Texto de Pedro Marques Lopes hoje publicado no "Diário de Noticias".
Depois de ter
promovido várias nacionalizações de empresas portuguesas por Estados
estrangeiros, EDP e REN por exemplo, o Governo decidiu dar um outro
passo no caminho da colectivização dos meios de produção. A estratégia
consiste em criar um banco público que ajude, nas palavras do Governo,
as empresas.
Acaba-se com o mercado interno, mantém-se a
electricidade, gás, gasolina, a preços acima dos concorrentes europeus,
não se mexe uma palha para acabar com a burocracia e até se acabam com
as poucas boas medidas nesse sentido do anterior governo, acaba-se com o
crédito, aumentam-se os impostos, fazem-se disparar as taxas. E agora o
Governo cria a Instituição Financeira de Desenvolvimento (IFD), que vai
não só poder participar no capital das empresas como participar na sua
gestão - logo o Estado, esse fantástico gestor. Estamos regressados ao
condicionamento industrial do Estado Novo: será o Estado a escolher quem
deve ser ou não financiado, qual a actividade a ser apoiada e, com
jeito, quem devem ser os gestores.
Diz que é um Governo liberal.
Mas é mais um Governo que se comporta como um bombeiro pirómano: vai
tentar salvar as empresas que ele próprio se encarregou de incendiar.
Esqueçamos
o pormenor de passarmos a ter não um, mas dois bancos públicos.
Esqueçamos também que este era o primeiro-ministro que queria privatizar
a CGD. Façamos uma força extra e ignoremos que este era o Governo que
tiraria o Estado da Economia... O resultado é que acaba não só por fazer
exactamente o contrário, mas também por promover nacionalizações por
outros Estados de empresas portuguesas.
O facto é que a economia
portuguesa está ainda mais dependente de decisões políticas do que
alguma vez esteve. Ou será que alguém pensa que a EDP não seguirá à
risca o que for melhor para o Estado chinês? Ou será que alguém sonha
que a REN não criará problemas graves a Portugal por um qualquer
interesse de um dirigente do PC chinês? Ou será que há ingénuo que
imagina a IFD com critérios gerais e abstractos quando tiver de escolher
financiar esta ou aquela empresa, sugerir este ou aquele gestor - os
boys do CDS e do PSD devem estar a esfregar as mãos de contentes e os do
PS a afiar os dentes -, procurar um ou outro fornecedor?
O
resultado de toda a política que até agora tem sido seguida era
previsível e está a confirmar-se: uma economia destruída acaba por se
tornar dependente do único poder que permanece: o do Estado. A
sistemática destruição económica dos últimos anos deixou o tecido
empresarial tão enfraquecido que se torna praticamente inevitável a
intervenção estatal.
Daqui até à intromissão do Estado em
assuntos que não devem estar na sua esfera, ao aumento do clientelismo,
ao crescimento do poder arbitrário do Governo nas mais diversas áreas,
vai o passo dum anão.
Com a mesma lógica, não surpreendem os
números, que esta semana vieram a público, que mostram que meio milhão
de crianças e jovens perderam o direito ao abono de família em três anos
e que há muito menos pessoas a receberem o rendimento social de
inserção e o complemento solidário para idosos (dados do Instituto de
Ciências Sociais da Universidade de Lisboa). Não será preciso lembrar
que não haverá altura em que estes apoios seriam mais necessários. Por
outro lado, o Estado está a investir fortemente em cantinas sociais.
O
que se está a tirar em direitos e apoios para que as pessoas mudem de
vida e se diminuam as desigualdades está a dar-se em esmolas. É o
regresso da sopa dos pobres.
Também diz que o Governo é apoiado por um partido social-democrata.
No
fundo, o Estado sai de onde devia estar, diminui as suas funções
essenciais, reduz drasticamente os apoios sociais - que já eram dos
mais baixos da Europa - e aumenta muito a sua presença onde não devia
estar e que quando está só estraga. O Estado torna-se mais fraco onde
devia ser forte, e decisivamente forte onde devia ser apenas regulador e
facilitador. É a inversão total da lógica do funcionamento do Estado
numa democracia que quer ter uma sociedade civil forte e independente e
uma economia mais livre e com mais iniciativa.
O Governo não é
nem liberal, nem social-democrata, nem nada. É apenas incompetente e
ignorante. O pior é que essa incompetência e ignorância está a
transformar o país num lugar em que apoiar as empresas é pôr o Estado a
financiá-las e a geri-las e os apoios sociais acabarão por ser apenas
sopas para os pobres.
domingo, 24 de novembro de 2013
Bombeiros pirómanos
Etiquetas:
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Paulo Portas
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