Texto de João Marcelino hoje publicado no Diário de Noticias
"1. As chamadas
parcerias público-privadas (PPP), criadas no tempo dos Governos Cavaco
Silva, eram uma razoável construção teórica. Os privados construíam
logo. Os governos garantiam e pagavam a prestações. A lógica, a
reboque de uma certa ideia de progresso, sobretudo no alcatrão,
decalcava a fúria consumista que então se começava a abater sobre a
sociedade portuguesa para gáudio dos bancos.
Se as PPP se tornaram
o escândalo que hoje se conhece, isso não foi principalmente culpa dos
privados. As empresas propõem os negócios que entendem. O problema
esteve em que, do outro lado, o dos partidos - perdão, o do Governo -,
sempre esses privados puderam contar com gente pouco capaz de defender
os interesses do País. Fosse por benigna incompetência ou lá pelo que
fosse.
2. A feliz mando da troika, e porque o Tribunal
Constitucional também decidiu o que decidiu em relação ao ataque aos salários da função pública e às pensões, começou agora a renegociar-se
estas PPP. Em apenas duas, e sem sair do sector rodoviário, o Estado
poupou 400 milhões numa e 80 noutra!
Não sabemos se houve muito
esforço negocial ou se foi coisa simples em função do eventual carácter
leonino de ambos os contratos. O certo é que se fez, e rápido, como o
País exige e as finanças precisam.
3. Este exemplo mostra como é
frágil o poder em Portugal. Dá-nos uma ideia de como os partidos, que
deveriam chegar ao poder para servir o Estado e os cidadãos, sempre que
têm oportunidade se aliam aos interesses privados, e só mostram
verdadeira vontade reformista perante a absoluta necessidade. Não foi
por acaso que, descontada a atual crise da Zona Euro, que amplia a
dimensão da nossa precariedade económica, Portugal já vai na terceira
ajuda externa desde Abril de 1974.
Mandados, os partidos - perdão, os governos - fazem.
Deixados à rédea solta é o que se sabe.
E
é sobre esta realidade brutal que uma ínfima parte dos portugueses,
militantes dos partidos, insistem em discutir o acessório: quem é que
tem a culpa maior, o PS ou o PSD? Alguns, genuinamente, parecem até
acreditar que a polémica, derramada em entrevistas, artigos,
intervenções e posts, faz sentido para a grande maioria dos portugueses.
4.
Bem se sabe que em todas as sociedades é mais ou menos assim. O Homem,
mais as suas fraquezas, vale o que vale - e vale o mesmo em toda a
parte.
A grande diferença da sociedade portuguesa, em comparação
com as demais europeias, é a fraqueza da sua estrutura de cidadania. Os
portugueses, de uma maneira geral, vivem pouco a dimensão coletiva e
perdem-se nos seus afazeres. Protestam pouco, vigiam quase nada. Há
pouco movimento associativo, faltam candidaturas políticas
independentes, seja no poder local seja para a Presidência da República.
Este caminho que desagua nas PPP, no BPN, no Freeport, e por aí
adiante, só tem a ver com a forma como os partidos, essenciais ao
funcionamento de democracia tal qual a entendemos, têm feito parte do
problema"
sábado, 11 de agosto de 2012
O Estado e os partidos
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