A revolta contra a nomeação da gentalha partidária para cargos de remuneração elevada na administração publica está a começar a tomar corpo e até mesmo em sectores algo inesperados. Hoje é a vez de Pedro Marques Lopes, conhecido propagandista do PSD, publicar um surpreendente artigo de opinião sobre o tema no Diário de Noticias
"Os caros assessores"
"O presidente da Câmara de Lisboa foi muito expedito em vir desmentir uma notícia dum jornal. Em poucas horas organizou uma conferência de imprensa para dizer que o passivo da câmara ia diminuir e não aumentar, como garantia o Público - que no dia seguinte corrigia a notícia.
António Costa não foi tão lesto a comentar uma situação que chegou ao conhecimento público na semana passada. Apesar de lhe terem perguntado por que diabo um cavalheiro de 26 anos, sem licenciatura e sem curriculum - a não ser umas capacidades extraordinárias para sacar uns cobres a um fundo público qualquer -, ganhava 3950 euros mensais como assessor técnico e político da vereadora Graça Fonseca, o presidente da câmara resolveu nada dizer.
Entende-se: uma coisa são uns milhões a mais ou a menos, outra é um assessor qualquer ganhar uns milhares de euros por mês.
De qualquer forma ficamos a saber que António Costa acha normal - tudo o indica - que a sua vereadora para a modernização administrativa, descentralização e serviços centrais tenha ao seu serviço para a assessorar nestas importantes tarefas um cidadão cujo único curriculum é ser militante e ex-funcionário do Partido Socialista.
A propósito, e se António Costa tivesse disposição para responder a problemas menores, poderia informar-nos em que profissão um cidadão de 26 anos com as habilitações deste assessor consegue ganhar o que este ganha.
Esta triste história é excepção em câmaras municipais, institutos, fundações, Estado e afins? Claro que não. É, não há quem não saiba, uma história comum. E acontece seja qual for o partido que esteja no poder. Os partidos - como nós o sabemos - utilizam o Estado e afins para satisfazer as suas clientelas, comprar cumplicidades, cimentar poderes internos.
Já estamos de tal maneira rotinados com estas iniquidades, que, por exemplo, a notícia de que um alto quadro do PS, um tal de André Figueiredo, teria oferecido um cargo muito bem remunerado numa empresa pública ou aparentada a um camarada do mesmo partido, para que ele não concorresse numa eleição interna, foi esquecida em um ou dois dias. E, para quem estiver seriamente desmemoriado, a denúncia foi feita pela pessoa a quem foi feita a "oferta", um senhor deputado. Aconteceu alguma coisa neste caso? Nada. Em qualquer país minimamente civilizado esta história não deixaria pedra sobre pedra. Não é só por estarmos demasiado habituados a coisas destas, é, provavelmente, pela noção de que se outro partido estivesse no poder a mesma coisa aconteceria e ninguém no sistema partidário tem telhados suficientemente robustos.
Dir-me-ão que estas situações são apenas gotas de água no vasto oceano de incúria e negligência que conduziu o País, e sobretudo o Estado, à condição em que hoje se encontra. Não concordo.
Talvez menos pelos valores envolvidos, mas sobretudo pelo nível de pessoas que se foram colocando no aparelho estatal e aparentado. Por um lado, gente sem qualificações mínimas que apenas lá está por servir cegamente os respectivos partidos, por outro pessoas, como a vereadora Graça Fon- seca, que acham que basta a justificação da "confiança política" para colocar um qualquer militante do seu partido naquelas funções e com um salário daquele tamanho. Basta multiplicar a incompetência e o compadrio por todo o Estado e verificar se falamos de gotas no oceano. E não É só o que estes senhores e senhoras fazem de forma directa. É, sobretudo, o clima que criam nos sítios onde "trabalham"; a sensação de injustiça, de desrespeito pelo trabalho alheio, que provoca desmotivação e revolta, e se alastra pela comunidade inteira.
António Costa, promovendo ou convivendo com estas poucas vergonhas, está também a ajudar a destruir a imagem dos políticos e dos partidos. Se homens como o provável próximo líder dum dos maiores partidos portugueses colabora ou olha para o lado quando vê situações como a descrita acontecerem, que tipo de comportamento poderemos esperar de gente com bem menos responsabilidades que ele?"
domingo, 28 de novembro de 2010
Os caros assessores
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