Texto de Paulo Baldaia hoje publicado no "Diário de Noticias"
"Estamos
obrigados a repensar o papel do Estado. Não temos dinheiro para manter
as coisas como até aqui, mas não podemos confiar na "inteligência" dos
que têm certezas sobre tudo. Tanto faz que eles se afirmem de Direita
como de Esquerda. O Estado social não é uma invenção dos políticos, é a
emanação da natureza humana. Nós somos solidários, mesmo quando nos
tentam convencer da justeza dos nossos egoísmos.
A história
recente do nosso país mostra-nos que a diferença dos políticos não está
em ser de Direita ou de Esquerda, mas antes de estar no poder ou na
oposição. Há um arco do poder (PSD, PS e CDS) que é mais pragmático na
governação e mais ideológico na oposição e, por causa disto, tivemos de
incluir no nosso léxico a palavra demagogia. E não seria diferente com o
Bloco ou o PC.
Em situações difíceis, como aquela que agora
vivemos, existe sempre a tentação de dividir para reinar. E se há
crítica que se pode fazer a este governo, é a de cair facilmente nesta
tentação. Fez o seu primeiro Orçamento lançando o sector privado contra o
público e ensaia agora fazer o mesmo lançando os contribuintes contra
os beneficiários. Nós somos todos privados e públicos, contribuintes e
beneficiários. Se pedimos coerência aos políticos, devemos exigir o
mesmo a nós próprios.
A mais forte das razões para não aceitarmos
viver numa sociedade em que o Estado deixa mais de 300 mil pessoas sem
qualquer fonte de rendimento é a de que isso nos pode calhar em "sorte"
um dia destes, mas a mais importante é a de que a natureza humana não
vive em paz com tamanha injustiça.
A razão mais egoísta para que
não aceitemos que as funções sociais do Estado sejam substituídas pelos
cantos de sereia que apregoam a meritocracia é que nós sabemos como
podem ser cegos os que avaliam os nossos méritos. E a mais altruísta é
que nós sabemos como podemos cegar quando temos de avaliar os méritos
alheios.
No mundo em que vivemos não pode impor-se sempre o
pragmatismo. Não podemos viver na dicotomia das esquerdas e das
direitas, nem inventar lutas de classes. A finança, as corporações e
todos os outros interesses organizados estarão sempre em vantagem. Não
podemos aceitar que tudo se resuma a um conjunto de interesses a puxar
cada um a sua corda. A única forma de impedir o agravamento das
injustiças é perceber que não podemos admitir para os outros o que, por
certo, não desejamos para nós.
Por mais que nos sintamos seguros
com as nossas coisinhas, a angústia dos que ficam para trás acabará
sempre por transbordar para a margem onde nos encontramos. Como nos
podemos sentir felizes se à nossa frente correr um rio de infelicidade?
Nós não vivemos sós."
domingo, 4 de novembro de 2012
Nós não vivemos sós
Etiquetas:
governo,
passos coelho
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