DERRUBAR O GOVERNO É OBRIGAÇÃO PATRIÓTICA

O inutil Cavaco Silva deu carta branca ao atrasado mental Passos Coelho para continuar a destruir Portugal e reduzir os portugueses a escravos da ganância dos donos do dinheiro.
Um governo cuja missão é roubar recursos e dinheiro às pessoas, às empresas, ao país em geral, para os entregar de mão beijada aos bancos e aos especuladores é um governo que não defende o interesse nacional e, por isso, tem de ser corrido o mais depressa possivel.
Se de Cavaco nada podemos esperar, resta a luta directa para o conseguirmos.
Na rua, nas empresas, nas redes sociais, há que fomentar a revolta, a rebelião, a desobediência, mostrar bem que o povo está contra Passos Coelho, Portas e os outros imbecis que o acompanham e tudo fazer para ajudar à sua queda.
REVOLTEM-SE!

sábado, 28 de abril de 2012

Falta de decoro

Texto de José Eduardo Moniz hoje publicado no "Correio da Manhã"

"É indecoroso o que se passa com a eleição dos novos membros para o Tribunal Constitucional. O processo de escolha em curso só confirma que o peso partidário na instituição se torna cada vez mais indisfarçável. A questão já não é apenas conseguir que os partidos se entendam quanto a uma lista única. O problema assenta no facto de este episódio deitar por terra quaisquer veleidades que ainda existissem sobre a autonomia e independência daquele Tribunal.

Curiosamente, ainda ontem, na AR, o primeiro-ministro quis acentuar as reformas na Justiça como essenciais para as mudanças estruturais a operar na sociedade e na economia. Disse mesmo que "a Justiça tem de ser célere e estar ao serviço dos portugueses, além de dar exemplo de parcimónia". Quase humor negro na altura em que se assiste a um verdadeiro comércio de nomes em torno de interesses partidários num processo que abala a credibilidade do Constitucional e mina ainda mais o sistema judicial.

Ter a Justiça refém da política constitui uma ameaça à qualidade da democracia. No fundo, estamos perante a insistência na hipocrisia que levou à criação de um sem número de entidades e agências de supervisão supostamente independentes, mas que mais não são do que autênticos braços armados dos partidos dominantes em áreas importantes de actividade, com base num modelo que replica a proporcionalidade parlamentar. Portugal não será uma sociedade plenamente livre enquanto as coisas assim funcionarem.

Nesta semana em que se celebrou o Dia da Liberdade, quase passou despercebida uma afirmação relevante do governador do Banco de Portugal. Disse Carlos Costa que os bancos centrais estão a dar tempo aos políticos para se organizarem.

A declaração, aparentemente bondosa, traduz uma atitude paternalista e tutelar preocupante.

O sistema político não pode, ele próprio, independentemente dos erros e inépcias de governos, partidos e seus agentes, ficar refém de ninguém, muito menos da Banca e dos banqueiros, que estão longe de ser modelos de virtude e cujo contributo para a crise foi claro. No caso português, relembre-se a passividade do ex-governador Vítor Constâncio em relação aos delírios e derrapagens do consulado de Sócrates e a cumplicidade do nosso sistema financeiro com a situação que deu alimento às PPP, a projectos megalómanos como o aeroporto de Lisboa e o TGV, e a tantas outras iniciativas do género em que o interesse nacional e o privado se confundiram profusamente.

A democracia não vive em liberdade condicional. A necessidade desesperada de pôr em ordem as contas públicas não justifica tudo, nem avaliza enviesamentos que legitimem a subordinação da política ao poder económico.

Nestes tempos de incerteza, a solidez das instituições é crucial. Por isso, o que se passa com o Tribunal Constitucional não dá tranquilidade a ninguém. "

quinta-feira, 26 de abril de 2012

Os Donos de Portugal - 1

A não perder por todos os que sentem que trabalham para e são escravos dos bancos.

O documentário "Donos de Portugal", estreado no dia 25 de Abril na RTP2 e que fala sobre a protecção concedida pelo Estado nos últimos 100 anos a uma determinada "elite" económica. Mello, Champalimaud, Espirito Santo e companhia continuam a gozar de benesses e privilégios que nenhum governo se atreve a cortar.

Donos de Portugal


O silêncio ensurdecedor

Texto de Paulo Ferreira hoje publicado no "Jornal de Noticias"

"O caráter absolutamente anódino do discurso proferido ontem pelo presidente da República nas comemorações do 25 de Abril fez-me lembrar aqueles casais que, nos restaurantes ou em outros lugares públicos, passam horas a fio sem falar um com o outro.

Ensimesmados, saem de casa para evitar a "obrigação" de comunicar. Parafraseando o pensador George Steiner, o silêncio ensurdecedor de Cavaco sobre o estado da arte do país foi, pareceu-me, o único modo por ele encontrado para evitar exprimir, através das palavras, o que por aí vai e o que por aí vem.

Sucede que, ao contrário dos casais que se refugiam na ausência da palavra para evitar o confronto dos factos, há momentos em que não devemos ficar calados. E o momento que o país atravessa, as dificuldades crescentes que as famílias portuguesas sentem na pele, não é compaginável com um discurso raro, estranho, abúlico e extraterrestre como o que o chefe de Estado ontem usou.

Entrar pela contabilidade - e cumplicidade - partidária é uma forma de justificar a escolha. Cavaco detestava Sócrates e desfez a sua governação no discurso do ano passado; Cavaco tolera Passos Coelho e quis dar-lhe mais uns tempos de bonança. Da mesma forma, também podemos considerar que a escolha de palavras e recados suscetíveis de acicatar a evidente e crescente tensão social e política acarreta perigos que o presidente da República não está disposto a correr. Tudo isto é verdade, mas não elimina o essencial - esquecer as consequências dos sacrifícios e da austeridade impostos pela crise, olvidar quem mais sofre com ela, não fazer, sequer de rompante, uma análise do estado do país é incompreensível.

Este não é o momento para silenciar o óbvio, porque é sobre o óbvio que os portugueses querem falar e ouvir falar.

Cavaco optou, ao invés, por enaltecer os "exemplos expressivos" da obra nacional: o cartão pré-pago para os telemóveis, o inovador sistema da Via Verde, tudo coisas que não conhecíamos... O crescente número de doutorados portugueses, a língua falada por 250 milhões de almas espalhadas pelo Mundo e, cereja em cima do bolo, a obrigação que nos cabe de, lá fora, não falarmos apenas da nossa bonomia enquanto povo e do sol radioso que a Natureza nos oferece - eis a soma das maravilhas com que o presidente da República presenteou os seus ouvintes.

Juro que, por momentos, pareceu--me ver José Sócrates a falar, em vez de Cavaco. (Terá o chefe de Estado tentado prestar uma sub-reptícia homenagem ao socialista, depois de o ter posto fora do Governo?) Era este o país que o ex-primeiro-ministro vendia, cá dentro e lá fora, com a mestria que lhe é reconhecida.

Tristemente, não é este o país que temos. Não há silêncio que apague essa evidência."

terça-feira, 24 de abril de 2012

Contas furadas

Texto de Paulo Morais, Professor universitário, hoje publicado no "Correio da Manhã".

"O ministro Vítor Gaspar veio pa-ra o governo com dois objectivos: empobrecer os portugueses e equilibrar as contas públicas. E se o primeiro está praticamente conseguido, o segundo redundou num estrondoso fracasso. Os portugueses estão mais pobres, não há dúvida.

O aumento das taxas de imposto e a redução generalizada de pensões e salários degradaram o nível de vida. Com empresas a fechar diariamente, o desemprego atingiu um valor recorde. Enquanto isso, as medidas de Gaspar são comunicadas de forma ambígua, como a do prazo de supressão dos dois subsídios aos funcionários; ou são anunciadas de supetão, como foi com a proibição das reformas antecipadas. A ambiguidade e a surpresa provocam um ambiente de incerteza que paralisa os investimentos e gera o pânico nos cidadãos.

Entretanto, todas as medidas fiscais tomadas pelo governo relevaram-se contraproducentes. O aumento das taxas de imposto levou à redução da colecta. Ao contrário do que previa Gaspar, a receita fiscal está em queda livre. O IVA caiu 3,2% no primeiro trimestre, por comparação com 2011; o imposto sobre veículos teve uma redução de 47,5%! Ao mesmo tempo, os cofres da segurança social estão a esvaziar-se ao ritmo de três milhões de euros por dia, com o subsídio de desemprego a subir 23%. As contas saíram furadas. As finanças públicas estão a derrapar e sem controlo.

Além do mais, Gaspar falhou as promessas de cortar nas enormes gorduras do Estado, de terminar com os negócios em que o Estado favorece os grupos económicos do regime e de combater a corrupção. Gaspar não renegociou as escandalosas parcerias público-privadas, para não incomodar as concessionárias. Não reestruturou a dívida pública, o que pouparia milhares de milhões, optando por continuar a favorecer os bancos. As finanças nem sequer ousaram reduzir os valores de alugueres e rendas de favor que o Estado paga pelas suas instalações, muito acima do valor de mercado.

Até agora, os únicos beneficiários destas políticas desastrosas são os grupos económicos do regime, que continuam, intocáveis, a lambuzar-se na gamela do Orçamento do Estado. Está pois na hora de mudar de políticas nas finanças e trocar de protagonista."

domingo, 22 de abril de 2012

Direitos alienados

Texto de Armando Esteves Pereira, Director-Adjunto, hoje publicado no "Correio da Manhã"

"A entrevista da Antena 1 à ministra da Justiça acrescentou mais um episódio ao folhetim dos cortes dos subsídios de férias e Natal dos reformados e funcionários públicos.

O que disse Paula Teixeira da Cruz é óbvio: o corte pode ir para lá de 2015. Provavelmente, será para sempre. Como já escrevi, o poder de compra que os subsídios tinham em 2010 jamais regressará. E nem a disputa constitucional altera o figurino. Como diz a ministra, há "uma alteração de circunstâncias que faz com que, infelizmente, não haja dinheiro para continuar a pagar". A bancarrota tornou-nos a todos mais pobres. Para os funcionários públicos e reformados, o corte do poder de compra é brutal.

Mas se os direitos adquiridos se tornam letra morta para funcionários públicos e reformados, vítimas de sucessivas revisões de leis que acabam com a diferença entre os empregados do quadro e precários, quando se fala dos milionários contratos com o Estado já há a protecção dos direitos adquiridos.

Os direitos parecem iguais, mas uns são mais iguais que outros, como no livro ‘Triunfo dos Porcos’. Os titulares das PPP ou das rendas de energia são mais iguais."

sábado, 21 de abril de 2012

Haja vergonha!

Texto de José Eduardo Moniz hoje publicado no "Correio da Manhã"

"Mais de 13 500 milhões de euros foram adjudicados por entidades públicas, sem concurso, nos últimos 4 anos. É um valor impressionante, que ultrapassa em muito o montante canalizado sem o expediente da chamada adjudicação directa.

Tais números evidenciam a indiferença, a irresponsabilidade e o descarado desrespeito que se apoderaram de grande parte da máquina do Estado perante o dinheiro que é de todos. É uma vergonha e um atropelo às mais elementares regras de zelo e rigor a que deve obedecer a utilização das receitas arrecadadas com a imensidão de impostos e taxas que sobre os cidadãos incidem.

Foram muitas as empresas que atribuíram empreitadas e obras sem concurso público, entre elas, Refer, Estradas de Portugal e EDP-Distribuição, mas à cabeça de todas está a Parque Escolar: mais de 1200 adjudicações, num total de 1800 milhões de euros. Entidades mais beneficiadas: as do sector da construção civil. Um filme muitas vezes repetido. 

Ninguém pode pactuar com uma situação destas, para a qual o Tribunal de Contas repetidamente tem lançado alertas. Só alguém que toma os outros por parvos, ou é inconsciente ou inimputável, se atreve, como fez a antiga ministra da Educação, Maria de Lurdes Rodrigues, a considerar que as derrapagens da Parque Escolar trouxeram "festa" ao País. Ou, então, outras motivações e outros fins falam mais alto do que a razão.

É imoral e revoltante um quadro assim, ainda por cima com os portugueses a sentirem o amargo impacto do remédio da austeridade que lhes é enfiado pela goela abaixo.

A indignação avoluma-se com o crescimento da percepção de que há demasiada passividade perante os sinais de corrupção, que se traduz na incapacidade da Justiça para actuar pronta e eficientemente em situações gritantes ou, pelo menos, estranhas. As últimas declarações do Procurador-Geral, por sinal, o pior da história da nossa democracia, só acentuam a descrença no sistema judicial. Pinto Monteiro disse que o caso da compra dos submarinos não avançou mais por falta de dinheiro, que as perícias são caras e que está à espera que o Governo disponibilize a verba necessária para continuar a investigação. A ministra desmentiu-o na hora, sublinhando que não recebeu qualquer pedido de verba para perícias no processo dos submarinos ou em qualquer outro. O director-nacional da PJ também saiu a terreiro para acentuar que a sua Polícia deu à investigação tudo o que foi pedido.

Na hora em que o País lida com o maior aperto de cinto que se conhece, é fundamental sobrepor a transparência e a verdade à mentira. Há que cortar a direito. Para se provar que não existe ninguém acima da lei, impõe-se gente séria e impermeável à frente dos dispositivos de investigação criminal. Este Governo, junto com Cavaco, cometeu o erro de manter Pinto Monteiro no lugar. Que não reincida, escolhendo tarde e a más horas o seu sucessor."

sexta-feira, 20 de abril de 2012

Impunidade

Texto de Manuela Moura Guedes hoje publicado no "Correio da Manhã".

"Enquanto a Justiça for ajustada a cada cliente, tipo fato por medida, Portugal nunca será um país decente. É com total despudor que se passa por cima de princípios, regras e evidências, que os agentes do próprio Sistema mentem, fazem de conta ou dão explicações estúpidas para justificar atrasos, interpretações, arquivamentos e absolvições.

A sentença do caso Portucale é de estarrecer. Nada, mas mesmo nada o tribunal deu como provado, a não ser a versão pura dos "flagelados e inocentes arguidos". Três ministros, dias antes das eleições, consideraram de "imprescindível utilidade pública" o projecto turístico do Grupo Espírito Santo, autorizando o abate de mais de 2500 sobreiros, depois de dez anos de chumbos, e Abel Pinheiro foi apanhado ao telefone com um administrador do GES a dizer "fazendo as contas, nós metemos na mão [com decisões amigas] da sua gente mais de 400 milhões de euros nas últimas 3 semanas". Entre as suspeitas de financiamento ao CDS, ficou o processo dos submarinos, agora em águas paradas, depois de ciclicamente vir à tona conforme as conveniências políticas. Agora, é obviamente fase de pousio justificada com desculpas do PGR desmentidas pelo Ministério da Justiça. São nódoas que se estendem, enormes, para o Freeport, com catadupas de testemunhas a incriminarem Sócrates, que não foi acusado nem arguido, nem sequer ouvido e que continua a ser "Engenheiro" porque a Dra. Cândida Almeida se recusa a reabrir um processo que ela arquivou porque quis, tal como o Presidente do Supremo quis apagar as escutas do ‘Face Oculta’. O multifacetado professor António J. Morais, acusado de corrupção no caso Cova da Beira, está para ir a julgamento há ano e meio, mas continua a fazer a sua vidinha, tal como Dias Loureiro faz a sua e muitos outros ligados ao buraco de cinco mil e tal milhões do BPN. A lista é interminável porque se vai ajustando à medida das necessidades, tal como se ajusta a composição dos juízes do Tribunal Constitucional de acordo com as políticas de austeridade do Governo. O problema atravessa de alto a abaixo todo o Sistema, não é novo, e à força da repetição faz jurisprudência – a impunidade é lei. Mas um país que a aceita e nada faz para mudar, merece mesmo ser tratado abaixo de cão."

Com teto, entre ruínas

Texto de José Manuel Pureza, deputado, hoje publicado no "Diário de Noticias"

"Depois dos salários, do subsídio de desemprego e das despesas em saúde e em educação, chegou agora a vez de as pensões de reforma serem apresentadas como gorduras do Estado. E tal como sucedeu nesses casos anteriores, as pensões são agora o alvo da retórica moralista que acusa a despesa pública de penalizar as gerações futuras para assim justificar a abertura de novos campos de apetitoso negócio para os privados.

A direita suspira há muitos anos pela entrega ao sector financeiro privado da parte de leão da segurança social. Agora volta a ensaiá-la e, como sempre fez anteriormente, invoca para isso a iminência de rutura financeira. Não deixa de ser curioso que o faça poucos meses depois de, no Orçamento do Estado, ter projetado saldos positivos para o subsistema das pensões até 2030. Entre o superavit de então e o risco de colapso de agora está tão-só a pressão crescente sobre a segurança social, inevitável em clima de desemprego galopante e de depressão económica irresponsável.

Sucede que a fixação de tetos às contribuições para o sistema de repartição, sob o pretexto de assim poupar ao Estado o pagamento de pensões acima de um determinado montante no futuro, transferindo o diferencial de desconto para fundos privados, não só não resolve o problema do financiamento da segurança social como se arrisca a agravar exponencialmente a situação. Plafonamento significa redução da receita do Estado e desvio desse montante para o sistema financeiro. Com menos dinheiro, o Estado está vinculado a pagar as mesmas pensões a quem já estava dentro do sistema. O que significa que durante um período transitório de décadas o afundamento do défice das contas públicas será o alimento deste capricho ideológico da direita. Por isso mesmo, invocar o argumento da justiça intergeracional para justificar esta escolha é do domínio do humor negro: serão as gerações futuras que mais oneradas ficarão com o pagamento de um défice crescente daqui resultante. Num tempo como este, em que a direita faz da redução do défice o alfa e ómega da governação, valerá a pena recordar que, em proposta neste sentido apresentada em 2006, o PSD propunha que o Estado emitisse dívida pública no valor de 9000 milhões de euros para assegurar a solvabilidade de um sistema com uma receita dramaticamente reduzida...

Mas, para lá deste impacto transitório, há um traço de fundo que marca esta obsessão da direita pelo fim da exclusividade pública da segurança social. E esse é o da criação de um sistema dualista com uma componente pública para pobres, uma segurança social de mínimos, e uma segurança social privada, totalmente divorciada dos princípios elementares da universalidade e da solidariedade intergeracional e tão volátil e seletivo como volátil e seletivo é o mercado. Mas mais: o que assim se anima é a lógica absurda de uma segurança social insegura. Os fundos de pensões são hoje o rosto de massas monetárias imensas em permanente circulação especulativa em escala global. Onde os cidadãos esperam ver um reduto de previsibilidade haverá, pois, um jogo de alto risco. Claro, se correr mal lá se invocará a responsabilidade do Estado para prevenir riscos sistémicos. Conhecemos a história.

Confiar a quem gerou a crise em que estamos mergulhados a gestão da nossa segurança material futura é uma inconsciência sem nome. Ou melhor, é mais uma renda garantida para o sector financeiro. O fim dos direitos adquiridos tem dias. Para os jogadores institucionais de roleta, o negócio privado das nossas reformas é mais um bónus. O preço é a nossa insegurança."

quinta-feira, 19 de abril de 2012

Zona de caça proibida

Texto de André Macedo hoje publicado no Diário de Notícias".

"Com o Estado Social em vias de extinção acelerada por razões económicas - mas também ideológicas -, o ministro Pedro Mota Soares achou que deveria liderar a manada. Na verdade, quando há uma semana foram repentinamente travadas as reformas antecipadas ficou logo no ar esse prenúncio de que as regras do jogo iriam mudar. O sentido da transformação seria, digamos, evidente. Como a confiança que cimenta (na verdade não cimenta nada) a relação entre o contribuinte e o Estado passou a estar ainda mais em causa - a crise justifica todos os absurdos -, a porta que conduzirá um dia à privatização parcial da parte mais suculenta da segurança social ficou escancarada: as benditas reformas são a renda que se segue.
Apesar desta expectativa política, ninguém imaginava, no entanto, que a ideia de privatizar parte da previdência fosse atirada assim de supetão para a mesa, com tantos outros assuntos para resolver. Eu não sei nada sobre a vida sexual dos canibais, mas julgava (esperava) que a vida política dos ministros fosse um pouco menos arriscada e perigosa para os parceiros - nós, os eleitores e simples contribuintes. Contudo, não é assim: o chão ainda não parou de tremer e ceder.
No caso das reformas, até haveria mudanças que faria sentido acontecerem. Que as reformas antecipadas têm um limite perigosamente baixo para a sustentabilidade do sistema (55 anos) é um facto inegável, basta comparar com o regime espanhol (61 anos), o alemão (63) e até com o grego, que por uma vez dá o exemplo: reformas antecipadas só a partir dos 60 anos. Mas não é tudo. Que a idade da reforma nos prazos normais (65 anos) continuará a subir (67, 68?), acompanhando a esperança média de vida, também é um facto demográfico com repercussões económicas inevitáveis, não uma temerária escolha ideológica.
No entanto, privatizar a parte mais rica do sistema, que garante o equilíbrio por mais tempo da estrutura, é entrar na zona de caça proibida. Por um lado, hoje as pensões já estão ancoradas num esforço contributivo medido ao longo da vida e não apenas nos últimos anos. Ou seja, não há quem receba muito sem ter pago muito (em princípio, um político do CDS deveria compreender esta relação de causa-efeito e até defendê-la).
Por outro lado, o rombo nas contas públicas durante o período de transição do sistema público para o semiprivado seria colossal. Seria uma espécie de TGV do CDS: a segurança social iria despenhar--se em alta velocidade, pondo em causa a solidariedade geracional. Mota Soares revelou, portanto, a inteligência do Rei de Espanha: quis apanhar caça grossa, deu um tiro no pé e ficou mal na fotografia. Com ministros assim, o País ainda vira comunista. Seria uma pena."

quarta-feira, 18 de abril de 2012

A manipulação de um Estado de Direito

Texto de Pedro Santos Guerreiro hoje publicado no "Jornal de Negócios"

"Os fortes ganharão sempre aos fracos, os ricos terão sempre mais poder que os pobres, os porcos de Orwell que escrevem nas ombreiras das portas mandarão sempre nos animais que pasmam e não sabem ler. Sim, as coisas são o que são. Mas escusam de ser pior. A nomeação dos novos juízes para o Tribunal Constitucional é um assunto muito sério. E grave. E nosso.

A nomeação de juízes para o Constitucional é partidária, sempre foi e nunca devia ter sido. Os nomes agora propostos pelo PSD, pelo PP e pelo PS (Paulo Saragoça da Matta, Fátima Mata Mouros e José Conde Rodrigues) podiam, portanto, parecer apenas partidarizados como sempre, o que nos levaria a debater ou não a forma de constituição do tribunal. Mas o que está em causa hoje é outra coisa. É a suspeita de uma escolha à medida das políticas de austeridade do Governo.

Não está em causa a competência técnica de qualquer dos nomes. Nem a sua seriedade. Mas está o seu fraco currículo para um tribunal que noutros países democráticos é o Olimpo dos juristas - em respeitabilidade, independência e poder. Como é o caso dos Estados Unidos. Como é o caso da Alemanha, onde Angela Merkel respeita a possibilidade de chumbo do seu tribunal a resgates a países.

É de resgate que estamos a falar. Eis a vaca fria: o Constitucional estaria prestes a chumbar a mãe de todas as medidas da austeridade, o corte dos subsídios da Função Pública. E estas escolhas podem ter sido feitas à medida, para inverter essa calamidade política. Não porque os escolhidos sejam manipuláveis. Mas por saber-se o que pensam. E terem sido escolhidos em função disso. E isso sim será manipulação.

A suspeita é grave e recai em quem escolheu, não em quem foi escolhido. Desde o ano passado que se duvida da constitucionalidade da medida. Cavaco Silva duvidou, sempre preferiu um imposto extraordinário, sobre todos, do que esta suspensão dos subsídios. O Constitucional, que aprovou o corte de 5% em nome dos tempos extraordinários, logo avisou que também essa aprovação era excepcional. Mas depois do corte de 5% veio o dos subsídios. E havia o risco real da medida ser chumbada. E depois era uma calamidade política.

Uma calamidade é melhor que o caos. Se o corte de subsídios fosse considerado inconstitucional, o Governo teria uma enorme derrota e precisaria de reiniciar um processo de austeridade alternativa, que provavelmente passaria pela reedição do imposto extraordinário de IRS. Mais uma "metade" do subsídio de Natal. Como Cavaco sempre preferiu. O desgaste político seria enorme. A consolidação voltaria a ser feita pelo aumento de receita, não pelo corte de despesa. Mas seria a lei. "Dura lex sed lex", não é assim?

Como aqui escreveu Elisabete Miranda em Janeiro (em Janeiro!), "ter medo da Constituição é menorizar as instituições e infantilizar os cidadãos". A crise está a esboroar a credibilidade das instituições. Uma frase mal dita arruinou a imagem de um Presidente, uma caçada maldita expôs o ridículo de um monarca. E como escreveu Pedro Lomba no "Público", "estão a 'abandalhar' o Tribunal Constitucional".

A lei é o que nos separa do caos, o que nos protege da iniquidade, é o melhor esforço humano para perseguir a justiça. Sem o Estado de Direito não há Estado, há "Far West". A lei é o que defende do forte o fraco, nivela o poder do rico e do pobre, e mesmo que falhe na decisão entre o mal e o bem, é o que separa o certo do errado. E está escrito. Na lei. Na Constituição. Mesmo que seja inconveniente. Ou inoportuno.

As indicações para o Constitucional permitem a especulação de que os partidos do acordo da troika querem influenciar a aprovação da medida que, de outra forma, seria chumbada. Pobre Constituição. Pobre tribunal. Será verdade que, como escrevia ontem o "Público", um outro juiz, Jorge Reis Novais, terá declinado o convite por falta de qualidade dos seus pares? Não sabemos. Talvez outros juízes devessem ter o absurdo de consciência de Groucho Marx, que não quis entrar num clube que aceitasse pessoas como ele. Mas ninguém se incomoda. Nem no Parlamento. Nem na Presidência. Nem mesmo os demais juízes - ou apresentariam a sua demissão."

terça-feira, 17 de abril de 2012

Inseguranças gratuitas

Texto de Helena Garrido hoje publicado no "Jornal de Negócios"

"Insegurança. Assim se pode sintetizar o tempo em que vivemos. Como se estivéssemos em estado de guerra. Insegurança no rendimento que levamos para casa fruto do trabalho, insegurança no desemprego, na doença e na velhice. Todos os contratos são quebrados. Todos? Não, há alguns que continuam bem protegidos.

A mais recente promessa de quebra de contrato entre o estado e os cidadãos foi lançada no fim-de-semana com a possibilidade de avançar com o plafonamento na Segurança Social, sob a capa das reformas ditas "milionárias". Vamos ver se nos entendemos: não há reformas milionárias, há pensões elevadas determinadas por descontos também elevados durante a vida de trabalho. Claro que se pode sempre identificar casos que podemos considerar escandalosos, como aconteceu no passado no Banco de Portugal ou como se verifica na classe política - onde a falta de coragem para aumentar o salários dos políticos conduziu a soluções menos justas. Mas não são a regra, são a excepção.

É preciso colocar o debate da Segurança Social no seu nível correcto para sabermos o que devemos escolher. A escolha não está entre reformas milionárias e não milionárias mas sim entre o sistema público ou misto - privado e público. E a passagem de um modelo para outro envolve riscos, entre os quais a ameaça de morte do sistema público de pensões, exactamente aquele de que dependem as pensões dos mais desfavorecidos.

O ministro da Solidariedade e da Segurança Social desmente o aumento da idade da reforma mas resolve dar um passo em frente dizendo que vai lançar o debate sobre o plafonamento - a limitação das contribuições para a Segurança Social que se traduz em reformas altas mais baixas.

Num Governo que tem privilegiado os objectivos financeiros, uma decisão de plafonamento da segurança social, na actual conjuntura, é escolher custos certos de curto prazo para benefícios incertos no longo prazo. Nem se percebe a razão para tal mudança que não seja puramente ideológica.

A Segurança Social não tem qualquer problema de sustentabilidade. Dizer agora que a Segurança Social tem problemas de sustentabilidade porque regista o pior ano contabilístico desde 1994 é como ter dito, no passado, que nada precisava de mudar. O que é estranho não é vivermos o pior ano desde 1994, o que é espantoso é a Segurança Social não ter o pior ano de sempre. Portugal nunca viveu em democracia uma recessão tão grave com uma taxa de desemprego tão elevada e reduções salariais nominais tão significativas.

As contas da Segurança Social revelam, pelo contrário, uma enorme resistência a choques. O que demostra que as medidas adoptadas no Governo de José Sócrates foram correctas - nomeadamente a introdução do factor de sustentabilidade.

Neste momento a Segurança Social só precisa de pequenas correcções. Por exemplo, aproveitar a suspensão das reformas antecipadas para aumentar a idade mínima. Os 55 anos permitidos em Portugal são demasiado baixos quer face aos padrões europeus quer face à esperança média de vida.

O sistema de Segurança Social não precisa de nenhuma revolução nem de nenhuma mudança de modelo. Muito menos na actual conjuntura, em que o comum dos cidadãos enfrenta já retrocessos em direitos que considerava protegidos por contratos com o Estado. Este não é o tempo de experimentalismos na Segurança Social. Faça-se o que é obrigatório fazer. Tudo o que for desnecessário e crie insegurança, que se esqueça. É uma regra de bom senso especialmente recomendada quando tardam as medidas que mostram que todos estão a pagar a crise."

domingo, 15 de abril de 2012

O pacto suicida

Pedro Marques Lopes é conhecido por ser um dos mais fieis arautos do PSD pelo que o seu artigo de opinião hoje publicado no "Diário de Noticias" é, no mínimo, interessante.

"O primeiro-ministro disse, na última quinta-feira, que o chamado pacto orçamental não era de esquerda nem de direita. Dando por boa a afirmação, pelo menos nenhum dos quadrantes políticos fica envergonhado com a enormidade que a esmagadora maioria dos deputados aprovou.

O pacto diz muito sobre o caminho que a Europa vem percorrendo.

Para não variar, os cidadãos não são chamados a dar a sua opinião sobre mais um verdadeiro momento fundador. Dir-se-á que estamos apenas perante o aprofundamento de decisões que retiraram soberania aos Estados e que não se justificaria desta vez consultar directamente os cidadãos, o mal ou o bem já estaria feito. Pode ser, porém importa recordar que em matérias de soberania, provavelmente as únicas, não há representação que possa substituir o voto directo. A verdadeira crise europeia é, nunca é demais repetir, política. Mas vai muito para lá da questão do papel do BCE, planos de crescimento económico, maior integração de políticas fiscais, menor ou maior federalismo, mais ou menos défice, maior ou menor dívida pública. É sobretudo na dimensão do fundamental papel dos cidadãos de decidir o que de facto querem, de os envolver nos processos de decisão, do seu cabal esclarecimento sobre os caminhos a trilhar. A inexistência de discussão pública deste tratado leva a que a população não faça a mais pequena ideia do que de facto está em causa e das consequências que advirão para as suas vidas e para a comunidade. Aí está mais um péssimo exemplo do caminho que está a ser traçado.

Esta aberração em forma de tratado institui a visão merkeliana do que deve ser a Europa. Dividida entre os mui sérios e disciplinados países e os pequenotes que não se sabem comportar e que devem ser postos na linha pelos primeiros. Esqueçamos a Europa em que os cidadãos seriam tratados de forma idêntica mas respeitando a especificidade dos países, o seu estado de desenvolvimento, as suas idiossincrasias ou as suas debilidades. Não senhor, o que a Alemanha e o seu ajudante francês pensam para nós e os outros países mal comportados e preguiçosos é o que está certo.

Nem de direita nem de esquerda, dizia o primeiro-ministro. Melhor, o pacto institui a ausência de alternativa. A partir de agora, quando votarmos, apenas escolheremos pessoas, representantes não dos eleitores nacionais mas de outras gentes, já que as políticas serão exactamente as mesmas. O principal instrumento político, leia-se o Orçamento, perde quase toda a sua importância. Tudo isto em razão do sacrossanto equilíbrio orçamental, como se esse equilíbrio por artes mágicas criasse emprego, desenvolvimento económico e investimento. E não vale a pena vir com a conversa oca de que quando se fala disto se faz apelos a desequilíbrios, a despesismos, descontrolos orçamentais ou ao mais demagógico dos disparates que é o dos encargos para as gerações futuras, como se o investimento em escolas, estradas, tecnologia, hospitais fossem encargos.

Especificamente para Portugal, as consequências da ratificação deste tratado são simples. Das duas uma, ou Portugal cumpre os objectivos constantes no pacto orçamental que pura e simplesmente obsta a implementação de políticas de crescimento e impõe metas absolutamente irrealistas para o decréscimo do défice e da dívida pública (só para referir os exemplos mais gritantes), obrigando na realidade a cortes que destruiriam de facto por inteiro o Estado social e que fariam disparar ainda mais o desemprego e as falências, ou seja, o nosso país chegaria ao fim do processo na mais profunda miséria, ou não os cumpre, os tais objectivos, e sujeitar-se-á a penalizações gravíssimas que, no limite, o afastará do euro com as consequências conhecidas e o arrastará também para a miséria. Venha o diabo e escolha.

Sim, este pacto não é de esquerda nem de direita, é apenas suicida para Portugal e para a Europa."

sexta-feira, 13 de abril de 2012

Governar à socapa

Texto de Pedro Bacelar de Vasconcelos hoje publicado no "Jornal de Noticias"

"O Decreto-Lei n.oº 85--A/2012, de 5 de abril - que suspende as reformas antecipadas - foi aprovado pelo Governo e promulgado pelo Presidente da República, secretamente. Este procedimento suscita dúvidas quanto à sua conformidade com a Constituição da República que tanto o Governo como o Presidente estão estritamente obrigados "a defender, cumprir e fazer cumprir", como prescreve a fórmula solene do juramento do Presidente no ato de tomada de posse perante a Assembleia da República. Será que o Presidente entende que os deveres de informação do Governo foram criados para seu exclusivo benefício? Mas vamos, por agora, afastar a questão da validade constitucional deste procedimento inédito e extraordinário para considerarmos apenas o aspeto político das boas práticas de uma governação democrática, aberta, transparente e merecedora da confiança dos cidadãos.

A antecipação da reforma não é um favor ou privilégio. Uma vez verificadas as condições previstas na lei, é um direito daqueles cidadãos que, devido a graves problemas de saúde, às condições particularmente penosas ou desgastantes das funções que desempenham ou porque não conseguiram arranjar novo emprego ao fim de um período considerável, se acham qualificados para recorrer ao regime de antecipação da idade de acesso a uma pensão de velhice que, por isso mesmo, sofre uma redução do seu valor. Da multiplicidade de motivos que até agora podiam justificar a antecipação da reforma apenas ficou ressalvado o desemprego de longa duração. A proposta de Decreto-Lei foi aprovada em segredo pelo Conselho de Ministros, a 29 de março, e com essa ocultação intencional foi solidário o próprio Presidente da República que, em segredo, a recebeu e prontamente promulgou no dia 5 de abril. Muito se estranha que o mesmo Presidente da República que ainda recentemente se indignava com a "falta de lealdade institucional" de um primeiro-ministro, por não ter sido informado do teor do "Pacto de Estabilidade e Crescimento" antes da sua apresentação no Parlamento, há precisamente um ano, se tenha agora entendido com o Governo para esconder dos portugueses a preparação de uma medida tão gravosa, sem consulta, sem debate nem sombra de concertação social.

Sabemos bem que é muito grande o desgaste político provocado pelo debate público de medidas impopulares e é compreensível que o Governo se queira poupar a essa dura provação. Naturalmente, a dimensão do desgaste será tanto menor quanto mais persuasivo for o Governo na explicação dos seus motivos. Contudo, não é admissível, numa democracia, governar no pressuposto de que os cidadãos, em geral, são criminosos e oportunistas que só esperam a primeira ocasião para violar as leis e obter benefícios indevidos. O que é chocante é que o Governo, ao mesmo tempo que reclama a solidariedade dos portugueses para enfrentar a grave crise financeira, se entregue a manobras conspiratórias para iludir expectativas legítimas e surpreender os cidadãos com factos consumados que destroem a relação de confiança cívica que deve prevalecer, numa República, entre governantes e governados.

O que justifica este comportamento inédito? Como se demonstra a sua necessidade? Onde está a ponderação dos cálculos dos hipotéticos prejuízos que se pretendeu acautelar à custa do sacrifício dos valores inestimáveis da segurança e da proteção das expectativas legítimas dos contribuintes? Será que o Governo tem medo de uma oposição minoritária, insuficiente para impedir, na Assembleia da República, a adoção destas medidas? Ou, pelo contrário, será que a intenção do Governo é, exatamente, assustar os portugueses, promover a incerteza, o conformismo e a resignação, para impor as suas políticas como o castigo fatal e irremissível de um nefando pecado coletivo, acima das vicissitudes do pluralismo, da transparência e das regras da política democrática? Não sabemos, porque nada disto é explicado no preâmbulo do Decreto-Lei nem no comunicado apócrifo assinado pelo ministro da Solidariedade... "

A racionalização

Texto de José Manuel Pureza, deputado, hoje publicado no "Diário de Noticias"

"No reino da austeridade nunca há cortes cegos. Os seus ideólogos têm sempre uma retórica de justificação preparada que serve acima de tudo para dar uma aparência técnica a decisões que não são senão escolhas políticas. Nessa retórica, a palavra racionalização ocupa lugar de destaque. Despedir não é despedir, é racionalizar os recursos humanos. Encerrar escolas não é encerrar escolas, é racionalizar a rede escolar. Tudo sempre feito em nome de um superior conhecimento técnico, domínio reservado de um escol de eleitos a quem a graça do new public management foi dada e a quem Portugal tem de estar grato por nos pôr finalmente nos carris da razão.

A decisão de encerrar a Maternidade Alfredo da Costa, em Lisboa, é um caso paradigmático deste uso da retórica da racionalidade para disfarçar escolhas políticas. O desempenho daquela unidade do Serviço Nacional de Saúde é conhecido de todos: é a que maior número de partos realiza (5200 em 2009, 5300 em 2010, 5500 em 2011); é a que alberga maior diferenciação técnica e profissional em áreas como a da gravidez de alto risco ou a dos cuidados neonatais (cerca de 60% do seu movimento relaciona-se com situações deste tipo). E ao que é quantificável acresce o muito que não se pode quantificar: uma cultura de interdisciplinaridade que permite potenciar o bom tratamento e o sucesso no acompanhamento das suas utentes. O afeto que milhares de famílias têm pela MAC é a melhor expressão do seu reconhecimento pela qualidade técnica e humana invulgar do serviço ali prestado.

Nada disto conta para os tecnocratas de serviço. Fizeram do encerramento da MAC um remake pífio da novela das explicações para bombardear o Iraque: primeiro tinha partos a mais, depois tinha partos a menos, depois não é boa prática manter uma unidade monofuncional devendo ser integrada num hospital geral. O primeiro-ministro chegou mesmo a afirmar que a MAC é "uma unidade histórica em Portugal que não pode ficar parada no tempo, tem de evoluir" - ficamos a saber que, para Passos Coelho, uma unidade histórica evolui através do seu encerramento... Todas estas teses e contrateses foram entretanto sempre embrulhadas no mesmo discurso: o da necessidade de racionalizar a prestação de serviços de obstetrícia na região de Lisboa, porque há unidades a mais e o inverno demográfico só acentuará esse excesso. Mas o inverno demográfico não era conhecido quando se decidiu dotar os novos hospitais de Loures e de Vila Franca de Xira de serviços de obstetrícia? E por que razão, mesmo aceitando que há unidades a mais, se encerra aquela, de entre elas, que soube conquistar o estatuto de referência de todas? E não é certo que a recomposição da excelência das equipas, necessariamente dispersas e divididas, onerará altamente o erário público? E não é igualmente certo que esta "racionalização" resultará, como todas as outras, na "dispensa" de muitos "colaboradores"?

No encerramento da MAC, como em tantos outros casos de cortes, há uma palavra mal escondida: negócio. Para que as parcerias público-privadas nos novos hospitais da periferia de Lisboa deem lucro, é necessário que lhes seja dado fazer um número mínimo de partos que as atuais condições não permitem. A Maternidade Alfredo da Costa é a unidade a abater para o efeito. De nada lhe vale ser a mais bem apetrechada, técnica e profissionalmente, e por isso a mais segura de todas para as parturientes. Na racionalidade superior dos iluminados que decidem, os rankings só valem quando lhes convém e a meritocracia tem dias certos para se usar. Porque o que eles realmente fazem é política. Só política. "

Violação do contrato

Texto de Manuela Moura Guedes hoje publicado no "Correio da Manhã".

"As pessoas, o seu bem-estar e qualidade de vida deixaram de estar no centro das preocupações.

Há um mínimo de certezas que precisamos de ter para viver. Bem bastam os imponderáveis, os desígnios de Deus, o Destino, o que quer que seja que desfaz o que estava acertado entre a nossa vontade e a porçãozinha que nos cabe no Mundo. Não se pode viver sempre em sobressalto com regras que hoje podem já não ser as de amanhã e, no dia seguinte, com outras que poderão vir e virar de pernas para o ar a vida de quem confiou de boa-fé no Estado.

Entre ele e cada um de nós, há um contrato de direitos e obrigações mútuos. Funciona como uma empresa em que os cidadãos são os accionistas e o Governo o gestor, a quem se dá poderes e um mandato para administrar o que é de todos – o País. Mas o gestor não pode mudar unilateralmente os termos do contrato, violar sistematicamente direitos adquiridos e fundamentais. Eles são o suporte do dia-a-dia, a base para se poder planear, fazer contas e não entrar, como agora, no desespero de ver que o dinheiro com que se contava para pagar despesas essenciais já não vem. Há 30 pessoas por dia declaradas falidas pelos tribunais, 2753 entre Janeiro e Março.

Vale tudo, cortes nos salários, nos subsídios, aumentos de impostos e, como se não bastasse, a proibição de antecipar a reforma. E a coisa é feita com absoluto desnorte. Tanto dizem que não vai haver mais austeridade, como logo a seguir a descarregam desbragada para cima das vítimas do costume. A nova taxa para essa treta desse Fundo para a Segurança Alimentar vai sentir-se na ida ao supermercado, se houver dinheiro para as compras, se os sucessivos aumentos da gasolina não o impedirem... É com esta espiral quase absurda, quase obsessiva, que se acorda actualmente.

A angústia de não saber o que reserva o futuro mais próximo porque vivemos na corda bamba e tiram-nos o tapete por baixo, sem aviso... As pessoas, o seu bem-estar e qualidade de vida deixaram de estar no centro das preocupações actuais. Vivemos, trabalhamos e fingimos para "os mercados", essa coisa que depende de meia dúzia de bancos (JP Morgan, UBS, Citigroup, Barclays, Deutsche Bank, RBS e ICAP), que está acima dos países, capaz de os engolir. É o novo Deus, temido e adorado, a quem se sacrificam populações inteiras. Até quando?"

terça-feira, 10 de abril de 2012

Entre a peste e a cólera

Texto de Manuel António Pina hoje publicado no "Jornal de Noticias"

"O Governo PSD/CDS esconde do comunicado do Conselho de Ministros que decidiu acabar com as reformas antecipadas, leva a coisa caladamente a Cavaco Silva, Cavaco Silva assina-a de cruz e os portugueses só sabem do que se passou (e que lhe passaram a perna) quando o decreto sai no "Diário da República".

O primeiro-ministro admite a um jornal estrangeiro o que não admite no Parlamento, que, afinal, talvez o país não volte aos mercados em 2013 como antes tinha garantido o ministro das Finanças.

O chefe-adjunto da troika anuncia em Bruxelas que, ao contrário do que o seu Governo português sempre jurara, o mais certo é que o confisco dos subsídios de férias e Natal seja, afinal, definitivo. E que faz o Governo? O ministro das Finanças garante que o confisco acaba em 2013, depois garante que é em 2014, o primeiro-ministro garante que é em 2015 e "de forma gradual" e o omniministro Relvas garante que o Governo não enganou os portugueses.

E o que faz o PS? Abstém-se "violentamente" ou, com mais ou menos retórica, vota "violentamente" a favor de tudo isso como fez com o Código dos Despedimentos e como já disse que fará (mas exigindo "violentamente" um "tratado complementar" para o crescimento) com o tratado com que a sra. Merkel pretende limitar a soberania orçamental dos incapazes nativos dos PIIGS.

E nós, portugueses? Nós, portugueses, não somos chamados ao assunto porque esses assuntos não nos dizem respeito."

segunda-feira, 9 de abril de 2012

Isto não é falar verdade

Texto de Bruno Proença hoje publicado no "Diário Económico"

"Quando se ganham eleições com uma campanha baseada na ideologia e na ética, o futuro é bastante mais estreito. Há menos espaço para errar.

Para andar com os códigos de boas práticas debaixo do braço e a prometer um comportamento irrepreensível, é bom que não se tenham telhados de vidro, o que é basicamente impossível na política. Andam todos nisto há demasiado tempo para nunca terem errado. O Governo de Pedro Passos Coelho está a pagar a factura das suas promessas ideológicas e éticas: garantiu um programa para reformar o Estado e falar verdade. O que se viu na última semana foi exactamente o oposto.

Começando pelo regresso dos subsídios de Natal e férias na função pública, parece óbvio que só vai acontecer quando as contas públicas forem sustentáveis e com um crescimento económico acima dos 2%. Com a informação que temos hoje, não parece razoável que isso aconteça em 2014 ou mesmo em 2015. No final, vamos perceber que provavelmente a Comissão Europeia tinha razão: estamos a caminho da extinção de dois salários no Estado. O ministro das Finanças e o Governo não se enganaram nas datas. O "lapso" de Vítor Gaspar foi outro - optimismo em demasia. O Executivo devia acreditar em melhorias mais rápidas e agora parecem mais longínquas. Todas as previsões económicas para Portugal estão a ser revistas em baixa, confirmando uma economia anémica e o desemprego em alta por muitos anos.

Mas a traição do Governo aos seus princípios iniciais está para além dos equívocos de avaliação dos impactos da austeridade na conjuntura económica. É mais profundo. Pedro Passos Coelho ainda não conseguiu explicar que reforma do Estado quer fazer - se é que ainda quer fazer alguma. Privatizar, fechar uns serviços, congelar salários, promoções e cortar salários não são soluções estruturais. Não podem durar para sempre. O debate deve ser outro. Que Estado queremos? Com que funções? O Estado Social é para manter como está?

Sem responder a estas questões, anda-se sempre atrás do prejuízo e em pleno estado de emergência. É isto que está acontecer na Segurança Social. No congelamento das reformas antecipadas cometeram-se os dois erros anteriores. Primeiro, desvalorizou-se o impacto da recessão nas contas - que estão muito pior do que se julgava - e não parece haver uma ideia para o futuro do Estado Social. Se a intenção é promover o envelhecimento activo à bruta, então acabe-se com as reformas antecipadas de uma vez por todas. Porquê suspender apenas? Não há um plano coerente. Está a seguir-se a receita da ‘troika', nomeadamente na lei laboral, e a limpar alguns exageros, mas não se está a debater o futuro da Segurança Social - se é que tem algum no modelo que hoje existe.

Como se isto já não fosse suficiente, cometeu-se o pecado original. Um Governo que prometeu falar verdade aos portugueses não pode mexer com as reformas às escondidas para evitar uma corrida aos serviços. A estratégia manhosa pode garantir a poupança de alguns milhões mas mancha a imagem do Governo. E há nódoas que ficam para sempre. O Executivo ainda não celebrou o primeiro aniversário e já queimou muito capital político.

Começam a existir demasiados sinais de que o Governo está a perder a mão. A execução orçamental deste ano está a ser difícil, a economia está pior e o primeiro-ministro fala da eventualidade de Portugal não regressar aos mercados em 2013. Os portugueses começam a perguntar: tanta austeridade para chegar a algum lado melhor?

"

Um governo de lapsos

Texto de Helena Garrido hoje publicado no "Jornal de Negócios"

"A actualização do Memorando de Entendimento divulgado na quinta-feira passada aponta para uma quebra de poder de compra da ordem dos 25% nos funcionários públicos, quando se soma o corte de 5% feito pelo anterior Executivo com a teórica suspensão dos subsídios de férias e de Natal.

O lapso que o ministro de Estado e das Finanças assumiu como seu – vá-se lá saber porquê –, não é um lapso, é uma política para a necessária redução de salários. E é uma táctica para contornar a inconstitucionalidade da eliminação de dois salários dos funcionários públicos e pensionistas.

A suspensão dos subsídios de férias e de Natal na Administração Pública não é nenhuma medida do Memorando de Entendimento. Foi um tema das negociações, pelo que se percebeu das notícias na altura publicadas, mas mereceu sempre desmentidos quer do então primeiro-ministro como do então candidato a primeiro-ministro. Estávamos a 1 de Abril de 2011, há praticamente um ano e Pedro Passos Coelho disse: "Eu já ouvi o primeiro-ministro dizer, infelizmente, que o PSD quer acabar com muitas coisas e também com o 13º mês, mas nós nunca falámos disso, e isso é um disparate. Está bem? Isso é um disparate".

Todos conseguimos compreender, incluindo os funcionários públicos, que se possam omitir algumas realidades em campanha eleitoral, ou que a situação financeira do País acabou por se revelar mais difícil do que o diagnosticado pela troika ou ainda que era preciso trocar a descida da Taxa Social Única por qualquer coisa que forçasse a queda dos salários. Governar Portugal no actual quadro de dificuldades financeiras internas, grande exigência da Alemanha e de degradação da conjuntura internacional é uma tarefa muito difícil que os portugueses em geral conseguem compreender.

Também se consegue compreender a decisão de suspender as reformas antecipadas no maior dos segredos. Tal como uma desvalorização, não se anunciam as suspensões de reformas antecipadas para evitar o risco de ver desaparecer as poupanças que se queriam obter com uma corrida às reformas.

Se muito do que foi feito se compreende, há outro tanto do que está, e não está, a ser feito que não se consegue compreender.

Do que não está a ser feito temos referido com frequência neste espaço. Nas Parcerias Público-Privadas (PPP), na energia e nas telecomunicações os atrasos na acção são tão visíveis que já mereceram alertas da troika. Neste domínio não se compreende a razão por que o Governo não decidiu, pura e simplesmente, lançar uma taxa extraordinária de solidariedade, temporária, sobre todas as concessões realizadas pelo Estado. O caminho escolhido da renegociação promete, ou chegar tarde, ou dar muito pouco ou nada.

Do que se está recentemente a fazer é incompreensível o envolvimento da CGD na Oferta Pública de Aquisição (OPA) lançada pelo grupo José de Mello e pelo fundo de investimento Arcus à Brisa. Claro que o presidente da Câmara do Porto Rui Rio tem razão, quando considera esse envolvimento um "escândalo" e "inadmissível". Se há razões para esse financiamento, então que seja explicado. Ou teremos de supor que a CGD está a salvar uns grupos, enquanto deixa cair outros, sem explicitar critérios.

São demasiados "lapsos" que lamentavelmente confirmam o pior dos receios. O receio da falta de força para romper de vez com as forças que impedem o desenvolvimento de Portugal. Que levará mais cedo ou mais tarde à indesejada incompreensão. "

Promiscuidades

Texto de Rui Moreira hoje publicado no "Jornal de Noticias"

"O questionável apoio da CGD ao Grupo Mello, no âmbito da OPA lançada sobre a Brisa, permite discutir mais uma vez, entre outras questões, a promiscuidade entre os grandes grupos económicos e os poderes políticos. Lembro, a propósito, que quando a nova Administração do banco público foi nomeada, e não colocando em causa as qualificações ou a probidade pessoal dos escolhidos, me pareceu estranho, tendo disso dado nota pública, que alguns dos membros dessa Administração tivessem fortes ligações a esse grupo.

Naturalmente que os interesses políticos e os interesses dos grandes grupos económicos interagem entre si. Não se pretenderá que se governe contra os grupos económicos, e é perfeitamente razoável que estes façam lobby a favor dos seus interesses. Já não é, todavia, lícito que se governe para esses grupos económicos, ou que exista uma excessiva permeabilidade entre eles e o poder político que lhes permita captar uma fatia desproporcionada dos recursos escassos do país.

Infelizmente, e nos últimos 20 anos, o fraco crescimento da economia deveu-se ao endividamento externo e ao desenvolvimento dos sectores de bens e serviços não transacionáveis. Sectores esses que não estão sujeitos à concorrência externa, e que cresceram num mercado pequeno e muito imperfeito, sem concorrência ou regulação adequada. Tiveram, assim, campo livre para extorquirem tudo aquilo que precisavam da economia, aumentando os seus custos de contexto e prejudicando, dessa forma, a competitividade externa dos outros sectores da economia.

Para perpetuarem a sua influência, para terem sempre uma palavra a dizer na governação e não sofrerem as consequências da rotatividade dos governos, criaram as suas brigadas de elite dentro dos partidos políticos. Dessa forma, fizeram negócios chorudos com o Estado, de que são melhor ou pior, exemplo as parcerias público-privadas, em que o Estado assumia todo o risco, mas pagava uma taxa de rentabilidade ao privado como se fosse este a assumir esse risco. Conseguiram, ainda, concorrer a privatizações com financiamentos desproporcionados, dando como única e fraca garantia as ações da empresa-alvo. Contaram, por fim, com inúmeros benefícios de ordem fiscal, e com incentivos ao investimento. Esta fórmula de negócio protegido tornou-se tão interessante que houve políticos que resolveram, então, replicá-lo, para seu benefício direto. Tinham chegado à política sem cheta, tinham ajudado alguns a acumular milhões, achavam que também tinham lugar à mesa. Foi essa, como se sabe, a história do BPN. Assim se acumularam fortunas, e apareceram novos capitalistas, enquanto o país definhava e se endividava.

Agora, os tempos são diferentes. Faltam recursos, e há muita gente aflita. Está, por isso, na altura de acabar com esse vício. Para isso, deveria o Estado invocar a alteração anormal e imprevisível das circunstâncias para renegociar os negócios existentes com esses grupos económicos. Se se questiona, por razões de necessidade e emergência, os direitos adquiridos do cidadão comum, não se percebe por que razão os direitos adquiridos destes grupos económicos nesses negócios, permanecem inatacáveis.

Para vencer essa batalha, é preciso haver coragem e descomprometimento. Infelizmente, são poucas as tropas disponíveis para tão árdua tarefa. Ora, quando os partidos políticos convergem entre si na estratégia puritana, inspirada pelos média e fomentada pela inveja, de remunerar mal os políticos e de acentuar novas incompatibilidades, estão a perpetuar este estado de coisas e a manter o poder subserviente perante os senhores do costume. Enquanto assim for, os recursos do país continuarão a ser mal repartidos. A economia não será planeada, como o foi no passado, quando havia condicionamento industrial, mas estará sujeita a este tipo de distorções uma vez que o sucesso das empresas dependerá não da qualidade do seu produto, ou da sua eficiência, mas da sua eficácia em se aproximar do poder. O país, esse, continuará cada vez mais desigual e cada vez mais pobre."

sábado, 7 de abril de 2012

Anda tudo doido

Texto de José Eduardo Moniz hoje publicado no "Correio da Manhã"

"Foi à queima-roupa. O Governo suspendeu as reformas antecipadas agindo como um vulgar salteador de estrada, que monta a emboscada escondido atrás das moitas. Não há espírito messiânico que legitime Passos Coelho e Paulo Portas a porem e a disporem dos direitos das pessoas como se fossem coisas descartáveis a qualquer momento.

Percebe-se que a crise exija soluções rápidas e acção determinada. Mas nada justifica que não se passe cartão ao Parlamento e não se discuta, no mínimo, assunto de tamanha delicadeza com os parceiros sociais.

Era sabido que as políticas de austeridade iriam submeter o orçamento da Segurança Social a pressões fortíssimas. Não é em vão que se reduz drasticamente o crescimento, que milhares de empresas têm a falência como destino e que centenas de milhares de portugueses são lançados no desemprego. Percebe-se a dor de cabeça que aflige Vítor Gaspar diariamente ao ver os números da receita fiscal ficarem abaixo do que imaginara.

O que não se admite é a falta de respeito pelos cidadãos em geral e pelos que descontaram uma vida inteira para a reforma, em particular. De uma vez por todas, o Estado tem de reconhecer que não pode dar ao dinheiro que não é seu o uso que lhe apetece.

Na mesma semana, o Governo tratou com insensata frieza matérias extremamente delicadas para a vida das pessoas e das famílias. Na quinta-feira, ao final da tarde, resolveu deixar cair do céu, à entrada do longo fim-de-semana pascal, a bomba da suspensão das reformas antecipadas. Já na véspera, o primeiro-ministro havia decidido aproveitar uma entrevista à Rádio Renascença para anunciar que os subsídios de Natal e de férias para o sector público só regressarão em 2015.

O chefe do Governo abordou a sensível questão dos subsídios como se de uma banalidade se tratasse. Não se deu ao trabalho de antecipar as intenções do Executivo aos deputados nem se incomodou a ponderar a hipótese de falar directamente aos portugueses. Fê-lo sem pés nem cabeça, sem sequer desenhar previamente um esboço de coordenação com o ministro das Finanças, que, no dia anterior, garantira que o que ficara estabelecido no plano da troika seria cumprido. Os dois acabaram por demonstrar que, afinal, tal plano tem geometria variável, ajustada às conveniências de ocasião. Neste tempo em que só os números parecem contar, perdeu-se a noção do valor da palavra dada, de quão ela é importante para induzir credibilidade e gerar confiança. Os malabarismos discursivos de Vítor Gaspar mal disfarçam o embaraço e apenas reforçam a certeza sobre as derrapagens que derrubam as projecções dos teóricos da economia e das finanças que por aí pululam. Depois disto, qual o próximo alvo dos tiros do Governo, à socapa? Os salários? O subsídio de desemprego? Tudo é possível."

O insustentável sucesso

Texto de Carvalho da Silva hoje publicado no "Jornal de Noticias"

"Foi divulgado nesta semana o resultado da terceira revisão do programa da troika. "No seu conjunto o programa corre sobre os carris" diz a troika, saudando o Governo pela sua prestação. Dizem que o "ajustamento fiscal" é "notável", a "desalavancagem do setor financeiro está a progredir", as "reformas nos mercados de trabalho" estão a avançar.

Quando já é absolutamente claro que a "austeridade" em contexto recessivo e o "ajustamento estrutural" estão a aprofundar as crises europeias, e no próprio FMI se tornam mais audíveis as vozes que o reconhecem abertamente, a troika precisa de propagandear histórias de sucesso. Neste relatório, Portugal foi escolhido para contar uma delas.

Pouco importa que o desemprego tenha ultrapassado a barreira dos 15 por cento, que o "ajustamento fiscal" esteja comprometido pela quebra das receitas, que a diminuição das exportações inviabilize a "única" fonte de crescimento possível, que a "desalavancagem" do setor financeiro esteja a ser feita à custa do financiamento da economia, que se assista a uma acelerada destruição de empresas em resultado da diminuição de salários, pensões e rendimentos do povo, que a destruição de serviços públicos torne inacessível o acesso à saúde para muitos portugueses.

Pouco lhes importa as injustiças, o sofrimento e a pobreza resultantes das alterações ao regime do subsídio de doença, dos cortes no Rendimento Social de Inserção, da diminuição da proteção na maternidade e na paternidade.

Para a troika e o Governo, que se comporta como governo de um país ocupado - veja-se as trapalhadas e mentiras sobre o corte dos subsídios de Natal e de férias -, tudo isto são "riscos", ou "sacrifícios necessários", nada mais do que isso; o programa é perfeito e está a ser executado de forma exemplar!

Os perigos acumulam-se: os ataques aos mais diversos setores profissionais, dos setores público e privado, colocaram no senso comum a ideia de que os direitos no trabalho são privilégios, enfraquecendo a sua capacidade de reação e luta; o empobrecimento das classes médias (instituíram que pertence à classe média quem ganha mais do que o salário mínimo) está a manietá-las e a provocar ruturas de solidariedade; a estigmatização de grupos mais desprotegidos, desenvolvendo invejas entre pobres e paupérrimos, cria o clima propício para um brutal ataque à segurança social e a outros direitos sociais universais e solidários.

Na realidade, "os riscos" de que nos falam não são mais que factos e resultados previsíveis das políticas em curso, não só do que está a ser executado em Portugal, mas de todos os programas semelhantes, da Grécia e da Irlanda a toda a União Europeia, com relativa exceção da Alemanha.

É dramático ouvir os senhores da troika expressarem preocupação pelo "aumento mais rápido que o previsto do desemprego", eles que sabem muito bem da preocupante possibilidade de o desemprego ultrapassar os 20% no prazo de um ano, em resultado das políticas que estão a ser implementadas.

Na Europa capitaneada por uma direita neoliberal, que está a fazer da crise uma oportunidade para aplicação de um programa não sufragado de destruição do Estado Social, o ar está a tornar-se irrespirável.

O sucesso na implementação desta agenda política perigosa, sustentada numa ofensiva ideológica reacionária ocultada pela propaganda e posições repetidas nos grandes meios de comunicação, é, para a generalidade do povo, empobrecimento, insegurança e infelicidade que os poderes dominantes querem individualmente sofrida.

Entretanto, de Espanha e de França, da Itália, e de Portugal também, por vezes de onde menos se espera, chegam sinais de superação da atomização e do conformismo, de disponibilidade para a ação coletiva. Por aí passa a esperança e confiança no futuro, indispensáveis para a exigência de coisas tão simples e elementares como a afirmação do valor do trabalho na vida das pessoas e na economia, a satisfação de necessidades básicas, o combate às desigualdades e à pobreza, que se constituem como os fundamentais conteúdos de políticas alternativas."

sexta-feira, 6 de abril de 2012

Vagarosamente e outros textos de hoje

A jornais de hoje trazem vários texto de grande interesse pela sua actualidade.

Texto de Manuela Moura Guedes hoje publicado no "Correio da Manhã".

Vagarosamente

"Enquanto se achar muita gracinha a Vítor Gaspar, não se emendam as asneiras que faz, muitas, repetidas, com custos muito pesados para o País.

Se ninguém o parar e fizer mudar de rumo, ele continuará a dar cabo do que resta da economia. Bruxelas faz o que fazia no tempo de Sócrates, vai dizendo que está tudo no bom caminho, e o Governo, herdeiro da ambição cavaquista de ser bom aluno da Europa, exibe a nota para consumo interno e para fazer esquecer a necessidade que houve de um Orçamento rectificativo logo no princípio do ano, a única solução para remendar as previsões erradas de Gaspar. Nada bate certo.

Diminuíram as receitas fiscais, aumentaram as despesas com as prestações sociais, a recessão está no dobro do previsto, o PIB foi o que mais caiu entre os 34 países da OCDE, o desemprego é o maior de sempre, galopante, 15%. Obra do ministro das Finanças e de uma austeridade que leva o País a ficar no osso, mas Gaspar diz que não percebe, que a evolução do desemprego "não é de fácil interpretação" e que "é importante analisar a situação e as causas deste desvio".

Bem podem esperar sentados os desempregados... Gaspar é um teórico, um mau teórico, ao não ligar aos mais elementares efeitos recessivos das medidas que tomou. Deu ao Liberalismo que importou um toque tão português que o Estado, mesmo quando diz retirar-se de algum sector da economia, deixa por lá, pelo menos, uma mão protectora a bem de interesses corporativos que se estendem à banca e aos grandes grupos económicos. Através da CGD, interfere em tudo, em vendas, OPA e financiamentos arbitrários e em nomeações duvidosas. Já era tempo de mudar, mas não.

Como os números descarrilaram, os cortes nos subsídios de Natal e de férias vão até 2015 e não até 2013, como disse antes. Foi um "lapso", explicou Gaspar, "muito vagarosamente", explorando o encanto que os indígenas vêem na fala ao retardador e nas construções gramaticais arrevesadas com que se faz interessante. Pode ser que continue a resultar a gracinha, mesmo quando for um "lapso" ter dito que "Portugal vai crescer para o ano" ou que "não haverá mais austeridade" (os cortes nos subsídios de doença não contam?). Mas se for assim, então o País não aprendeu nada! "

Três textos no Diário de Noticias.

Texto de José Manuel Pureza, deputado

O europeísmo convicto

" O Governo quis que Portugal fosse o primeiro país a pronunciar-se sobre o Tratado Orçamental aprovado em 30 de janeiro e marcou o respetivo debate no parlamento para a próxima quinta-feira. A matreirice percebe-se: ecos de dificuldade de aprovação noutros Estados deixarão assim de poder alimentar a oposição a este tratado entre nós. Esse é um sinal dos tempos que se vivem na Europa: a democracia mete medo aos políticos que estão de serviço ao projeto de liquidar o modelo social europeu e impor a economia do empobrecimento. Eles sabem que o povo jamais aceitaria esse rumo. Por isso inventam mil e uma coisas para não o consultar.

O pretexto é sempre a crise. E a chantagem é sempre a mesma: há que responder à crise e só há uma resposta, o corte de direitos às pessoas e a miniaturização do Estado. Ou isto ou nada. O estado de exceção tornou-se a nossa condição de vida. E em estado de exceção não há escolhas. Ou seja, não há democracia.

O tratado orçamental é um passo perigosíssimo neste sentido. Sob o pretexto de criar uma "união orçamental" para pôr termo à crise das dívidas soberanas, o que ele realmente consagra é a blindagem de um programa e a ilegalização das alternativas. A imposição de inscrição constitucional ou para-constitucional da proibição de défices estruturais superiores a 0,5% do PIB, a obrigação de cumprimento de um programa de reformas estruturais sempre que haja défice considerado excessivo e a atribuição ao Tribunal de Justiça da União de poderes para fiscalizar o cumprimento destas imposições - eis a síntese de um programa de ilegalização de tudo quanto não seja liberalismo económico extremado. Amarrado a uma regra sem sentido - a dimensão do PIB não depende do controlo público -, o Estado deixará de poder dar resposta a uma recessão, de poder fazer face ao aumento dos pedidos de subsídio de desemprego ou de poder reforçar as políticas de combate à pobreza.

Isto significa algo muito simples: o Estado mínimo - em que o assistencialismo substitui os serviços públicos universais entretanto privatizados - torna-se regra sem exceção. A mesma direita que rasgou as vestes bradando contra o suposto viés ideológico da Consti- tuição portuguesa mostra todo o seu empenho em tornar este tra-tado em lei. Por que será?

Virá de novo o discurso do "europeísmo convicto". Os seus porta-vozes usam-no invariavelmente como arma de arremesso contra qualquer esboço de crítica aos rumos que a integração europeia vai tomando. Os europeístas convictos são gente de pergaminhos que invocam sempre o argumento de auto- ridade de terem estado desde o princípio com a Europa para assim legitimarem o seu acordo com todos os caminhos para onde a Europa vai. Para os europeístas convictos de turno, as críticas são sempre, em última análise, expressão de uma vontade mal disfarçada de abandonar a Europa quando não mesmo de a matar. Por trás de tanta convicção oculta-se a concordância com o triste legado de Maastricht, em que a Europa capitulou diante dos adversários da coesão económica, social e territorial e optou pela redução dos salários e pelo aumento da desigualdade como forma supostamente única de fazer face às crises.

Há uma questão realmente fraturante no nosso tempo: o papel do Estado no combate às desigualdades. É essa questão que o tratado decide. Desta vez o discurso vazio do "europeísmo convicto" não servirá de álibi. Como Manuel Alegre e Mário Soares puseram em evidência, é em nome da Europa que este tratado deve ser rejeitado. De uma Europa de democracia, de uma Europa de justiça social, de uma Europa decente."


Texto de Fernanda Câncio

Lapso e relapso

" Foi a 1 de abril, é certo. Em campanha, abordado por jovens que o questionaram sobre se era sua intenção cortar o 13.º mês, Passos respondeu: "Total disparate." Dois meses depois, anunciava o corte de meio subsídio de Natal a todos os que auferissem mais de mil euros. Fê-lo alegando a existência de um desvio (o "colossal") na execução orçamental do Governo anterior, desvio que a Unidade Técnica de Apoio Orçamental garante inexistir.

Isto para o ano passado. Para este, anunciava, a 13 de outubro, o corte dos subsídios de natal e de férias para pensionistas e sector público, vincando tratar-se de uma "medida temporária" que "vigorará apenas durante a vigência do programa de ajuda económica e financeira". Em todas as notícias, os cortes surgiam para o período de dois anos - 2012 e 2013. Não só não houve desmentido como a 17 de outubro o ministro das finanças reiterava na RTP: "O corte é temporário, durante a vigência do programa de ajustamento, e esse período acaba em 2013." O mesmo fez a secretária de Estado do Tesouro a 15 de novembro: "Os cortes dos subsídios de férias e natal são uma medida temporária para os próximos dois anos. As medidas são temporárias para 2012 e 2013, foi isso que foi dito." Nenhuma dúvida, pois: o discurso oficial do Governo foi, até há dois dias, de que os cortes tinham a duração de dois anos.

Claro que muita gente, entre a qual me incluo, há muito tem a certeza de que o que Governo quer mesmo é acabar com os 13.º e 14.º meses, e não apenas para a administração pública: para toda a gente. Faz parte da sua ideia de que um país mais rico se obtém empobrecendo a generalidade da população, "baixando o valor do trabalho" (está-se a ver). Daí que tantas vezes tenhamos ouvido os seus membros referirem-se aos cortes como "reforma" ou "medida" "estrutural". Daí que sempre que questionados sobre o momento exato da reposição do que esbulharam tergiversem (sendo a última versão da patranha, mais uma vez reproduzida por todos os media como facto, que "será a partir de 2015" e que os subsídios "poderão ser diluídos nos salários de 12 meses").

A indiscrição de um amanuense troikano veio expor, sem apelo nem agravo, o que tantos de nós - senão todos - já sabíamos: o Governo mentiu, e continua a mentir. Sobre os subsídios, sobre o fim da austeridade, sobre a sua verdadeira estratégia (valha a JSD, que ao proclamar estar em luta contra "os direitos adquiridos" diz tudo como os malucos). O Governo que foi eleito como apóstolo da verdade e das boas contas, que vinha aplicar a austeridade às "gorduras do Estado" e não às pessoas, é todo o contrário disso. É o que com particular felicidade um deputado do PSD resumiu, dizendo sobre o ministro Gaspar que este, "com toda a honestidade e transparência, assumiu o seu lapso": uma contradição em termos, aliada a uma prodigiosa desvergonha. Agora que está tão claro, resta saber se vamos continuar a assistir, tranquilos, a esta revolução."

Texto de André Macedo

Muito felizes

"A notícia dizia que o diploma tinha sido publicado em Diário da República, depois de ter sido promulgado no mesmo dia por Cavaco Silva, concluindo um processo que decorreu "no maior sigilo". Não foi sigilo nenhum. Foi às escondidas, sem discussão e debate. Foi de mansinho, como os habtitués ali do 28: olham para um lado, esperam pelo alvoroço - ontem discutia-se o fim dos subsídios de Natal e férias - e metem a mão na massa. A partir de hoje, ninguém se pode reformar antecipadamente, exceto os desempregados de longa duração. Só depois de a troika fazer as malas, um dia longínquo que ninguém sabe quando vai ser, tudo voltará (voltará?) ao normal. Percebe-se a urgência de Gaspar: se alguém suspeitasse do que ia acontecer, seriam aos milhares os pedidos de reforma e lá se ia a poupança orçamental. Proibir a reforma antecipada dos trabalhadores do sector privado tem esse primeiro duplo objetivo: garantir que as contribuições se mantêm sem más surpresas e, claro, evitar que o Estado tenha de pagar mais cedo do que o previsto as tais pensões. Faz sentido esta azáfama? Como tem havido um aumento dos pedidos de reforma antecipada (mais 42% em 2011), o Governo tapou a saída com um muro de betão: daqui ninguém se mexe! Além de esta decisão rebentar com os planos de muita gente e agravar o desemprego jovem (35,5%), por dificultar a renovação da força de trabalho, esta escolha põe em causa a confiança no sistema de segurança social. Se o Estado muda as regras (tipo sniper) e não permite, por exemplo, que trabalhadores com décadas de descontos antecipem a reforma, aceitando uma pensão menor, então a relação contribuinte- -Estado é posta em causa. Não será de espantar que, em breve, alguém proponha um sistema de pensões privado que dará outra flexibilidade (devolvemos-lhe o dinheiro quando quiser!) e a promessa de um futuro mais próspero. Como disse Relvas, o objetivo é fazer-nos mais felizes. Realmente, já me sinto melhor."

terça-feira, 3 de abril de 2012

Afinal havia outra

Texto de Paulo Morais (Professor universitário) hoje publicado no "Correio da Manhã"

"As medidas de austeridade a que Vítor Gaspar obrigou os portugueses falharam em toda a linha. O ministro das Finanças já veio até reconhecer que o sofrimento dos portugueses foi um engano, ao apresentar um Orçamento de Estado rectificativo logo no primeiro trimestre do ano.

A quebra nas receitas fiscais nos últimos meses constitui o corolário lógico dum orçamento de 2012 recessivo. O aumento de impostos asfixiou muita da actividade económica, as empresas fecharam e condenaram-se assim inúmeros trabalhadores ao desemprego. Aumentaram as prestações sociais e complicaram-se ainda mais as contas públicas. Algo que qualquer pequeno comerciante teria antecipado, mas que Vítor Gaspar e seus assessores jamais imaginariam, pois não têm qualquer conhecimento da economia real. A sua obstinação com a austeridade levou--os até a desprezar o que ensinam nas universidades. Esqueceram o óbvio: que as taxas de imposto, a partir de certa grandeza, deprimem a economia, incentivam a fuga ao Fisco e levam à redução da colecta.

O falhanço anunciado está aí. Por um lado, há uma quebra de duzentos milhões na receita fiscal. E, por outro, crescem os gastos sociais provocados por um desemprego recorde, que obrigaram a um Orçamento rectificativo para tapar buracos.

Desta vez, com os pobres já insolventes e a classe média exaurida, Gaspar vai finalmente optar por poupar 500 milhões de euros nos juros da dívida pública. Aleluia! Afinal, havia uma solução alternativa, que deveria ter sido a primeira de todas as medidas de austeridade: a renegociação dos juros da dívida. Até porque o Governo português gasta anualmente cerca de nove mil milhões de euros para alimentar bancos usurários. Um Estado que gasta mais em juros do que em todo o Serviço Nacional de Saúde, ou até mais do que com a massa salarial de toda a Função Pública, é um Estado condenado.

Vítor Gaspar falhou nas suas previsões. Submeteu o país a sacrifícios dolorosos e ainda por cima inúteis. Gaspar deveria ter começado por subtrair privilégios aos bancos. Mas faltou a coragem. E, pelos vistos, falhou também competência e envergadura."