Texto de Pedro Marques Lopes hoje publicado no "Diário de Noticias"
"1 A decisão do
Tribunal Constitucional leva o défice público previsto para um valor a
rondar os 6,3%, um desvio de cerca de 0,8%. Como o director do Dinheiro
Vivo, André Macedo, referiu neste jornal, o ministro das Finanças
costuma falhar por bem mais - basta verificar os desvios do ano passado.
Em circunstâncias normais, o Governo negociaria com a troika -
explicando que num Estado de direito não se pode atropelar a
Constituição, caso os senhores não soubessem -, olharia melhor para as
rendas de algumas empresas, tentaria negociar as parcerias
público-privadas e não dramatizaria a situação afirmando simplesmente
que as instituições democráticas tinham funcionado e que havia de actuar
conforme.
A questão é que esta decisão do Tribunal foi a
machadada final no núcleo fundamental do Governo e na sua linha
política. Esse núcleo constituído por Relvas, Gaspar e Passos Coelho.
A
alma do Governo, o braço direito do primeiro-ministro, o homem que tudo
decidia, o tapa-buracos a quem se recorria para tudo e mais alguma
coisa, o para lá de incompetente coordenador político, Miguel Relvas,
foi escorraçado por triste e má figura.
O ideólogo do Governo, o
homem que define a política económica e orçamental, aquele que tratou de
preencher com ideais revolucionários o vazio ideológico do
primeiro-ministro está completamente desacreditado. Não acerta uma
previsão, exibe uma evidente falta de preparação para o lugar e teima em
querer governar contra a Constituição. A nossa Constituição é mais
importante do que as suas folhas de cálculo e a suas letras estão longe
de estarem mortas.
O que resta não é bem um Governo, é um conjunto
de homens e mulheres descoordenados, vagamente geridos por um
primeiro-ministro perdido, sem saber o que fazer e com uma linha
política chumbada pela realidade do desemprego, das falências, da
miséria, da recessão e, de novo, pela Constituição.
2 A reacção
desproporcionada e profundamente atentatória ao Estado de direito do
Governo à decisão do Tribunal Constitucional pouco ou nada teve que ver
com a decisão propriamente dita. Sim, a decisão pôs em causa a
estratégia do Governo, mas um Executivo tem sempre o limite da
Constituição. "É a lei do Orçamento do Estado que tem que se conformar à
Constituição e não a Constituição que se tem que conformar a qualquer
lei", que parte desta declaração do presidente do Tribunal
Constitucional Passos Coelho não percebeu? É que se não percebe isto não
pode ser primeiro-ministro numa democracia. Se não tem competência para
arranjar soluções alternativas não serve para governar um país.
A
razão da infelicíssima reacção é tão-só a admissão de incapacidade para
governar. A dramatização é resultado da implosão do núcleo central do
Governo e da sua política suicida. O Tribunal Constitucional está a ser
apenas utilizado como bode expiatório.
É bom que ninguém se esqueça: se o Governo sair sai pela sua incompetência, por rigorosamente mais razão nenhuma.
3
Já ninguém se lembra, mas na quarta-feira houve a apresentação da moção
de censura do PS. Ficou claro que este PS não tem sequer uma ideia de
alternativa e que Seguro ainda não está minimamente preparado para ser
primeiro-ministro. Melhor, ficou claríssimo que estamos metidos num beco
sem saída.
4 Eu também sou daqueles que não gostam de muitas
partes do texto constitucional, que o acham demasiado programático,
demasiado extenso e mesmo incapaz de assegurar direitos que tenta
prescrever. O que ninguém pode dizer é que a Constituição impede
reformas mais ou menos profundas ou que é responsável pelos nossos
problemas estruturais. Não, as nossas crises podem ter muitas origens e
podem ter muitos culpados, mas dentro deles não estarão com toda a
certeza os preceitos constitucionais.
Tenho poucas dúvidas de que
no seguimento da deliberação de sexta-feira do Tribunal Constitucional
os do costume atacarão uma vez mais a Constituição. Queria apenas
recordar a esses cavalheiros e senhoras que os princípios invocados para
declarar a inconstitucionalidade das normas foram os da igualdade e
proporcionalidade. Não esteve em causa a gratuitidade do ensino ou da
saúde ou os tão criticados direitos adquiridos ou coisa do género. Nada
disso. Repito: igualdade e proporcionalidade. Alguém está interessado
numa Constituição que não defenda estes princípios? E devem os juízes
olhar para a "realidade" e esquecê-los?"
domingo, 7 de abril de 2013
Apenas incompetência
Etiquetas:
governo,
passos coelho
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