Texto de André Macedo hoje publicado no "Diário de Noticias"
"O
ministro das Finanças acha inconcebível o desemprego a caminho dos 18%?
Acha inconcebível as falências em série? Acha inconcebível o nível de
impostos? O IVA galopante? A queda de investimento? O risco de motim
entre os militares? A fuga dos mais novos? O desespero dos reformados? A
desconfiança que se abate sobre partidos e instituições? Acha
inconcebível aprovar orçamentos que falham previsões e chegam a
fevereiro esmagados pela realidade?
Não. Para todos estes detalhes
pueris Gaspar não guarda espanto nenhum. Já para a hipótese de
Portugal, como a Irlanda, pedir a extensão, por mais 15 anos, do
pagamento do empréstimo aos fundos europeus que socorreram o País...
para isso o ministro escolhe palavras musculadas: inconcebível!, diz
ele. Haja moderação, acrescenta. Eu nunca tinha visto uma coisa destas. A
Irlanda tem menos necessidades do que Portugal - tem um empréstimo mais
pequeno -, até cresce alguma coisa, mas pede mais tempo. O que faz
Gaspar? Gaspar distancia--se do aliado (que gesto nobre...) e pede
cinco, dez anos no máximo. Alguém compreende?
Talvez seja a
vontade de ficar fora do radar de Berlim para não indispor ninguém.
Talvez seja a determinação em estar sempre alinhado com o ortodoxo e
fraquíssimo Olli Rehn. Há argumentos a favor desta tese: os juros já não
baixaram para 3%? Não houve tolerância para a derrapagem do défice em
2012 e não pode ser adiada a meta dos 3% em 2014? Devagar -
incrementalmente, como dizem os burocratas de Bruxelas - lá vão chegando
algumas concessões e borlas.
É seguramente uma maneira de olhar
para o problema. Podemos até imaginar que Gaspar se agiganta à porta
fechada, convertendo-se num tenaz defensor dos endividados. Será? Na
verdade, só saberemos quando saírem as memórias do ministro; mas sei que
há aqui um grave problema de oportunidade. O Wall Sreet Journal
informava ontem que a zona euro caminha para o quarto trimestre
consecutivo de contração. Ou seja, a receita é má e em Portugal é pior. A
estratégia de 100% pura austeridade não resolve. Para se ter uma ideia,
os enviados de Bruxelas a Atenas são aconselhados pela Comissão a
mentir aos taxistas para não levarem uns cascudos: jamais lhes digam
quem são, inventem. É isso mesmo: a ideia é mentir. Fazer-nos crer que
não há alternativa ou que a alternativa é rasgar contratos, não fazer
reformas nenhumas. Oito ou oitenta. Não é verdade. Há alternativa:
negociar mais, colocar limites... como faz a Irlanda (que recusou subir o
IRC) e como fez Espanha, que evitou o resgate. Infelizmente, Gaspar
jamais o fará. Isso, sim, é inconcebível.
P.S. No auge da crise,
alguns bancos centrais da Europa disseram às suas instituições
financeiras nacionais para não comprarem dívida dos países em
dificuldade. Com isso, extremaram a crise. São estes os parceiros
europeus a quem Gaspar se entrega com diligência."
quinta-feira, 7 de março de 2013
O inconcebível Gaspar
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