Texto de Manuel José Manuel Pureza hoje publicado no Diário de Noticias.
"Lembram-se do
perentório "nem mais tempo nem mais dinheiro"? Estoirou. Desabou
exibindo a fragilidade de um castelo de cartas. É o que acontece às
mentiras. Não foi a bondade da troika nem um arroubo de consciência de
Gaspar que fizeram acrescentar um ano ao "cumprimento das metas" - foi
tão-só a força irrecusável do fracasso completo desta receita. Erraram,
troika e Governo. E fizeram-no com a leviandade de quem leva um povo
inteiro para um laboratório para com ele fazer experiências que - azar -
correm todas mal. Ora, o que é ignóbil é que, como o cientista louco
diante da enésima explosão das suas delirantes misturas, o Governo e a
troika, face à evidência do seu fracasso, ensaiem a irresponsável
estratégia de "o mesmo mas mais forte".
O que o Governo anunciou
esta semana ao País é que um ano a mais não servirá para suavizar a
agressão à economia mas sim para a acentuar e prolongar. Com o dislate
dos cínicos, Passos e Gaspar invocaram em favor da sua estratégia de "o
mesmo mas mais forte" um argumento passado (a sua derrota política às
mãos do Tribunal Constitucional) e um argumento futuro (o incentivo à
criação de emprego). Puro dislate: em ambos o Governo deturpou,
inventou, mentiu. E, pelo meio, troçou cinicamente da legalidade
constitucional e de nós todos.
Àquilo que o Tribunal
Constitucional condenara por iníquo - o confisco de dois subsídios aos
funcionários públicos e aos pensionistas - o Governo acrescentou o
confisco de um salário aos trabalhadores do sector privado, através do
aumento brutal dos seus descontos para a Segurança Social. O mesmo mas
mais forte, portanto. Mas mais forte ainda: o que os trabalhadores
descontam a mais, passam os patrões a descontar a menos. O Governo
perdeu toda a vergonha e assume, com esta grotesca transferência direta
de milhares de milhões de euros do trabalho para o capital, que a sua
resposta para a sua condenação por falta de equidade é ainda menos
equidade. Cinismo maior era difícil.
Tudo para combater o
desemprego, ora pois. Como se não fosse claro que esta reengenharia dos
descontos para a Segurança Social só pode servir a um pequeno punhado de
grandes empresas, as únicas cujo peso do fator trabalho no cômputo
global de custos é significativo. Todas as demais - e estas mesmas, em
última análise - não terão qualquer margem acrescida para contratar,
porque a perda de poder de compra das famílias arrasa o consumo e um
consumo destruído destrói as empresas. Perda de salários que fazem
perder consumo que faz perder produção que faz perder receitas fiscais
que faz perder capacidade de proteção e de promoção social que faz
perder o País.
Tanto delírio experimentalista e tamanha destruição
social e económica estão a causar uma erosão muito rápida na base
social e política das políticas do Governo e da troika. A evidente
vontade do CDS de bater em retirada (num submarino?) e o assinalável
número de vozes que, à direita, vem dizer "basta!" são disso sinais
inequívocos. Tão inequívocos pelo menos como o desnorte do Governo que
não encontrou ninguém com mais credibilidade que Miguel Relvas para vir a
público implorar a acalmia das ondas.
A incompetência do Governo
e da troika - patente no desemprego, no crescimento da dívida e do
défice e no não "cumprimento das metas" - não é um contratempo. Por
estranho que pareça, serem assim incompetentes é a sua estratégia. Na
sua obsessão regeneradora, o horizonte almejado nunca se atingirá. E,
por isso, haverá sempre mais e mais "medidas" a adotar. O mesmo, pois.
Mas cada vez mais forte."
sexta-feira, 14 de setembro de 2012
O mesmo mas mais forte
Etiquetas:
governo,
passos coelho
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