos hoje publicado no "Diário de Notícias"

Pouco há a fazer senão demonstrarmos a nossa indignada repulsa. O homem é um mentiroso compulsivo. Há dois anos ameaçou-nos com o empobrecimento, "única alternativa", dizia, à soberba que de nós se apossara para vivermos "acima das nossas possibilidades." Íamos, pois ficar mais pobres do que temos sido. Depois, como a Fénix que renasce das cinzas, gozaríamos de um cintilante futuro. O rol de miséria que se seguiu causou-nos infortúnios e desditas sem nome. Agora, o mesmo homem, possuído de amnésia contumaz, veio afirmar que nenhum político seria capaz de afirmar tal destino. A SIC, pressurosa e cheia de zelo informativo, foi aos arquivos e retransmitiu a primeira e a segunda mensagens. Acaso para avivar a lembrança do desmemoriado ou, simplesmente, para reforçar o que dele sabemos: transformou a mentira numa banalidade.

O pior de tudo é que não nos podemos esconder nem fugir deste homem. Ele está em todo o lado, com rostos diversos e múltiplos, a mesma voz enfática, a mesma mentira travestida, as mesmas maneiras afáveis e frias. Mentir a nós, que temos cama, mesa e roupa lavada asseguradas, é o menos. Mentir aos desempregados, aos velhos, aos miúdos famintos nas escolas, aos moços e moças que não sabem o que fazer porque lhes foi tirada a mais ínfima parcela de sonho - essa, sim, é uma mentira monstruosa, a merecer todas as maldições, os maiores dos desprezos, a mais vil de todas as execrações.

Como é possível que haja gente, presuntivamente de bem, a apoiar este mentiroso que não só nos empobreceu materialmente como nos enfraqueceu a alma, nos amolgou o espírito com perseverança infame, e continua a impelir-nos para uma perdição tão maldosa que, ela própria, nos escapa; como é possível?

A mentira multiplicada quebrou a coesão e colocou portugueses contra portugueses, numa endemia moral que irá prolongar-se. Com extrema dificuldade, os governos que se seguirão conseguirão repor o que nos indicava como o povo mais lógico, por mais unido, da Europa. O mentiroso conseguiu o que mais ninguém obteve, com repressão ou com o montante. Levou-nos até ao desgosto da palavra, porque houve quem acreditasse na voz de tenor, falsamente casta, e na insistência maviosa dos temas.

Redignificar a função, reabilitar a grandeza do falar verdade, é tarefa de resgate incomum; e não vejo quem disponha da elevação necessária e urgente para tal empreitada. Os políticos entenderam a facilidade como norma de uma vitória sobre o tempo, e abandonaram, por incúria e ignorância, as convicções e a consciência de missão. O seu combate é outro. E no caso português muito mais evidente, pelas debilidades culturais dos intervenientes. O mentiroso comum é desprezível; o mentiroso político, abominável: pertence a uma época estimulada pela incerteza, e incapaz de se opor às estruturas ideológicas que tomaram conta da Europa.

terça-feira, 10 de setembro de 2013

Residente da República

Texto de Paulo Morais, Professor Universitário, hoje publicado no "Correio da Manhã"

 Este regime constitucional está agonizante: a Assembleia da República, sede da democracia, abastardou-se, os governantes mentem todos os dias, o povo tem sede duma justiça que nunca chega. O representante máximo do sistema, Cavaco Silva, já não exerce as suas funções presidenciais.

Ao Parlamento está atribuída a função constitucional de legislar. Mas os deputados entretêm-se apenas a fazer negócios. Várias dezenas acumulam a função parlamentar com a de administrador, diretor ou consultor de grupos económicos que beneficiam de favores do estado. Os restantes pactuam com esta promiscuidade. A Assembleia também não fiscaliza, como lhe competiria, a atividade governativa. Os deputados da maioria apoiam acriticamente as atitudes do governo, os da oposição são cadeias de transmissão das direções partidárias, os grupos parlamentares estão reduzidos à condição de claques. Entretanto, a legislação de maior relevância económica é produzida nas grandes sociedades de advogados. Os seus associados apresentam-se nos tribunais a litigar com base em leis que eles próprios produziram, violando o princípio constitucional da separação de poderes.

O governo, esse, está sem rumo. As medidas mais relevantes deste executivo são contrárias ao que Passos Coelho havia prometido em campanha, rompem o compromisso assumido com o eleitorado. Passos mentiu-nos e é, afinal, um mero seguidor das políticas de José Sócrates: reduz pensões e salários, fustiga cidadãos e empresas com impostos. Continua a beneficiar os bancos, aos quais garante elevada remuneração pela dívida pública e fundos para recapitalização; mantém os privilégios dos especuladores imobiliários, nomeadamente isenções fiscais, a nível de IMI e IMT. Garante taxas de rentabilidade obscenas nas parcerias público-privadas 

Entretanto, o sistema judicial claudica. Sem independência e sem meios, revela-se incapaz de combater a corrupção que sequestrou o regime.

Só uma intervenção da Presidência da República poderia agora desencadear um processo de regeneração. Mas o residente de Belém, que jurou a Constituição e é o responsável pelo regular funcionamento das instituições, assiste, imóvel, ao estertor desta democracia moribunda.

sábado, 7 de setembro de 2013

O desdesenvolvimento em curso

Texto de Carvalho da Silva hoje publicado no "Jornal de Noticias"

Afinal, o empobrecimento de que o primeiro-ministro (PM) falava há poucos meses não é nada que alguém, em perfeito juízo, possa defender. Passos Coelho, entretanto convertido a ajuizado, fala agora de "ajustamento", uma palavra que fere muito menos os ouvidos, sobretudo em vésperas de eleições. 

Pouco lhe importa que o tal "ajustamento" tenha já empobrecido os portugueses e que novos "ajustes" em preparação nos tragam mais pobreza e miséria humana. A palavra ajustamento soa melhor. Parece ser um acerto indispensável e temporário. Insinua o PM que passado o ajustamento, postas as coisas no seu lugar, regressaremos à normalidade. Mas essa será uma "normalidade" ultrajante face ao baixo patamar de condições de vida em que estaremos colocados, ao agravamento das desigualdades, das injustiças, da exclusão social.

Empobreceram os portugueses em nome de um pretenso "viver acima das possibilidades", sabendo que a generalidade dos portugueses é poupada e fez sacrifícios para ter direito a uma casa com um mínimo de dignidade - paga aos bancos no triplo do seu valor - ou para dar formação aos seus filhos. De seguida, roubaram salários e pensões para o "país pagar a dívida pública", quando afinal a austeridade aumentou a dívida e diminuiu a capacidade do país de produzir riqueza.

Este "ajustamento" é inquestionavelmente feito pelo empobrecimento, destrói e não cura, deixando marcas profundas. É um facto insofismável que se estão a empobrecer as pessoas, a escola, os sistemas de saúde e segurança social, os serviços públicos. Que se destroem empresas e organizações.
Costuma dizer-se que "de boas intenções está o Inferno cheio". A política, e em particular os atos da governação, consubstanciam opções concretas sobre a vida das pessoas e do país. Deixemo-nos de condescendências e branqueamentos à personalidade do PM. Ele, a troika e outros figurões nacionais e europeus, que vêm impondo este inqualificável "ajustamento", sabem bem o que ele significa. Quando a troika, por certo combinada com o governo, lança na comunicação social a ideia de cortar no salário mínimo ou de liquidar definitivamente a negociação coletiva e o diálogo social, assume desproteger e empobrecer ainda mais os portugueses.

No Portugal imaginário da troika e de Passos Coelho, construído com um discurso traiçoeiro e mentiroso, dizia-se que o empobrecimento era purificador e criava poupança, atraía capitais, gerava investimento e fomentaria o emprego. No Portugal real, o "ajustamento" canaliza a poupança para o serviço de uma dívida que nunca é paga, destrói o Estado social, engordando os mercados da saúde, do ensino e das reformas, gera um brutal desemprego, reforça a nossa dependência relativamente aos credores e às instituições que os representam, oferece ao desbarato recursos nacionais na "tentativa" de seduzir capitais internacionais que jamais se seduzirão com as sessões de "strip" de Portas, de Passos Coelho e de Maria Luís.

O nosso problema é que o "ajustamento", feito por um empobrecimento conscientemente promovido, é na realidade a estrada que conduz não à recuperação, mas ao declínio. O "ajustamento", ou o que lhe queiram chamar, não é "apenas" uma boa dose de empobrecimento e de graves problemas sociais imediatos, é também o início de um complexo processo de desdesenvolvimento, uma delicada armadilha para o nosso futuro.

São perigosas as ilusões de que a troika irá embora e encontraremos soluções nos "mercados", ou o sebastianismo que aguarda um milagre europeu. A destruição da economia, o desemprego massivo, a emigração de jovens qualificados, a destruição de estruturas do Estado e da chamada sociedade civil impedem o país de criar a riqueza necessária. A dívida tende a manter-se e a aumentar. A declaração do seu incumprimento será uma questão de tempo, trazendo uma montanha de problemas para gerações de portugueses.

Ou os portugueses não abdicam da soberania, conseguem impor uma rápida mudança de rumo e de governo, ou ainda vão ser acusados de não terem permitido a resolução da crise por não fazerem os sacrifícios que se impunham e por teimarem em querer viver em democracia.

Ignorância e falta de senso

Texto de Nuno Saraiva hoje publicado no "Diário de Noticias"

Esta semana, os juízes do Tribunal Constitucional passaram, na perspetiva do Governo e do primeiro-ministro, de bestas a bestiais. De espaço onde impera a falta de senso, o Palácio Ratton transformou-se agora numa ode à razoabilidade. E tudo porque, desta vez, a douta decisão de validar as candidaturas dos chamados "dinossauros autárquicos" veio ao encontro dos desejos partidários mais íntimos do dr. Passos.

Tanta incoerência, graças a Deus. Definitivamente, Pedro Passos Coelho é, assim, uma espécie de serial killer constitucional. Na Universidade de Verão da JSD, o primeiro-ministro mostrou, mais uma vez, o desprezo que sente pela Constituição da República e pelo Tribunal Constitucional.

Numa extraordinária exibição de populismo e demagogia, temperada com ignorância q. b., Passos Coelho questionou, sob o aplauso frenético da assistência acrítica e submissa: "Já alguém se lembrou de perguntar aos 900 mil desempregados de que lhes valeu a Constituição até hoje?" Não vale sequer a pena enfatizar a falta de decência de - na boca do primeiro-ministro, e apesar de as estatísticas o demonstrarem há tempo demasiado, para sustentar o ataque a um acórdão do Constitucional - se manipularem os números do desemprego de acordo com as conveniências. E também não está em causa a legitimidade de contestar e discutir decisões judiciais. Em democracia, como é óbvio, não há vacas sagradas e tudo é questionável, a começar pelo próprio regime.

Do que se trata é de saber se é aceitável que um primeiro-ministro, seja ele qual for, insulte de forma grosseira a inteligência dos portugueses.

Só por ignorância ou má-fé é que alguém pode questionar o papel da Constituição no que à proteção social diz respeito. Por exemplo, o número 1 alínea e) do artigo 59.º diz que "todos os trabalhadores, sem distinção de idade, sexo, raça, cidadania, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, têm direito à assistência material, quando involuntariamente se encontrem em situação de desemprego". E, mais adiante, o número 3 do artigo 63.º determina que "o sistema de segurança social protege os cidadãos na doença, velhice, invalidez, viuvez e orfandade, bem como no desemprego e em todas as outras situações de falta ou diminuição de meios de subsistência ou de capacidade para o trabalho". Isto é, queira ou não queira o dr. Passos Coelho, a verdade é esta. Os desempregados - infelizmente não são todos - devem à Constituição da República a consagração do pagamento de subsídio de desemprego.

Mas do que se trata também é de avaliar se é tolerável que um primeiro-ministro proponha reiteradamente medidas que vão contra o texto constitucional. E que, à viva força, queira forçar um tribunal a quem é solicitado que se pronuncie sobre a conformidade das leis - sim, o Tribunal Constitucional não age por mote próprio - a dizer aquilo que mais lhe convém. É, aliás, de uma ingratidão sem nome acusar de falta de "bom senso" e de "ter protegido mais os direitos adquiridos do que as gerações do futuro", um tribunal que, por exemplo, permitiu, em nome do estado de emergência financeira, o corte de salários aos funcionários públicos, a não devolução imediata de subsídios de férias e de Natal suspensos em 2012 ou a cobrança de uma contribuição extraordinária de solidariedade.

Mas importa reter também a afirmação de que o problema não é da Constituição mas da interpretação que os juízes fazem dela. Parece-me claro que há, de facto, um problema, mas com a interpretação que o primeiro-ministro faz das palavras dos juízes. O que diz o acórdão não é que os funcionários públicos não podem ser despedidos. O que é afirmado é que pode haver despedimentos, desde que as condições sejam objetivas e controláveis.

Dito isto, parece evidente que quem padece de falta de bom senso é Pedro Passos Coelho quando, no mesmo discurso, decide desrespeitar o Tribunal Constitucional e também Cavaco Silva, que, convém não esquecer, foi quem manifestou fundadas dúvidas sobre a constitucionalidade da lei de requalificação dos funcionários públicos e, por isso, pediu a intervenção do Palácio Ratton.

Tivéssemos nós um Presidente da República que não fosse o "pai" deste Governo e já o primeiro-ministro tinha sido chamado a Belém para se retratar dos insultos proferidos contra o Chefe do Estado e o Tribunal Constitucional. Mas não temos, e é uma pena.

quarta-feira, 4 de setembro de 2013

O perfeito juízo do dr. Passos. E o meu.

Texto de Nicolau Santos, hoje publicado no "Expresso" online.

Em mais uma intervenção estival, o dr. Passos disse perante uma pequeno agrupamento de populares pouco entusiasta que ninguém no seu perfeito juízo, quer esteja à frente do Governo ou duma autarquia, trabalha para fazer empobrecer as suas comunidades.

Eu tive de bater três vezes com a mão no televisor, porque a instalação elétrica da casa onde vivo não é grande coisa e às vezes o sinal desaparece ou chega aos soluços, com o som também a ressentir-se.

Mas depois ouvi a repetição e o dr. Passos insistiu: ninguém no seu perfeito juízo, à frente do Governo ou duma autarquia, trabalha para fazer empobrecer as suas comunidades. 

Desta vez, agarrei-me ao telefone e marquei rapidamente uma consulta, que no entanto não ocorrerá antes de 2014, para saber do meu estado de sanidade mental.

É que na verdade, eu lembro-te de ter ouvido muito claramente o primeiro-ministro dizer no início deste ajustamento, há cerca de dois anos, que o país não sairia da crise a não ser empobrecendo. Que tínhamos gasto mais do que devíamos. Que nos tínhamos endividado à grande e à francesa para viver acima das nossas possibidades.  E repetiu a ideia algumas vezes, o que me levou a perguntar se este era o programa político que o dr. Passos tinha para motivar os portugueses. empobrecer.

Ora afinal o dr. Passos diz agora que não disse o que eu ouvi. E que ninguém no seu perfeito juízo diria tal coisa. Como o dr. Passos não mente, isto reconduz-nos a duas hipóteses: ou o dr. Passos não está no seu perfeito juízo, o que é impossível, tratando-se do homem do leme, do primeiro-ministro que conduz o país no meio da porcela que atravessamos; ou eu não estou no meu perfeito juízo, o que é altamente provável. 

Aliás, chegaram agora aqui dois senhores de bata branca que trazem uma daquelas camisas que apertam atrás. Queres ver que é para mim?

terça-feira, 3 de setembro de 2013

Guerra civil

Texto de Manuel Catarino, Redator Principal, hoje publicado no Correio da Manhã

Não se discute com idiotas. Além de inútil, é perigoso. Ainda assim, quero dizer a Passos Coelho que é de toda a conveniência medir as palavras para evitar que pareça tão inepto.

A propósito do último ‘chumbo’ do Tribunal Constitucional, deixou uma pergunta: "Já alguém perguntou aos 900 mil desempregados de que lhes valeu a Constituição?". Não lhe ocorreu que a pergunta, maldosa e própria de um cacique, é intolerável num chefe de Governo: divide os portugueses entre de-sempregados sem presente e funcionários públicos que tudo têm, semeia o ódio, apela à guerra civil. 

Quem faz isto não tem classe nem para vogal do grupo excursionista ‘vai que não deixas saudades’.

segunda-feira, 2 de setembro de 2013

Pergunte-se aos desempregados

Texto de Ana Sá Lopes hoje publicado no  jornal "i"

O primeiro-ministro comportou-se ontem como um golpista de Estado

Já alguém se lembrou em Portugal de perguntar aos mais de 900 mil desempregados de que lhes valeu até hoje a Assembleia da República? De que lhes valeu Assunção Esteves? E o 25 de Abril? De que lhes valeu o deputado Luís Montenegro? Ou o deputado Luís Menezes? Ou o deputado xpto? Já alguém se lembrou de lhes perguntar de que lhes valeu o governo? E de que lhes valeu Pedro, Paulo, Maria Luís Albuquerque, os outros e respectivos assessores? De que lhes valeu a existência de todos os ministros e secretários de Estado? De que lhes vale, aos 900 mil, a existência de câmaras e de presidentes de câmara? E de juntas de freguesia? E dos embaixadores e secretários de embaixada?

Já alguém se lembrou, em Portugal, de perguntar aos 900 mil de que lhes valeu a democracia? A União Europeia? As viagens dos governantes a Bruxelas? As viagens dos membros do governo às organizações não sei o quê bilaterais? E de que lhes valeu o Tribunal de Contas? As eleições livres e justas? A tropa? A Cinemateca? O Teatro Nacional? O Palácio de São Bento? Os almoços de Estado? Os almoços que não são de Estado pagos pelo erário público?

Já alguém se lembrou de perguntar aos desempregados de que lhes valeu o Presidente da República, que jurou defender a Constituição? E a Câmara Municipal de Ponta Delgada? E as autonomias regionais? E o direito de voto a partir dos 18 anos? E o direito à não discriminação em função da raça e do sexo? E a separação de poderes?

Já alguém se lembrou de perguntar aos 900 mil de-sempregados de que lhes valeu ter eleito um taxista como primeiro-ministro, sem ofensa para os taxistas? De que lhes valeu a existência da JSD e das universidades de Verão, um excelente centro de recrutamento para um futuro emprego no palácio de São Bento sem grandes aborrecimentos?

O primeiro-ministro comportou-se ontem como um golpista de Estado, no mais demagógico ataque feito por algum titular de órgão de soberania contra a Constituição que está obrigado a cumprir - e contra o Presidente da República, que jurou cumpri-la, que desencadeou a avaliação preventiva da lei dos despedimentos da função pública.

É preciso lembrar ao primeiro-ministro que "o Estado subordina-se à Constituição e funda-se na legalidade democrática" e que "a validade das leis e dos demais actos do Estado (...) depende da sua conformidade com a Constituição". O resto é uma fantasia de golpe de Estado típica de qualquer república das bananas.

E o Estado de Direito não põe comida no prato

Texto de Daniel Oliveira, publicado no seu blogue "Antes pelo contrário" no "Expresso".

"Já alguém perguntou aos mais de 900 mil desempregados do que lhes valeu a Constituição?" A frase do primeiro-ministro é todo um programa. Antes de tudo, é uma declaração de guerra ao Estado de Direito. O que vem depois disto? Que a democracia não põe comida no prato? Que as eleições não fazem crescer a economia? Que a liberdade de expressão não aumenta as exportações? 

Esta frase é, ainda por cima, de um tremendo cinismo. O homem que, como primeiro-ministro, mais postos de trabalho ajudou a destruir em Portugal tem a suprema lata de usar o sofrimento dos desempregados para atacar o Tribunal Constitucional e a Constituição. Não, a Constituição não nos protege de primeiros-ministros incompetentes. Apenas impede que governem como se vigorasse, por sua própria decisão e à margem da lei, o estado de emergência. Ela defende valores que as democracias têm como fundamentais. Entre eles, a proteção da confiança que, por unanimidade, os juízes consideravam que era afetada pela proposta do governo para a "requalificação" dos funcionários públicos. Na realidade, o acórdão até abre a porta a despedimentos na função pública. Apenas impede que eles aconteçam por este meio.

Para Passos Coelho o problema da decisão do Tribunal Constitucional não está propriamente na Constituição, mas na interpretação que o TC faz da mesma. Segunda lição ao primeiro-ministro sobre o Estado de Direito: se as leis não precisassem de ser interpretadas quando são subtidas a realidades concretas os tribunais não eram necessários. Se a Constituição não tivesse de ser interpretada quando se avalia a constitucionalidade de uma lei o Tribunal Constitucional seria uma inutilidade. Claro que o TC faz uma interpretação da Constituição. Tendo em conta que essa interpretação foi unânime, mandaria a humildade acatá-la sem grandes comentários e no respeito pelas instituições e pelas suas funções. 

Por fim, Passos Coelho diz que parte para a conversa com a troika com dificuldades. Por não poder dizer se "não haverá problemas" com as medidas que venha apresentar. Ou seja, será difícil explicar à troika que Portugal, sendo uma democracia, tem leis que limitam a ação do governo e tribunais que as aplicam. Recordo o que disse recentemente a ensaísta alemã Gertrud Höhler, quando deu como bom exemplo de instrumentos de resistência à cegueira europeia o veto do Tribunal Constitucional português às medidas propostas no Orçamento de 2012. Considerou-o um sinal para as opiniões públicas europeias de que, como comunidade, ainda existimos. Como se fosse dito, explicou a ex-conselheira de Helmut Kohl, "lamentamos, mas temos aqui um obstáculo que não podemos ultrapassar". 

Se Passos Coelho não considerasse, como considera, que o programa da troika é o seu programa, veria mais este veto como um instrumento negocial valioso. Pelo contrário, está a trata-lo como um pretexto para mais ataques aos reformados, para um segundo resgate (com este ou outro nome) há muito anunciado e para esconder as suas próprias responsabilidades. Lá diz o povo que quando o macaco não sabe dançar a culpa é do chão.

Passos e os juízes do TC


Texto de Eduardo Dâmaso, Director-Adjunto, hoje publicado no "Correio da Manhã"

Passos Coelho diz que os juízes têm uma leitura ‘conservadora' da Constituição.

Não ponderam a alteração de circunstâncias que levou o País à beira da bancarrota.

Se a alteração de circunstâncias levasse a um agravamento das penas para os crimes de corrupção, abuso de poder, peculato, tráfico de influências, enriquecimento ilícito, tinha razão. Também o teria se as mesmas circunstâncias tornassem eficaz a penalização da má gestão pública, atingindo o património de gestores e decisores públicos e políticos.

Se acabassem com as PPP, os swaps e o empreguismo político no Estado, que arranjou tacho para a vida a todo o militante dedicado e bem encostado.

Assim, safava-se!