Texto de Manuel José Manuel Pureza hoje publicado no Diário de Noticias
Não é preciso um governo mundial para haver governação global. Porque a
governação global não é feita de regulações centralizadas por
instituições de escala mundial mas sim da definição de modelos de
regulação e da adoção de um quadro ideológico de referência que
dispensam amarrações institucionais.
Robert Cox, um dos vultos
maiores da reflexão académica contemporânea sobre relações
internacionais, sintetiza no conceito de "nebulosa" essa autoria difusa
da governação global. Define-a assim: "Uma elite indeterminada de
influentes e de agências que partilham um bloco de ideias e que
desempenham em conjunto a função de governação. A política e a doutrina
são desenvolvidas e difundidas através de conclaves não oficiais (por
exemplo, a Comissão Trilateral, as conferências de Bilderberg, as
cimeiras económicas anuais de Davos, etc.) e de organismos
intergovernamentais e de peritos: os comités da OCDE, o Banco de
Pagamentos Internacionais de Basileia ou as cimeiras do Banco Mundial e
do FMI." E acrescenta: "Não há um processo de decisão formal, há sim um
conjunto complexo de redes interligadas que criam uma ideologia
económica comum e que injetam este produto consensual nos processos
nacionais de decisão. A nebulosa é simultaneamente externa e interna aos
Estados."
É pois nesse espaço informal e nebuloso que se define o
que é good governance e o que não o é. E essa informalidade é o rosto
não democrático do poder mundial. As ideias, os modelos, os discursos,
as escolhas, as cumplicidades, são inoculados nos "líderes" nesses
espaços imunes ao contágio da exigência democrática.
O Clube de
Bilderberg - como a Comissão Trilateral ou o Forum de Davos - não tem
que ser visto como sinónimo de conspiração obscura para poder ser
avaliado politicamente. Embarcar em exercícios estilo Código Da Vinci na
leitura da influência destes atores dá preferência à novela sobre a
política. Desde 1954, o Clube de Bilderberg reúne elites políticas,
empresariais e militares. Com discrição, sem holofotes, sem povo e com
muito poder - o poder do contágio, o poder da modelização do olhar e do
discurso, o poder da limitação da escolha política. Bilderberg é o
centrão em escala mundial. E é para facilitar a perpetuação do centrão
que manda - na finança, nos media, na produção de senso comum, na
elaboração de políticas - que o clube serve.
António José Seguro
participa com Paulo Portas na conferência de Bilderberg de 2013. Sendo
um convite de Francisco Pinto Balsemão, é uma escolha do
secretário-geral socialista. E é uma escolha francamente preocupante
para quem quer dar densidade programática concreta a uma alternativa de
esquerda ao atual Governo das direitas em Portugal. Acreditar que
António José Seguro seja convidado para sensibilizar os CEO e os
estrategas de Bilderberg para os graves problemas do emprego e do
crescimento na Europa é o mesmo que acreditar que um simpatizante da
não-violência converterá uma claque de futebol organizada à tolerância e
ao fair play. Não, sabidamente Seguro participa no exercício anual de
densificação de uma rede de poder. Só isso. E isso tem um enorme
significado.
sexta-feira, 7 de junho de 2013
A escolha de Bilderberg
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Sem comentários:
Enviar um comentário