Texto de João Cardoso Rosas, Professor Universitário, hoje publicado no "Diario Económico"
"Pode um Governo voltar atrás em
decisões importantes e anunciadas com solenidade e, ainda assim, sair
politicamente incólume? Claro que não.
Qualquer pessoa com um mínimo de experiência já percebeu que o
caminho que o actual Governo tem pela frente, se é que tem algum, será
sempre inclinado e para baixo. Este diagnóstico nada tem a ver com as
preferências ou simpatias políticas de quem o faz. É apenas uma
constatação factual da vida política.
No plano nacional, um Governo que assim actua passa a ser
percepcionado como fraco e, nessa medida, torna-se o alvo preferencial
de todo o tipo de contestações e chantagens. A partir de agora, sempre
que o Governo tomar uma decisão que não agrade a algum sector - o que é
inevitável - os actores políticos e sociais sabem que vale a pena
pressionar até ao fim porque a cedência será sempre possível. No plano
internacional, como se constatou já esta semana pelas reacções na
imprensa económica anglo-saxónica, esta actuação do Governo é lida como
um sinal claro da sua incapacidade para implementar as políticas
públicas que decidiu e propôs à troika e, em última instância, para
cumprir os compromissos internacionais do país.
Mas o problema não acaba aqui. Um dos ensinamentos mais antigos e
permanentes da Teoria Política - vem desde Platão e do seu estudo da
sucessão dos regimes políticos... - diz-nos que os Governos acabam não
tanto devido à contestação externa, mas antes de mais devido à divisão
interna (embora exista uma relação dialéctica entre ambas, claro). Ou
seja, são as clivagens no seio do Governo, entre PSD e CDS, mas também
entre ministros nomeados pelo PSD, que mais claramente ilustram, para
quem quiser ver, o plano descendente em que este Governo se precipitou a
si mesmo.
No futuro próximo, aliás, "voltar atrás" será uma espécie de lema
deste executivo moribundo. Na política europeia, o único caminho que nos
poderá ajudar a superar a crise é contrário àquilo que o Governo e o
primeiro-ministro sempre defenderam. Este primeiro-ministro terá de
dizer que, afinal, a intervenção do BCE é importante, afinal, o
alargamento dos prazos do programa português é necessário, afinal, a
ideia de ‘project bonds' e de ‘eurobonds', é mesmo bem-vinda, e por aí
adiante.
Na política nacional, o primeiro-ministro terá de reconhecer que,
afinal, os resultados do Governo na consolidação das finanças públicas
não são os esperados, afinal, o rácio da dívida em relação ao PIB
continua a crescer, afinal, a aposta no consumo e no investimento
público (com fundos europeus) não pode ser abandonada, etc.
Para o actual Governo, "voltar atrás" é agora a única saída e, ao mesmo tempo, a redução a zero da sua credibilidade política."
quarta-feira, 26 de setembro de 2012
Voltar atrás
Etiquetas:
governo,
passos coelho
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