Texto de Paulo Ferreira hoje publicado no "Jornal de Noticias"
O alívio da consciência de Paulo Portas vale quanto para os milhares de
portugueses cujo quotidiano está transformado num inferno? A resposta é
fácil: zero. Esse é o valor facial da lenga-lenga que nos foi contada
pelo ministro de Estado no final da tarde de domingo. Diz o líder do
CDS-PP que a coisa, no Governo, está deste modo: é ele ou o novo imposto
sobre as reformas. E, estando assim, a coisa é ameaçadora para Passos,
para a troika e para o país (por esta ordem, de acordo com as
conveniências de Portas).
O exercício de Paulo Portas foi, portanto, coisa digna do tradicional e vetusto chico-esperto, o indivíduo que, cheirando o benefício à distância (e nisso, verdade seja dita, o líder do CDS-PP é mestre), procura assegurar a vantagem pessoal, mesmo que daí resultem danos de monta para os incautos.
Que vantagem é essa? Simples: aposto singelo contra dobrado em como o imposto sobre as reformas cai do conjunto de medidas apresentadas por Passos Coelho.
Paulo Portas poderá então dizer que foi ele o elemento determinante no recuo.
O primeiro-ministro poderá então dizer que, ao contrário do que por aí se diz, ele tem alma, sofre como todos os indígenas e, sempre que o Excel o permitir, é homem para voltar atrás em defesa dos mais desfavorecidos.
Vítor Gaspar poderá então dizer que, tal como Passos, também o coração dele sangra, e a prova aí está: ele também é homem para engrenar a marcha à ré, desde que as (suas) contas batam certo.
É puro ilusionismo político aquilo a que estamos a assistir. Passos e Portas são os novos escapistas da política portuguesa. O líder centrista é mesmo uma espécie de Houdini, tão impressionantes são as suas habilidades. O famoso mágico morreu quando se preparava para exibir a sua incrível resistência torácica mergulhando numa caixa de água sem respirar. Um boxeur amador foi aos bastidores e destrui-lhe o apêndice com dois socos. Aqui, a coisa está invertida: são os escapistas que não param de surrar a assistência. E, como se isso não lhes bastasse, ainda fazem números de circo para amenizar a dor do público. Que, como se sabe, tem imensa vontade de rir.
Não está mal...
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