Texto de Ana Sá Lopes hoje publicado no "i"
"Passos Coelho garantiu ontem que nunca quis dizer o que disse na entrevista à TVI
O primeiro-ministro aludiu na entrevista que deu à TVI que teria “um
problema de comunicação”. É verdade, mas não é esse o seu principal
problema – o mais grave é andar literalmente aos papéis, em busca de um
corte irreal a que se comprometeu com a troika e que o prof. Marcelo
revelou ontem no seu programa dominical – vão ser 4,4 mil milhões a
retirar à despesa pública.
Primeiro, inventou a “refundação” do Memorando que, no entanto, não era
“renegociação”. Depois, chamou o PS para a “grande causa” de repensar
as funções do Estado e o PS fez o que costuma fazer nestas ocasiões –
uma abstenção violentíssima, uma autêntica abstenção veemente, irascível
e arrebatada. Depois, veio Gaspar convocar todos, sociedade civil e
universidades, para discutir tudo, as fundações e refundações, a equação
entre aquilo que “os portugueses estão dispostos a pagar de impostos” e
o Estado que querem. Por fim, percebeu-se que não iria haver nenhum
debate, como não existiu antes nem existirá relativamente ao Memorando
da troika – enquanto este governo continuar no sítio. A troika exige, o
governo manda fazer, o povo acata – até um dia.
É neste contexto de “andar aos papéis” que se tem de enquadrar o
acontecimento da entrevista à TVI em que o primeiro- -ministro afirmou
claramente que a Constituição lhe permitia – mais na Educação do que na
Saúde – obrigar os cidadãos a “repartirem” o esforço do Estado. Isso é
uma coisa que já acontece no ensino superior, com as propinas.
Passos Coelho demorou quatro dias a desmentir que tivesse o objectivo
de instituir os co-pagamentos da Educação – ideia que sempre defendeu
antes de se tornar primeiro-ministro, como o i recorda hoje. Na
quinta-feira da semana passada, no fim de um longo dia de polémica, com o
PSD em profundo silêncio, o Ministério da Educação veio anunciar não
estar em causa a “gratuidade” do ensino obrigatório. Ontem, os
excelentes ares do Mindelo inspiraram Passos Coelho para decidir
rejeitar ter dito o que efectivamente disse. A versão oficial, agora, é
que o primeiro-ministro se limitou a concluir que os estudantes do
ensino superior já pagam propinas. And so what? E afinal vai mudar
alguma coisa na Educação? Neste momento, e depois da polémica, o
primeiro-ministro não sabe. Ninguém sabe. Só sabe que são 4,4 mil
milhões (e a precisão do número também só o prof. Marcelo sabe, porque
mais ninguém a esclarece) e anda absolutamente aos papéis."
segunda-feira, 3 de dezembro de 2012
Andar aos papéis
Etiquetas:
passos coelho
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