Pedro Marques Lopes é conhecido por ser um dos mais fieis arautos do PSD pelo que o seu artigo de opinião hoje publicado no "Diário de Noticias" é, no mínimo, interessante.
"O primeiro-ministro disse, na última quinta-feira, que o chamado pacto orçamental não era de esquerda nem de direita. Dando por boa a afirmação, pelo menos nenhum dos quadrantes políticos fica envergonhado com a enormidade que a esmagadora maioria dos deputados aprovou.
O pacto diz muito sobre o caminho que a Europa vem percorrendo.
Para não variar, os cidadãos não são chamados a dar a sua opinião sobre mais um verdadeiro momento fundador. Dir-se-á que estamos apenas perante o aprofundamento de decisões que retiraram soberania aos Estados e que não se justificaria desta vez consultar directamente os cidadãos, o mal ou o bem já estaria feito. Pode ser, porém importa recordar que em matérias de soberania, provavelmente as únicas, não há representação que possa substituir o voto directo. A verdadeira crise europeia é, nunca é demais repetir, política. Mas vai muito para lá da questão do papel do BCE, planos de crescimento económico, maior integração de políticas fiscais, menor ou maior federalismo, mais ou menos défice, maior ou menor dívida pública. É sobretudo na dimensão do fundamental papel dos cidadãos de decidir o que de facto querem, de os envolver nos processos de decisão, do seu cabal esclarecimento sobre os caminhos a trilhar. A inexistência de discussão pública deste tratado leva a que a população não faça a mais pequena ideia do que de facto está em causa e das consequências que advirão para as suas vidas e para a comunidade. Aí está mais um péssimo exemplo do caminho que está a ser traçado.
Esta aberração em forma de tratado institui a visão merkeliana do que deve ser a Europa. Dividida entre os mui sérios e disciplinados países e os pequenotes que não se sabem comportar e que devem ser postos na linha pelos primeiros. Esqueçamos a Europa em que os cidadãos seriam tratados de forma idêntica mas respeitando a especificidade dos países, o seu estado de desenvolvimento, as suas idiossincrasias ou as suas debilidades. Não senhor, o que a Alemanha e o seu ajudante francês pensam para nós e os outros países mal comportados e preguiçosos é o que está certo.
Nem de direita nem de esquerda, dizia o primeiro-ministro. Melhor, o pacto institui a ausência de alternativa. A partir de agora, quando votarmos, apenas escolheremos pessoas, representantes não dos eleitores nacionais mas de outras gentes, já que as políticas serão exactamente as mesmas. O principal instrumento político, leia-se o Orçamento, perde quase toda a sua importância. Tudo isto em razão do sacrossanto equilíbrio orçamental, como se esse equilíbrio por artes mágicas criasse emprego, desenvolvimento económico e investimento. E não vale a pena vir com a conversa oca de que quando se fala disto se faz apelos a desequilíbrios, a despesismos, descontrolos orçamentais ou ao mais demagógico dos disparates que é o dos encargos para as gerações futuras, como se o investimento em escolas, estradas, tecnologia, hospitais fossem encargos.
Especificamente para Portugal, as consequências da ratificação deste tratado são simples. Das duas uma, ou Portugal cumpre os objectivos constantes no pacto orçamental que pura e simplesmente obsta a implementação de políticas de crescimento e impõe metas absolutamente irrealistas para o decréscimo do défice e da dívida pública (só para referir os exemplos mais gritantes), obrigando na realidade a cortes que destruiriam de facto por inteiro o Estado social e que fariam disparar ainda mais o desemprego e as falências, ou seja, o nosso país chegaria ao fim do processo na mais profunda miséria, ou não os cumpre, os tais objectivos, e sujeitar-se-á a penalizações gravíssimas que, no limite, o afastará do euro com as consequências conhecidas e o arrastará também para a miséria. Venha o diabo e escolha.
Sim, este pacto não é de esquerda nem de direita, é apenas suicida para Portugal e para a Europa."
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