Texto de Pedro Marques Lopes hoje publicado no Diário de Noticias.
"1 - "É um ano
de recessão. A melhor notícia é que metade desse ano já passou", disse
Paulo Portas ao Jornal de Negócios. A declaração deve ter sido recolhida
nos breves instantes em que o ministro dos Negócios Estrangeiros não
está ocupado a fazer-se de morto, ou a anunciar investimentos em
Portugal, ou ainda quando vai falar com empresários estrangeiros
mostrando, caso estivéssemos esquecidos, a inutilidade do ministro
Santos Pereira.
Paulo Portas não é homem para dizer disparates,
mas no melhor pano cai a nódoa: é que o facto de metade do ano já ter
passado é uma péssima notícia. Foram seis meses em que se aplicaram
medidas erradas, e o tempo, infelizmente, não é recuperável. Em razão
das políticas deste meio ano, empresas viáveis faliram em catadupa, o
desemprego atingiu números impensáveis, a classe média está a
desaparecer (615 000 portugueses sobrevivem com 432 euros por mês, 10,9%
da população activa). Pois é, estes seis meses fizeram de Portugal um
país mais pobre, com uma economia alegremente a caminhar para a
destruição e mais desigual. Seis meses em que se semearam ventos...
Mas
havia um desígnio, uma meta que, atingida, ia milagrosamente guiar-nos à
terra prometida: 4,5% de défice. Para atingir este valor, Paulo Portas
não falaria mais do confisco quando se falasse de impostos. Esteve mesmo
disposto a aceitar a maior subida de impostos, taxas e preços da
história da democracia. Engoliu, sem problemas de maior, a arenga
revolucionária que faria morrer de inveja qualquer sobrevivente do PREC:
é preciso destruir tudo para construir uma nova sociedade. Uma
sociedade de pessoas que olha o desemprego como uma oportunidade, uma
comunidade livre de gente piegas e preguiçosa. No currículo ideológico
de Paulo Portas só faltava mesmo um liberalismo de contracapa. Com os
mágicos 4,5% na mente, não apresentou sinais de incómodo por ser o
consultor António Borges a conduzir o processo de privatizações, pela
forma como foi conduzido o processo das secretas ou por a coordenação
política do Governo se assemelhar à duma associação de estudantes. Não
tremeu com a iniquidade da proposta sobre o enriquecimento ilícito nem
com o populismo desbragado e perigoso do Ministério do Sindicato dos
Magistrados do Ministério Público, ou melhor, do Ministério da Justiça.
Passados
apenas seis meses, o líder do CDS já percebeu que não vamos cumprir os
objectivos do défice, que todos os esforços dos portugueses foram,
afinal, em vão. Como o antigo Paulo Portas sabia, demasiada carga fiscal
arrebenta com a economia. Como o antigo Paulo Portas desconfiava, criar
desemprego e cortar salários não é muito saudável nem para a receita
nem para a despesa. Como o antigo Paulo Portas diria, uma coisa é
austeridade, outra, completamente diferente, é afogar uma economia.
Claro
que ninguém vai esquecer a inestimável colaboração do ministro dos
Negócios Estrangeiros - nem ele conta com isso - neste gigantesco
fracasso. Sobretudo porque do homem com mais experiência política, em
funções executivas, do ministro mais bem preparado, esperava-se mais,
muito mais.
2 - Os seis meses que já passaram podem, afinal, não
ter sido tão maus como isso. Ou melhor, os seis meses que faltam podem
ser ainda piores. Basta que, tal como os comunistas que ainda acham que o
comunismo não resultou por não se ter ido suficientemente longe, se
insista na receita e se adoptem mais medidas de austeridade. Como João
Salgueiro disse na SIC Notícias, "claro que não estamos no máximo de
austeridade. Podemos passar fome, mas ninguém quer isso." Pois, talvez
ninguém queira isso, mas que é para onde vamos se não se puser um travão
a esta loucura toda.
A receita falhou. Não foi por falta de
avisos, e de gente insuspeita de sofrer de esquerdismo. No fim deste
ano, as contas públicas estarão mais desequilibradas, as reformas
apregoadas continuarão no papel e serão apenas quimeras, o País vai
estar ainda mais pobre, as pessoas mais desesperadas, mais empresas irão
fechar e o desemprego continuará a crescer.
Os próximos anos
estão perdidos, haja coragem para inverter o caminho para que não se
perca ainda mais tempo. Chega de revolução."
domingo, 1 de julho de 2012
Portas e a revolução
Etiquetas:
governo,
passos coelho
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