Texto de João Marcelino hoje publicado no "Diário de Noticias"
"1
Há um antes e um depois da conferência de ontem do ministro Vítor
Gaspar porque ela marca o falhanço de toda uma estratégia perante o
País. Estamos perante um estrondoso fracasso das políticas financeiras
que arrasou o tecido económico nacional a um nível sem precedentes e
deixa o ministro das finanças numa posição de grande fragilidade
interna, até no governo.
A política do "custe o que custar", o de
"ir mais além da troika", que o ministro engendrou para conquistar os
mercados e Pedro Passos Coelho ratificou, com o incrível silêncio de ano
e meio perante os grandes decisores europeus, só agora timidamente
rompido, teve ontem um dia de revelação.
E os números, não metem:
sobe o desemprego, agrava-se a recessão, é arrasado o défice previsto
para o fecho de 2012 (era de 4,5%, muito celebrado, e acelera agora para
6,6% porque também era evidente que o Eurostat não aceitaria a
habilidade contabilística à volta da ANA), entre outros dados
estatísticos que desaconselham o caminho seguido e no qual Vítor Gaspar
não acerta nunca uma previsão e nem parte para elas com o rigor de
cenários macroeconómicos credíveis.
Ou seja, quase dois anos
depois, apesar do corte de 13 mil milhões na despesa pública, do
tremendo esforço fiscal dos portugueses, dos direitos ameaçados, das
pensões e reformas confiscadas (sobre o que o Tribunal Constitucional se
terá ainda de pronunciar...), o governo não tem soluções. Repete o
mérito da redução do défice estrutural primário e o excedente da balança
corrente e de capital. O ministro responde honestamente com um "não
sei" sobre o futuro e a eventualidade de mais cortes. Sobra, apenas, a
ladainha de que as reformas estruturais acabarão um dia por repor a
competitividade, assegurando crescimento e emprego. Como estratégia não
chega. Como caminho não existe. Como esperança não é nada.
2 Pedro
Passos Coelho falava ainda há algumas semanas sobre a recuperação
económica que começaria a chegar algures no final deste ano e
seguramente no próximo. Depois de ontem, apesar das metas suavizadas
pela troika, remetendo o atingir de 2,5% no défice para 2015, de mais
tempo para cortar os 4 mil milhões de euros, essa expectativa é uma
utopia. Só um milagre, numa Europa que também não cresce, e onde as
eleições alemãs bloqueiam a capacidade de ação dos líderes europeus,
poderia trazer crescimento e interrupção da destruição de emprego num
mercado interno arrasado por decisões tão desastradas como o imposto que
caiu sobre a restauração. Um exército de desempregados de mais de um
milhão de pessoas (se somarmos os que já desapareceram das estatísticas
oficiais) não consomem - e quem tem emprego pensa em tudo menos em
comprar, investir, gastar.
O que cria emprego é o consumo e essa
dinâmica não vai ser recuperada depressa porque o "bater no fundo",
afinal, ainda estava algo longe.
3 Nesta
conjuntura, os cidadãos não gastam, nenhum empresário tem condições para
investir, ainda falta dinamizar o crédito e ao governo resta o caminho,
estreito, que diabolizou a José Sócrates: obras, investimento público.
Os portos substituem o aeroporto, o TGV não é de pessoas mas será de
mercadorias. Afinal, o que tem de ser tem muita força...
Ir além
da troika e do memorando foi uma imprudência e uma temeridade que agora o
País paga com sofrimento acrescido. Esta violência não era de todo
necessária e até Cavaco Silva vai adaptando o discurso à realidade:
"Portugal precisa que não se tenha a exigência de cumprir a todo o custo
os défices fixados em termos monetários".
Vítor Gaspar é, desde
ontem, por muito que seja considerado lá fora, pelos sacrifícios extra
que impôs ao País, um homem desacreditado internamente. Portugal perdeu a
confiança no ministro das finanças. Também isso não pressagia nada de
bom.
Com absoluta unanimidade, todos os parceiros sociais
rejeitaram a estratégia do governo de negociação mínima com a troika. O
País precisava, vai precisar, de prazos mais largos, de mais tempo, por
muito que o primeiro-ministro insista em não o reconhecer. "
sábado, 16 de março de 2013
O fracasso de Gaspar
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Sem comentários:
Enviar um comentário