Texto de José Eduardo Moniz hoje publicado no "Correio da Manhã"
"Mais de 13 500 milhões de euros foram
adjudicados por entidades públicas, sem concurso, nos últimos 4 anos. É
um valor impressionante, que ultrapassa em muito o montante canalizado
sem o expediente da chamada adjudicação directa.
Tais números evidenciam a indiferença, a
irresponsabilidade e o descarado desrespeito que se apoderaram de grande
parte da máquina do Estado perante o dinheiro que é de todos. É uma
vergonha e um atropelo às mais elementares regras de zelo e rigor a que
deve obedecer a utilização das receitas arrecadadas com a imensidão de
impostos e taxas que sobre os cidadãos incidem.
Foram
muitas as empresas que atribuíram empreitadas e obras sem concurso
público, entre elas, Refer, Estradas de Portugal e EDP-Distribuição, mas
à cabeça de todas está a Parque Escolar: mais de 1200 adjudicações, num
total de 1800 milhões de euros. Entidades mais beneficiadas: as do
sector da construção civil. Um filme muitas vezes repetido.
Ninguém
pode pactuar com uma situação destas, para a qual o Tribunal de Contas
repetidamente tem lançado alertas. Só alguém que toma os outros por
parvos, ou é inconsciente ou inimputável, se atreve, como fez a antiga
ministra da Educação, Maria de Lurdes Rodrigues, a considerar que as
derrapagens da Parque Escolar trouxeram "festa" ao País. Ou, então,
outras motivações e outros fins falam mais alto do que a razão.
É
imoral e revoltante um quadro assim, ainda por cima com os portugueses a
sentirem o amargo impacto do remédio da austeridade que lhes é enfiado
pela goela abaixo.
A indignação avoluma-se com o
crescimento da percepção de que há demasiada passividade perante os
sinais de corrupção, que se traduz na incapacidade da Justiça para
actuar pronta e eficientemente em situações gritantes ou, pelo menos,
estranhas. As últimas declarações do Procurador-Geral, por sinal, o pior
da história da nossa democracia, só acentuam a descrença no sistema
judicial. Pinto Monteiro disse que o caso da compra dos submarinos não
avançou mais por falta de dinheiro, que as perícias são caras e que está
à espera que o Governo disponibilize a verba necessária para continuar a
investigação. A ministra desmentiu-o na hora, sublinhando que não
recebeu qualquer pedido de verba para perícias no processo dos
submarinos ou em qualquer outro. O director-nacional da PJ também saiu a
terreiro para acentuar que a sua Polícia deu à investigação tudo o que
foi pedido.
Na hora em que o País lida com o maior
aperto de cinto que se conhece, é fundamental sobrepor a transparência e
a verdade à mentira. Há que cortar a direito. Para se provar que não
existe ninguém acima da lei, impõe-se gente séria e impermeável à frente
dos dispositivos de investigação criminal. Este Governo, junto com
Cavaco, cometeu o erro de manter Pinto Monteiro no lugar. Que não
reincida, escolhendo tarde e a más horas o seu sucessor."
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