Texto de Fernando Santos hoje publicado no "Jornal de Noticias"
"Também conhecidos por empresários ou empreendedores, Portugal tem um
milhão de patrões - a maioria de si próprios, por estarem registados em
nome individual. Dos patrões esperam entretanto 3,6 milhões de
trabalhadores no ativo, incluindo um pouco mais de 500 mil funcionários
públicos, receber todos os meses o seu salário, muito ou pouco.
É
das regras: existem patrões preocupados e apostados no desenvolvimento
das empresas e no bem-estar dos seus funcionários; mas também há os
retrógrados, os sanguessugas, adeptos da escravidão do pessoal. Já os
assalariados, não nos enganemos, são também de vária casta: uns
trabalham, são produtivos, justificam o dinheiro ao fim do mês e outros
caracterizam-se por manguelice da pior espécie - e sempre roídos de
inveja do parceiro do lado.
São raros os patrões dispostos a fazer
marcha atrás, isto é, a passarem à condição de trabalhadores. Já há
muitos trabalhadores a sonhar dispor do estatuto de manda-chuvas,
prontos a criticar o dono da fábrica ou da mercearia por tudo e por
nada, mas sem golpe de asa para o negócio (sério) e incapazes de
arriscar um só cêntimo.
Os paradoxos resultam, apesar de tudo, em excecionais linhas de convergência. É o caso atual do mundo laboral português.
Representados
por confederações ou sindicatos, patrões e trabalhadores coincidem: a
austeridade está a arruiná-los e torcem o nariz a todas as decisões que
não aligeirem o sofrimento das suas vidas.
Patrões e trabalhadores, desta vez, não têm nada de tolos.
Após
o esboço de transferência (falhada) do peso da Taxa Social Única dos
cofres das empresas para o bolso dos trabalhadores - uns a sentirem-se
esbulhados, os outros temendo o fim da pacificação social e a
transferência da turbulência para o interior das empresas - é a
continuidade das políticas troikistas e o ar de bem-comportado do
Governo a criar o uníssono: a obtenção de mais curtas margens do défice
de Portugal carece de uma moratória superior a um ano. É a chamada
posição sensata - ao arrepio de um Governo de gente sem experiência de
vida, sequer do mundo laboral, e até agora atenta e veneranda a todas as
imposições dos credores.
Em linguagem chã: os trabalhadores não
têm dinheiro para mandar cantar um cego e sem o dito cujo não consomem e
os patrões não faturam o que quer que seja, dos pastéis de Belém aos
preservativos - sim, quem vive mal perde o apetite sexual.
Perante
um conluio estratégico tão básico e lógico entre patrões e
trabalhadores, o que mete impressão (ou dó?) é que não seja compreendido
e não implique o imprimir de novas políticas por quem nos (des)governa.
Enganou-se,
enfim, quem achava que uma tal coincidência de posições seria percebida
até pelo mais propenso a comportamentos asnáticos."
quinta-feira, 14 de março de 2013
Asnos e crise nos preservativos
Etiquetas:
governo,
passos coelho
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