Texto de António Costa, Director, hoje publicado no Diário Económico.
Vítor Gaspar sai do Governo como não se
esperava, especialmente de quem assumiu todo o protagonismo, e nunca o
recusou, zangado com a sua incapacidade para levar a efeito a reforma do
Estado, zangado com o primeiro-ministro por ausência de uma liderança
de suporte ao ajustamento, zangado com os seus colegas de Governo. E
assinou, como nunca o fez o melhor discurso de António José Seguro, a
certidão de óbito deste Governo. Só falta saber a data.
Ao contrário do que parece, a saída de Vítor Gaspar neste
momento, nestas circunstâncias, por estas razões, que o próprio
explicitou numa carta - uma peça de antologia para a história política e
económica do país - é um péssimo sinal. Vítor Gaspar é o responsável
directo pela recuperação da credibilidade do país junto dos mercados e
dos credores, os actuais, ou seja, a ‘troika', e os futuros. Tem esse
crédito, ninguém lho tira. Mas não percebeu o país que tinha, falo do
país económico, da estrutura empresarial, dos trabalhadores. Nem sequer a
sua dimensão política, desvalorizou-a a todos os outros objectivos,
externos. E, portanto, o que fez de melhor acabou por ser o principal
obstáculo à sua actuação como ministro das Finanças.
É, ainda assim,
uma saída que fragiliza o Governo. Porquê? Porque Vítor Gaspar
confessou a sua incapacidade para levar o acordo com a ‘troika' até ao
fim, até Junho de 2014. Assume-o de forma séria e honesta, porque já não
tinha a credibilidade e confiança de ninguém. Nem sequer da ‘troika',
como se percebeu nos últimos dias. O problema, a questão que fica, é
porquê? Por responsabilidades próprias e, sobretudo, por falta de apoio
político, do primeiro-ministro e do resto do Governo.
Quando são muitas as dúvidas sobre a capacidade do Governo de
levar a cabo a reforma do Estado, Vítor Gaspar deixa claro que não tem
dúvidas nenhumas. Não será mesmo para fazer, ou, então, muita coisa tem
de mudar. A certidão de óbito está passada, é mais grave do que qualquer
declaração de António José Seguro ou qualquer greve geral, e tem a
assinatura do mais insuspeito dos subscritores, o próprio Gaspar.
O que fica, então, para a nova, e surpreendente, ministra das
Finanças, agora, número três do Governo, depois de Paulo Portas? Maria
Luís Albuquerque não vai mudar de política, vai tentar fazer, de facto, o
que Vítor Gaspar não conseguiu. Sem o mesmo peso político, mas com um
perfil de executiva, dura e rigorosa, apesar dos ‘swap', que, agora, se
tiverem algum desenlace, arrastarão todo o Governo.
Pedro Passos Coelho centraliza o poder em torno de três pessoas
que são da sua total confiança política: Carlos Moedas, Poiares Maduro e
Maria Luís Albuquerque. A ministra das Finanças tem pulso firme,
conhece os dossiês e é conhecida da ‘troika', com quem o Governo tem
ainda de negociar o fim deste acordo e o novo programa cautelar. O
primeiro-ministro não tinha outra solução, nem melhor. Mas se é a
solução possível, o sucesso do seu trabalho está longe de estar
garantido. Como escreve Vítor Gaspar, que se despede com "amizade,
lealdade e admiração".
O primeiro teste, de Maria Luís Albuquerque e do próprio Governo,
vai ser o Orçamento do Estado para 2014. Vai ser mais relevante para o
futuro político deste Governo, e do país, do que o resultado das
autárquicas.
PS: A demissão de Vítor Gaspar do Governo coincide com o regresso de
Teixeira dos Santos à vida política. Poderia ser mais irónico?
terça-feira, 2 de julho de 2013
Vítor Gaspar passa certidão de óbito ao Governo
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