Texto de João Cardoso Rosas, Professor Universitário, hoje publicado no "Diário Económico"
"A palavra “ideologia” alberga um campo
semântico quase inesgotável. No entanto, há duas acepções da palavra
que convém relevar. A primeira é, por assim dizer, aberta e refere-se a
uma visão do mundo e da sociedade que tem como objectivo congregar um
colectivo para a acção política. A segunda, fechada ou menos evidente, é
a de falsa consciência, isto é, a ideologia enquanto forma de encobrir
os interesses que verdadeiramente defende.
A acepção aberta da ideologia liberal está claramente presente no
discurso e na acção de Passos e do seu Governo: precarização das
relações laborais, programa de privatizações mais ambicioso de sempre,
cortes nos apoios sociais, desconfiança dos mecanismos democráticos e
constitucionais (na sua vertente mais radical o liberalismo não gosta da
democracia e ainda menos de Constituições programáticas), tudo isto
embrulhado pelo famoso argumento TINA de Margaret Tatcher ("There Is No
Alternative").
Mas Passos e o seu Governo têm também defendido medidas que estão
aparentemente nos antípodas do liberalismo: aumentos de impostos,
condescendência com as PPP, apoios aos bancos, a culminar na
nacionalização encapotada do BANIF, etc. Muitos interpretam isto como
uma incoerência com o liberalismo. No entanto, existe uma interpretação
alternativa e que requer o uso da ideia de ideologia não apenas no seu
sentido aberto, mas também como falsa consciência. Vejamos como.
Na prática, o liberalismo de Passos serve não apenas para atacar os
direitos dos trabalhadores em nome da liberdade económica, enquanto
ideologia aberta, mas também para defender os interesses do capital, em
especial do capital financeiro, enquanto falsa consciência. Por isso
Desta forma, o liberalismo de Passos faz aquilo que, enquanto ideologia,
o liberalismo sempre fez, pelo menos do ponto de vista dos socialistas.
Ou seja, a apresentação do liberalismo como ideologia aberta e amiga da
liberdade individual funciona como máscara daquilo que ele, em última
instância, significa: a defesa dos interesses do capital e o ataque aos
interesses dos trabalhadores.
Esta combinação das noções de liberalismo como ideologia aberta e de
liberalismo como falsa consciência, que mascara os interesses que
defende, chama a atenção para o facto de que o liberalismo de Passos é,
no fundo, consistente. As aparentes inconsistências que alguns detectam
advêm do facto de não compreenderem, por desconhecimento ou ingenuidade,
que as ideologias em geral - e o liberalismo em particular - têm uma
dimensão aberta, mas também uma dimensão de falsa consciência."
quarta-feira, 9 de janeiro de 2013
O liberalismo de Passos
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passos coelho
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