Texto de Carvalho da Silva hoje publicado no "Jornal de Noticias"
O relatório da Organização Internacional
do Trabalho (OIT) "Enfrentar a crise do emprego em Portugal",
apresentado no passado dia 4, em Lisboa, pelo seu diretor-geral (Guy
Rider), é, por múltiplas razões, de enorme importância para o nosso
debate social, económico e político e para a construção de alternativas
às políticas injustas e de retrocesso a que estamos sujeitos.
A
OIT, observando as políticas seguidas em Portugal e em outros países,
considera "a austeridade como ameaça à prosperidade" e assume que é
preciso trabalhar-se no sentido de garantir "melhores empregos para uma
melhor economia". A OIT assume historicamente que a pobreza e as
desigualdades são os grandes perigos para o caminhar equilibrado das
sociedades e que "só se pode fundar uma paz universal e duradoura com
base na justiça social". As questões do emprego têm de ser absolutamente
centrais na nossa sociedade.
Esta semana, ficamos a saber que no
último ano, enquanto os trabalhadores e o povo sofriam, houve um aumento
de 11% do número de ricos com fortunas pessoais acima de 25 milhões de
euros. Quanto desemprego, quantos milhões de portugueses foram roubados
nos seus salários, nos seus direitos sociais, nas suas pensões, para
engordar estes 870 portugueses?
O relatório da OIT não foi
produzido como ato isolado. O Grupo de Ação Interdepartamental sobre os
Países em Crise, responsável pelo relatório sobre Portugal, também está a
produzir relatórios sobre a situação da Grécia, da Espanha e da
Irlanda. A decisão da OIT de elaborar relatórios relativos a países
sujeitos a programas de "assistência financeira" foi tomada pelo
conjunto dos 51 países da Europa e Ásia Central que participaram, em
abril passado, na Cimeira de Oslo.
A OIT, desde 2009 - quando os
governantes ainda diziam que os responsáveis pela crise teriam de ser
castigados e que a especulação e o roubo institucionalizado tinham de
acabar -, vem desenvolvendo importantes iniciativas (como foi o Pacto
Global para o Emprego, em 2009), estudos e orientações que, se tivessem
sido seguidos, poderiam ter evitado o desemprego, o empobrecimento e o
sofrimento dos portugueses e de centenas de milhões de cidadãos em todo o
mundo.
É ridícula a sobranceria com que governantes e
comentadores de serviço encaram as recomendações, as propostas e a
disponibilidade de ação apresentadas pela OIT. Com quase um século de
atividade, a OIT, por variadas razões, é talvez a organização
internacional que mais prestígio e confiança granjeia à escala global.
O
que nos diz o relatório sobre Portugal? Que a nossa situação
socioeconómica é crítica, em reflexo das condições macroeconómicas
"excecionalmente apertadas" (a austeridade), e que "é necessária uma
nova estratégia", exequível "através da mudança para uma abordagem mais
centrada no emprego".
A OIT vem dizer que não é sustentável o
atual desemprego e que devemos combatê-lo; que o desemprego de longa
duração, a destruição de atividades e a situação criada aos jovens
comprometem o nosso futuro coletivo; que é irracional o país ter mais de
1/5 da sua população com vontade de emigrar; e que a "reestruturação do
setor público" da chamada reforma do Estado contribui diretamente para o
desemprego.
A OIT denuncia a injustiça das políticas fiscais e de
juros da União Europeia, que matam as pequenas e médias empresas e
enriquecem os acionistas dos grandes bancos. Incentiva-nos a combater a
brutal precariedade do trabalho, a aumentar o salário mínimo nacional e a
proteção social, a desenvolver a contratação coletiva e o diálogo
social sério. Propõe investimento na criação de emprego, em particular
para os jovens. E disponibiliza-se a trabalhar em Portugal, com respeito
pelas nossas instituições, para ajudar à resolução dos problemas.
Se
o objetivo das políticas não for o de bater recordes de criação de
milionários, se corrermos com a troika e os resgates que ela nos
receita, se soubermos interpretar o significado de o relatório ser
apoiado pelas centrais sindicais e pelas confederações patronais, se
despedirmos este Governo e criarmos uma alternativa credível, se
soubermos utilizar esta ajuda da OIT e outras que se podem encontrar,
ainda podemos ter futuro.
sábado, 9 de novembro de 2013
OIT: um relatório oportuno
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