Texto de José Reis Santos, Historiador, hoje publicado no "Diário Económico"
A recente indecisão em torno do
pagamento dos subsídios de férias aos funcionários públicos veio nos
recordar, ruidosamente, de que estamos perante um dos mais cobardes,
impunes e cínicos governos da história da democracia portuguesa.
Cobarde, sim, pois o Governo da República, escudado no manto da
sua legitimidade parlamentar (pois questiono a sua legitimidade
popular), sem que alguma vez tenha anunciado tais medidas aquando do seu
diálogo genético com os portugueses (leia-se campanha eleitoral), e
depois do Tribunal Constitucional ter chumbado tais pretensões, regressa
na insistência de interferir de forma obtusa e abusiva - e sem que
permissão lhe tenha sido dada - na vida de milhares de portugueses, que
apenas procuram ter a oportunidade de poderem organizar as suas vidas - e
as suas merecidas férias - de forma ordeira e pacifica. E fá-lo, ou
procura fazê-lo, impunemente, pois sabe que pode aproveitar-se da
paciência institucional da Presidência da República para sustentar a
ambição de procurar circum-navegar as decisões do Tribunal
Constitucional.
Ironicamente, este comportamento revela também como um cinismo atroz
se apoderou com facilidade de todas as putativas definições ideológicas e
coerências discursivas que em tempos o Executivo de Passos Coelho
procurou fixar, pois para um governo que se gaba(va) das suas raízes
liberais, o grau de interferência directa na vida dos cidadãos atinge
níveis de ingerência de fazer inveja a muitos regimes totalitários. E o
pior é que esta intromissão se revela aleatória e imprevisível,
sequestrando lenta e progressivamente o País, que hoje se encontra refém
das vontades fortuitas de um governo socialmente alienado e obcecado
apenas com alter-realidades estatísticas e os seus miseráveis impactos
numéricos.
Infelizmente, este sequestro às liberdades de um povo tem-se alargado
de forma substantiva a diversos sectores da sociedade política,
contaminando movimentos sociais e sindicatos, partidos e políticos.
Estes, também de forma demagógica e abusiva, têm procurado estratégica e
sistematicamente capturar a liberdade e a energia do descontentamento
social - de pura origem popular -, para, depois de operadas as
transformações discursivas necessárias, visarem a total apropriação de
uma narrativa social que não procura institucionalização.
É neste múltiplo sequestro que se encontra hoje Portugal. Um
sequestro asfixiante que nos coíbe de respirar liberdade, pois se é
verdade que este Governo já não fala em nome dos portugueses, também os
sindicatos já não falam em nome da maioria dos trabalhadores que se
dizem representar, nem os movimentos sociais falam em nome das centenas
de milhar que ocupam as ruas e avenidas em cada momento de protesto.
Resta saber que nova variante do síndroma de Estocolmo tomará conta
do eleitorado nacional, com qual dos seus captores desenvolverá ele uma
relação de proximidade (eleitoral). Até porque, sabendo o País
institucionalmente cativo da vontade de um Presidente estático e da
ambição desmedida de um sequestrador profissional (leia-se Paulo
Portas), só o voto nos permite aceder a um momento de respiração
totalmente liberto de todos os nossos sequestradores.
terça-feira, 18 de junho de 2013
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