Texto de Alexandre Abreu, Economista, hoje publicado no "Diário Económico"
"Há muita coisa a refundar no Estado
português. Primeiro que tudo, haveria a refundar, no sentido de
reafirmar, o contrato social em vigor desde a instauração da democracia –
o qual permitiu, como contrapartida da solidariedade fiscal dos
contribuintes, que o País realizasse avanços tremendos ao nível da
saúde, longevidade, educação, cultura e qualidade de vida.
Haveria também a refundar, no sentido de realizar efectivamente, a
figura do Estado como pessoa de bem, erradicando práticas ilegais como a
contratação de falsos recibos verdes ou os atrasos sistemáticos nos
pagamentos a fornecedores. Haveria ainda a refundar, no sentido de
erradicar, a predação do Estado por interesses particulares através dos
compadrios que nascem da promiscuidade entre o poder político e
económico. E haveria a refundar, no sentido de recuperar, os
instrumentos de política económica (industrial, orçamental e
monetária/cambial) que temos vindo a perder e que, no mundo real e ao
longo da história, foi o que permitiu que as economias desenvolvidas
chegassem onde estão.
Infelizmente, não é nada disto que o primeiro-ministro tem em mente. O
que o seu apelo à refundação anuncia é a fase seguinte do processo de
afundamento da economia e da sociedade portuguesas. Perante um serviço
da dívida que é uma bola de neve e não cessará de aumentar, a opção no
OE 2013 para tapar o sorvedouro consistiu no brutal aumento da carga
fiscal. No próximo ano, quando for visível para todos o carácter
contra-producente dessa opção, ser-nos-á imposto como inevitável o
desmantelamento de parte substancial das funções sociais do Estado, a
fim de realizar na prática o ideal do Estado mínimo que povoa o
imaginário neoliberal. Só que essa receita, como sobejamente revela a
análise comparada das trajectórias de desenvolvimento na história real,
representa a certeza de um País em vias de subdesenvolvimento capturado
por uma oligarquia. Em vez de refundação, se não se inverter o caminho,
teremos mais e mais afundamento."
segunda-feira, 5 de novembro de 2012
Re(a)fundar
Etiquetas:
governo,
passos coelho
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