Este regime constitucional está agonizante: a Assembleia da República, sede da democracia, abastardou-se, os governantes mentem todos os dias, o povo tem sede duma justiça que nunca chega. O representante máximo do sistema, Cavaco Silva, já não exerce as suas funções presidenciais.
Ao Parlamento está atribuída a função constitucional
de legislar. Mas os deputados entretêm-se apenas a fazer negócios.
Várias dezenas acumulam a função parlamentar com a de administrador,
diretor ou consultor de grupos económicos que beneficiam de favores do
estado. Os restantes pactuam com esta promiscuidade. A Assembleia também
não fiscaliza, como lhe competiria, a atividade governativa. Os
deputados da maioria apoiam acriticamente as atitudes do governo, os da
oposição são cadeias de transmissão das direções partidárias, os grupos
parlamentares estão reduzidos à condição de claques. Entretanto, a
legislação de maior relevância económica é produzida nas grandes
sociedades de advogados. Os seus associados apresentam-se nos tribunais a
litigar com base em leis que eles próprios produziram, violando o
princípio constitucional da separação de poderes.
O
governo, esse, está sem rumo. As medidas mais relevantes deste
executivo são contrárias ao que Passos Coelho havia prometido em
campanha, rompem o compromisso assumido com o eleitorado. Passos
mentiu-nos e é, afinal, um mero seguidor das políticas de José Sócrates:
reduz pensões e salários, fustiga cidadãos e empresas com impostos.
Continua a beneficiar os bancos, aos quais garante elevada remuneração
pela dívida pública e fundos para recapitalização; mantém os privilégios
dos especuladores imobiliários, nomeadamente isenções fiscais, a nível
de IMI e IMT. Garante taxas de rentabilidade obscenas nas parcerias
público-privadas
Entretanto, o sistema judicial
claudica. Sem independência e sem meios, revela-se incapaz de combater a
corrupção que sequestrou o regime.
Só uma
intervenção da Presidência da República poderia agora desencadear um
processo de regeneração. Mas o residente de Belém, que jurou a
Constituição e é o responsável pelo regular funcionamento das
instituições, assiste, imóvel, ao estertor desta democracia moribunda.
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